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Apressar aposentadoria por medo da reforma da Previdência pode causar prejuízos irreversíveis
O momento é de cautela, e não de desespero. Sempre que o governo tenta mudar as regras da aposentadoria um grande número de pessoas corre às agências para garantir ‘algum direito’. Infelizmente, em muitos casos, esta atitude é equivocada e pode gerar prejuízo irrecuperáveis ao longo da vida
As possíveis alterações nas regras de aposentadoria no Brasil, com a provável aprovação da reforma da Previdência do governo, provocam uma série de dúvidas, principalmente para os trabalhadores e segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) próximos do sonho de se aposentar. Entretanto, especialistas recomendam análise cuidadosa e planejamento calculado para evitar dar entrada precipitada no benefício previdenciário, sofrendo assim um prejuízo financeiro irreversível.
Na visão de Thiago Luchin, especialista em planejamento de aposentadoria e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, o segurado não deve acelerar o processo. “O momento é de cautela, e não de desespero. Digo isso pois, ao longo do tempo, percebi que sempre que o governo tenta mudar as regras da aposentadoria um grande número de pessoas corre para as agências em busca de garantir ‘algum direito’. Infelizmente, em muitos casos, esta atitude é equivocada e pode gerar prejuízo irrecuperáveis ao longo da vida”, afirma.
Luchin alerta que o momento é ideal para os segurados que já têm os requisitos para se aposentar por idade ou tempo de contribuição. “Muitas pessoas já atingiram os requisitos para dar entrada no benefício e aguardar apenas irá gerar prejuízos. Sendo assim, o caminho é planejar a aposentadoria; saber exatamente o tempo de contribuição e se deve continuar ou não recolhendo para o INSS. A diferença pode chegar a mais de 40% do valor do benefício com poucos meses de contribuição”, avalia.
A advogada previdenciária Fabiana Cagnoto reforça que cada caso precisa ser analisado individualmente, já que demanda cálculos que levam em consideração a idade, o tempo de contribuição e o valor das contribuições previdenciárias de cada trabalhador. “O primeiro cuidado é se certificar de que realmente é o melhor momento para se aposentar. No mais, é fundamental analisar se todo período contributivo e o valor dos salários de contribuição estão corretos”.
De acordo com o advogado Leandro Madureira, do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados, antes de dar entrada, o trabalhador deve também procurar saber se tem direito a alguma aposentadoria diferenciada ou se pode contabilizar determinado período como tempo de contribuição. “Por exemplo, se o trabalhador estiver exposto a uma atividade insalubre, ele poderá contabilizar esse período de maneira diferenciada, com acréscimo indenizatório de 20% (para mulheres) ou 40% (para os homens) sobre o tempo em que ele trabalhou nesse ramo. Se ele tiver sofrido um acidente de trabalho também poderá contabilizar o valor que recebeu de auxílio-acidente no cálculo do benefício da aposentadoria. Como as regras são muito variadas, há diversas peculiaridades que poderão ser esclarecidas, favorecendo a aposentadoria ou antecipando esse momento”, esclarece.
Regras atuais
Atualmente, o trabalhador e segurado do INSS pode se aposentar por tempo de contribuição ou por idade. Para que o trabalhador da iniciativa privada urbana se aposente por tempo de contribuição, é necessário 35 anos de contribuição, no caso dos homens; e 30 anos, no caso das mulheres. Não há imposição de idade mínima, mas quanto mais jovem for o trabalhador, menor será o valor da aposentadoria, pela incidência do fator previdenciário, que somente poderá ser excluído do cálculo caso esse trabalhador atinja a chamada fórmula 85/95.
A fórmula 85/95 é uma regra de cálculo da aposentadoria, substitutiva ao fator previdenciário, aplicável desde que o trabalhador tenha, no mínimo, 30 ou 35 anos de contribuição e atinja o numeral 85, as mulheres, ou 95, os homens, somando-se o tempo contributivo com a idade do requerente. Assim, se uma mulher tiver 30 anos de contribuição, deverá ter 55 anos da idade para que se aposente sem o fator previdenciário. E o segurado com 35 anos de contribuição, por exemplo, terá que atingir 60 anos de idade. Mas se esses segurados tiverem mais anos de contribuição, a idade poderá ser reduzida, desde que a soma de ambos atinja o numeral 85 ou 95 (exemplo para mulheres: 31 anos de contribuição + 54 anos de idade = 85; 33 anos de contribuição + 52 anos de idade= 85; exemplo para homens: 36 anos de contribuição + 59 anos de idade = 95; 38 anos de contribuição + 57 anos de idade = 95).
Também é possível que o segurado se aposente por idade, aos 65 anos para homens e 60 anos para mulheres, desde que tenham feito, no mínimo, 180 contribuições mensais ao INSS, que correspondem a 15 anos contributivos.
E, segundo os especialistas, se a reforma da Previdência for aprovada serão extintas a aposentadoria por tempo de contribuição, a fórmula 85/95 e também o fator previdenciário. Apenas poderá dar entrada na aposentadoria o segurado do INSS com idade mínima de 65 anos, homens; e 62 anos, mulheres, com um tempo de contribuição mínimo de 15 anos. E o tempo de contribuição necessário para ter direito ao benefício integral será de 40 anos.
