Aumento previdenciário e descumprimento dos reajustes do servidor público federal: onde está o erro?

Publicado em 2 ComentáriosServidor
“Em uma canetada, Poder Executivo atropela Congresso Nacional, institui adicional de contribuição previdenciária e não cumpre reajustes garantidos em leis e acordos com categorias do serviço público federal”
Rudi Cassel*
​Aumento de contribuição previdenciária do servidor público por faixa remuneratória, leis federais descartadas, segurança jurídica anulada. Vivemos tempos estranhos. E na evolução desse estranhamento surge a Medida Provisória nº 805, publicada na edição extra do Diário Oficial da União de 30 de outubro de 2017.
Na quase-lei de exceção, o conjunto de arbitrariedades surpreendem pela ousadia inconstitucional. No passado, o Poder Judiciário julgou, reiteradamente, uma série de ações individuais e coletivas contra o aumento de alíquotas previdenciárias (por faixa remuneratória) pretendido pela Lei 9.783/99. Após uma infinidade de liminares e sentenças contrárias à progressividade contributiva dos servidores, o Supremo Tribunal Federal (STF) pacificou o entendimento pela inconstitucionalidade da medida.
Não foi suficiente. A MP 805 volta ao mesmo ponto. A partir de 1º de fevereiro de 2018, aumenta-se a alíquota previdenciária de 11% para 14%, incidente sobre a parcela remuneratória que ultrapasse o teto de benefício do Regime Geral de Previdência Social (RGPS, hoje, de R$ 5.531,31). A Constituição da República não permite o procedimento, mas nos últimos tempos esse tipo de proibição parece irrelevante.
Sobre o calote ou “postergação” dos reajustes previstos em leis anteriores, várias carreiras federais são atingidas: Carreiras Jurídicas, da Segurança, da Saúde, da Receita, da Educação, entre outras. Os aumentos parcelados para 2018 e 2019 foram redirecionados para 2019 e 2020. Violaram-se reajustes precedidos de acordos formais entre entidades sindicais representativas de categoria e o Governo Federal.
Sem confiança nos atos do Poder Público, um Estado de Direito não se sustenta. A razão de sua existência é a obediência aos parâmetros legislados, o que o diferencia do Estado Absolutista. A formatação começa na Constituição e termina nos mínimos regulamentos, envolvendo até a decisão do juiz, se necessária.
Quando o exemplo do descumprimento dessas regras é patrocinado pelo governo, tudo se torna possível. De uma pretensa civilização para a selvageria, o espaço é o de uma medida provisória com quarenta artigos.
*Rudi Cassel – sócio do escritório Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados

PGR quer barrar PEC dos gastos

Publicado em Deixe um comentárioServidor

Parecer técnico de procurador da República e assessores sustenta que proposta do governo para limitar os gastos públicos é inconstitucional porque fere a autonomia entre os três Poderes. Para Planalto, órgão faz lobby para manter mordomias

ANTONIO TEMÓTEO

ROSANA HESSEL

O governo sofreu ontem três reveses que ameaçam a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 241 de 2016 na Câmara dos Deputados — e a queda de juros. No mais preocupante deles, a Procuradoria-Geral da República (PGR) enviou ao Congresso Nacional uma nota técnica contrária ao texto que limita o crescimento dos gastos públicos à inflação. O documento, assinado pelo secretário de Relações Institucionais da PGR, procurador Peterson de Paula Pereira, afirma que a proposta é inconstitucional porque fere a autonomia entre os três Poderes.

A nota sustenta que o prazo de vigência da PEC, de 20 anos, limita, prejudica e enfraquece o desempenho do Poder Judiciário e demais instituições do Sistema de Justiça. Além disso, Pereira e os assessores técnicos Nayara Rodrigues Oliveira e George Pereira de Oliveira avaliam que matéria, se aprovada, reduzirá a atuação estatal no combate à corrupção e ao crime, a tutela coletiva e a defesa do interesse público. Além disso, eles afirmam que a proposta de contenção de gastos invade competência orçamentária da Justiça de maneira “drástica e indiscriminada, podendo inviabilizar o adequado exercício e desenvolvimento de suas funções constitucionais e institucionais”.

