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Para especialistas, “o desespero eleitoral leva ao desatino fiscal, por razões eleitoreiras”, com risco de ferir a LRF. É importante, dizem, criar espaço fiscal para a ampliação das transferências de renda aos mais necessitados, em especial por conta dos efeitos do período pandêmico na redução do rendimento das famílias. “O que não pode é o governo”criar soluções mágicas para fugir do teto de gastos”, reforçam
O ministro da Economia, Paulo Guedes, voltou a defender a criação de um fundo com ações de empresas estatais, entre elas, a Petrobras, para distribuir recursos para o Bolsa Família. O Fundo de Redução da Pobreza, que ainda está sendo alinhavado pela equipe econômica, tem a intenção de repartir o dinheiro – em uma espécie de adicional – aos beneficiários, em caso de venda de estatais ou de distribuição de dividendos (lucro aos acionistas) de companhias lucrativas. A ideia de Guedes está alinhada aos pensamentos do presidente Jair Bolsonaro que manifestou ontem sua “vontade de privatizar a Petrobras”, em consequência dos constantes aumentos dos combustíveis. Mas não agradou o mercado e criou polêmica.
“O desespero eleitoral leva ao desatino fiscal. Já vimos este filme. O atual governo quer uma nova versão do Bolsa Família, o Auxílio Brasil, por razões sociais, mas sobretudo políticas”, resumiu o economista Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas. Ele lembrou que um dos objetivos de Guedes, citado exaustivamente, era “desvinculação” de recursos. “Essa proposta faz o contrário, vincula recursos. Além disso, pode contrariar o Art. 44 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que diz: ‘É vedada a aplicação da receita de capital derivada da alienação de bens e direitos que integram o patrimônio público para o financiamento de despesa corrente, salvo se destinada por lei aos regimes de previdência social, geral e próprio dos servidores públicos”.
Fernando Cavalcanti, economista e vice-presidente do Nelson Wilians Advogados, concorda que “é inequívoca a necessidade de se criar espaço fiscal para possibilitar a ampliação das transferências de renda aos mais necessitados, em especial por conta dos efeitos do período pandêmico na redução do rendimento dessas famílias”. No entanto, complementou, “o que não pode é o governo tentar de afogadilho criar soluções mágicas para fugir do teto de gastos. É um assunto que merece ser amplamente discutido”, afirmou Cavalcanti. Guilherme Amorim Campos da Silva, sócio de Rubens Naves Santos Jr. Advogados, lembrou que a intervenção do Estado na economia é prevista na Constituição como instrumento de desenvolvimento nacional.
“É claro que o mesmo Estado pode fazer o movimento inverso. Isto é, se constatou que cumpriu sua missão constitucional de promoção do desenvolvimento ou que suas empresas não estão se desempenhando satisfatoriamente, o Estado pode alienar seus ativos ou conceder sua exploração a terceiros. É importante registrar que este movimento não pode ser feito sem qualquer critério: é preciso que os processos de alienação das estatais observem processos avaliativos participativos de modo a evitar depreciação do patrimônio público”, alertou.
Com relação à possibilidade de os resultados da venda de ativos ou concessão de exploração de contratos, por exemplo, vir a fazer parte de fundos para subvenção de recursos para o combate à pobreza, Amorim entende está autorizada, “a partir de uma dupla perspectiva: em primeiro lugar, pelo caráter redistributivo previsto na arrecadação de riquezas, em segundo lugar, tendo-se em vista a obrigatoriedade prevista constitucionalmente de se combater a pobreza e erradicar a miséria (artigo 3º da Constituição Federal)”. Ele discorda, em parte, de Castello Branco, sobre a afronta à LRF. “A afronta parece ser facilmente afastada quando se verifica que a criação do Fundo aparta a destinação dos recursos do próprio conceito de financiamento de despesa corrente”, explicou Guilherme Amorim.