A votação da reforma na Câmara dos Deputados está prevista para o próximo dia 19 de fevereiro e o governo federal está articulando a aprovação integral do texto.
Planejar e continuar contribuindo
O advogado Ruslan Stuchi, sócio do Stuchi Advogados, destaca que as futuras regras previdenciárias serão mais duras com a aprovação da reforma, mas não é por isso que o trabalhador deva parar de contribuir. “É importante manter contribuições contínuas, ainda que pelo valor mínimo. Vale lembrar que que o valor do benefício previdenciário, com ou sem reforma, dependerá da média dos valores recolhidos à Previdência”.
Na ótica do advogado Thiago Luchin, além de continuar contribuindo normalmente para o INSS, “é de suma importância que o trabalhador saiba exatamente qual a sua situação previdenciária com clareza e tenha tempo hábil para eventual correção, ou seja, saiba qual o momento exato de se aposentar para não ter prejuízos, além do valor correto que deverá pagar e quanto vai receber, sempre buscando a melhor rentabilidade”.
O especialista recomenda que o trabalhador faça um planejamento de sua aposentadoria, com simulações das diferentes regras de cálculo na aposentadoria. “Atualmente, é possível simular diversas possibilidades para chegar a conclusões matemáticas favoráveis ao segurado, levando-se em conta os recolhimentos efetuados, o tempo de contribuição, a idade, a fórmula 85/95, o fator previdenciário e até mesmo a proposta da reforma da Previdência.
Segundo Leandro Madureira, no mundo ideal, o trabalhador se planejaria para a aposentadoria ancorado em outros investimentos financeiros, preparando-se pouco a pouco para o momento futuro em que não mais trabalhasse. “Mas grande parte de nossos trabalhadores não tem condições de se preparar financeiramente para o futuro, porque seu salário mal consegue pagar as despesas cotidianas”.
O advogado orienta o trabalhador a verificar se as contribuições estão sendo realmente feitas pelo empregador e a tentar manter as contribuições nos momentos em que ocorrer um eventual desemprego. “Também é importante que o trabalhador construa a sua história previdenciária, guardando os contracheques e documentos da empresa; exigindo os contratos de trabalho, comprovantes de atividade especial (se for o caso); assinatura da carteira de trabalho (inclusive para os trabalhadores domésticos), de maneira organizada e constante. Isso facilita bastante no momento da aposentadoria, caso haja alguma inconsistência em seus dados”.
Para aqueles que recebem salários mais altos, Madureira alerta que é importante pensar em poupar para o futuro, com investimentos prolongados e constantes que se adequem ao perfil do trabalhador.
“Ainda que o trabalhador não queira conhecer as possibilidades financeiras de investimentos, o mais fundamental é ele se preparar para o futuro, poupando o que for possível”, conclui.
Comissão Especial – Presidente do Fonacate cobra transparência nos dados da Previdência
“Se vocês leram a íntegra da PEC 287 podem ver que em vários trechos o texto é dúbio. Dá margem a interpretações diversas. Por isso o debate não pode ser atropelado, açodado”, alertou Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional Permanente das Carreiras de Estado (Fonacate)
Em audiência, na tarde de ontem (16) na Câmara dos Deputados, Marques declarou que a reforma “é desonesta porque o governo manipula os dados da Seguridade Social para forjar um déficit. E pior, é apresentada em um momento de crise, de desaceleração da economia”.
“Não temos como avançar nos debates sobre uma reforma da Previdência sem ter os números reais. O próprio TCU (Tribunal de Contas da União) afirmou que os dados apresentados pelo governo estão divergentes ou incompletos e determinou uma auditoria nas contas da Previdência Social. O ideal seria suspender a tramitação dessa PEC e aguardar os números que serão apresentados pelo Tribunal”, sugeriu o presidente do Fonacate, Rudinei Marques, durante audiência pública na Comissão Especial que debate a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, que dispõe sobre alterações na aposentadoria no serviço público e na iniciativa privada.
Para o presidente do Fórum, o debate precisa ser ampliado e cuidadoso, pois essa reforma poderá significar a maior subtração de direitos sociais do país. Por fim, argumentou que o Fonacate apresentou sugestões para emendas parlamentares e pediu apoio na assinatura necessária, cujas propostas tratam de mudanças sobre a idade mínima, o tempo de contribuição, as regras de transição, a aposentadoria especial, regras de pensão e aposentadoria por invalidez.
“Se vocês leram a íntegra da PEC 287 podem ver que em vários trechos o texto é dúbio. Dá margem a interpretações diversas. Por isso o debate não pode ser atropelado, açodado”, alertou Rudinei Marques.
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho Cavalcanti, também pontuou que essa reforma não pode ser aprovada sem se “enxergar a questão Jurídica”. “As regras de transição não estão claras e podem gerar uma enxurrada de processos judiciais pela interpretação da retirada de direitos.”
Para Robalinho, a fórmula 85/95 progressiva, aprovada em 2015, já é a equação que deve ser usada para conceder aposentadoria, “pois tem um misto correto entre o tempo de contribuição e a idade”.
“Quem disse que essa proposta não afeta os mais pobres, não leu a PEC”, enfatizou o deputado Alessandro Molon (REDE/RJ), que sugeriu ainda que seja feito um referendo para saber se a população quer ou não uma reforma da Previdência.