Os paradigmas legais da greve dos jogadores do Cruzeiro

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“Além da greve, o Cruzeiro também corre o risco de perder jogadores do atual plantel. Isso porque a Lei Pelé também estabelece em seu artigo 31, que o atleta que estiver com o salário ou direito de imagem atrasados por três meses ou mais pode requisitar a rescisão contratual e ficar livre para transferir-se para outro clube, seja nacional ou internacional, e ainda exigir todos os direitos devidos na Justiça”

Bruno Gallucci*

Os jogadores do elenco profissional do Cruzeiro anunciaram nesta quarta (13) que estão em greve por conta do atraso no pagamento dos salários. Em um anúncio realizado nas redes sociais, os atletas classificaram os problemas financeiros do clube mineiro como “desgastante e angustiante” e afirmam que os débitos chegaram a ter seis meses de atraso, em 2021.

E que, apesar de a diretoria ter quitado parcialmente a folha relativa ao mês de setembro, existem vários vencimentos em aberto com os atletas. As últimas duas folhas salariais não foram acertadas, além de valores de férias, 13º salário e FGTS. Assim, os jogadores alertam que não participarão mais de treinamentos na Toca da Raposa, o que pode refletir também na campanha do clube na Série B do Campeonato Brasileiro.

Vale destacar que a Lei Pelé, a Lei 9615/98, que é o diploma legal que institui normas gerais sobre o desporto no Brasil, em seu artigo 32 garante o direito ao atleta de se recusar a competir quando os salários ou parte de suas remunerações mensais estiverem atrasados em dois ou mais meses.

“Art. 32. É lícito ao atleta profissional recusar competir por entidade de prática desportiva quando seus salários, no todo ou em parte, estiverem atrasados em dois ou mais meses;”

Ou seja, os jogadores do Cruzeiro estão exercendo seu direito legal de protestar contra os recorrentes problemas salarias dos últimos meses e anos e podem deixar, inclusive, de entrar em campo nos próximos compromissos pela Série B. Assim, a paralisação dos atletas está coberta pela lei.

Além da greve, o Cruzeiro também corre o risco de perder jogadores do atual plantel. Isso porque a Lei Pelé também estabelece em seu artigo 31, que o atleta que estiver com o salário ou direito de imagem atrasados por três meses ou mais pode requisitar a rescisão contratual e ficar livre para transferir-se para outro clube, seja nacional ou internacional, e ainda exigir todos os direitos devidos na Justiça. Segue o artigo:

“Art. 31. A entidade de prática desportiva empregadora que estiver com pagamento de salário ou de contrato de direito de imagem de atleta profissional em atraso, no todo ou em parte, por período igual ou superior a três meses, terá o contrato especial de trabalho desportivo daquele atleta rescindido, ficando o atleta livre para transferir-se para qualquer outra entidade de prática desportiva de mesma modalidade, nacional ou internacional, e exigir a cláusula compensatória desportiva e os haveres devidos.”

Ou seja, muitos atletas poderão sair do Cruzeiro de graça, após entrar na Justiça e solicitar sua rescisão contratual de trabalho.

O caso dos jogadores do Cruzeiro vem na mesma esteira do caso recente do jogador Daniel Alves que decidiu não atuar mais pelo São Paulo Futebol Clube por conta de uma dívida salarial que chegou aos R$ 18 milhões. Ou seja, a conduta do ex-lateral da Seleção Brasileira está encorajando outros atletas contra a cultura de atraso salarial no futebol e no esporte no Brasil.

Importante destacar que em nenhuma outra categoria profissional no país os profissionais ficam sem receber seus salários por mais de 3, 4, ou 5 meses sem que alguma atitude seja tomada. Muitas categorias utilizam da ferramenta legal da greve para negociar e garantir seus direitos.

Portanto, é de suma importância deixar claro que os jogadores não estão se rebelando contra o clube, mas sim contra a diretoria atual que não está cumprindo com os contratos vigentes. E o movimento corajoso desses atletas serve para mudar a filosofia da gestão dos clubes no país, que devem ter mais zelo e respeito com os seus funcionários dentro e fora do campo.

*Bruno Gallucci – Especialista em Direito Desportivo e sócio do escritório Guimarães e Gallucci Advogados