O procurador e os assessores ainda sugerem, caso superada a alegação de inconstitucionalidade, que o prazo de vigência da PEC seja reduzido para 10 anos, com revisão a partir do quinto exercício. Além disso, a propõem que o limite de gastos não incida sobre despesas com as atividades de combate à corrupção, reajustes de pessoal, inativos e pensionistas, projetos de lei com criação de cargos e custeio de obras acabadas.

Caso o governo não consiga a aprovação para a PEC dos gastos, o Comitê de Política Monetária (Copom) pode adiar o início do ciclo de queda de juros. Isso porque as expectativas do mercado para a inflação devem piorar. No Palácio do Planalto, a avaliação é de que a PGR está mais interessada em garantir mordomias do que em contribuir para a recuperação do país. “Os lobbies começaram. Querem manter reajustes e não enfrentar o problema. Querem que só que o Executivo corte na carne”, disse um assessor de Temer.

Em nota divulgada à noite, o Palácio do Planalto, afirmou que a PEC 241 “cria o mesmo critério de limite de gastos para todos os Poderes e para o Ministério Público em igual proporção e dimensão de valor, não havendo tratamento discriminatório que possa configurar violação ao princípio da separação dos Poderes”. O documento da Secretaria de Comunicação destaca que a Constituição impõe limites à autonomia administrativa e financeira dos Poderes e do MP e estabelece que as despesas serão realizadas dentro dos limites estipulados na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). “Se até mesmo a LDO pode estabelecer limites claros à iniciativa orçamentária dos Poderes e do MP, é evidente que a própria Constituição, por meio da PEC 241, poderá definir quais serão esses limites”, conclui a nota.

Retrocesso

Não bastassem as críticas da PGR, deputados da base aliada não compareceram ontem à Câmara, impedindo a abertura de sessão. Com isso, um requerimento terá que ser votado para que o texto seja apreciado pelos parlamentares na segunda-feira. Em meio às dificuldades para a tramitação da matéria, a presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Laurita Vaz, criticou a PEC. Para ela, a medida engessará o Judiciário. A ministra ainda informou ter conversado com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para tentar liberar R$ 25 milhões dos R$ 89 milhões contingenciados do orçamento do STJ.

Além disso, a líder da minoria, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), ingressou com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender a tramitação da proposta. O processo será relatado pelo ministro Luís Roberto Barroso. O documento assinado por parlamentares do PCdoB e do PT contesta a legalidade da PEC, avaliando que há interferência na autonomia administrativa e financeira dos poderes Judiciário e Legislativo e violação do direito democrático dos próximos cinco presidentes. O texto enviado ao Judiciário sugere ainda que o projeto só deveria ser apreciado pela Câmara após o julgamento do STF.

A parlamentar comunista disse que, caso a PEC seja aprovada, o país sofrerá um retrocesso profundo. “Temer resolveu colocar na Constituição limites de recursos para as políticas públicas. Ele tira a constitucionalização da saúde, da educação, retira dinheiro de custeio e investimento, ou seja, as estatais não terão mais investimento, os servidores públicos não terão aumento, as políticas públicas vão minguar e vão ser delegadas para onde este governo quer, que é para o mercado”, argumentou.

Neste domingo, durante jantar que oferecerá a deputados, no Palácio da Alvorada, o presidente Michel Temer pedirá empenho da base aliada em favor da PEC. Como o texto foi aprovado pela comissão especial na quinta-feira, seria necessário um prazo de duas sessões para que a matéria pudesse ser incluída na ordem do dia do plenário. O governo esperava ter realizado uma das sessões ontem. Como isso não aconteceu, será preciso aprovar um requerimento especial para que o tema entre na pauta na segunda-feira.