QUEDA DE BRAÇO

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O pacote de concessões do governo ficará prejudicado. Os advogados públicos, que, em protesto, já entregaram seus cargos de chefia, não farão plantões. E é justamente nesses plantões que acontecem os leilões das obras em portos, aeroportos e rodovias. Ajuste fiscal também pode não sair.

No dia em que o governo lança o pacote de infraestrutura, com previsão de investimentos de R$ 190 bilhões, para concessões em portos, aeroportos e rodovias, os servidores das carreiras típicas de Estado se reúnem, a portas fechadas, para alinhavar amadilhas que podem jogar por terra os programas de incentivo à inciativa privada. O Forum Nacional Permanente das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate) representa 27 entidades federais, estaduais e municipais de especialistas nas áreas de planejamento, orçamento, arrecadação, fiscalização, controle e segurança, com atividades específicas e poderes para movimenter ou paralisar a gestão pública. Lideranças do Fonacate debatem, esta tarde, as estratégias de enfrentamento e não descartam paralisação conjunta por tempo indeterminado.

“Conhecendo a máquina pública por dentro, é o tipo de movimento que, se eu estivesse no governo, não gostaria de enfrentar. Esses sinais de insatisfação emitidos pelos servidores que fazem a economia andar devem sim preocupar o Executivo”, analisou José Matias-Pereira, ex-pequisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e especialista em finanças públicas da Universidade de Brasília (UnB). Técnicos ligados ao governo, no entanto, declararam que as ameaças do funcionalismo produzem mais barulho que efeito prático ao caixa do governo, porque a tecnologia moderna, por conta das operações on-line, permite que alguns toques no computador substituam o trabalho de centenas de pessoas. Tese que é contundentemente rechaçada por Pereira.

“Essa é a imaginação de quem não conhece a administração pública de verdade. Pensar que vai fazer um país funcionar com apenas um clique no computador é ficção. Esse técnico está vivendo à frente de seu tempo, talvez em 2050”, ironizou o especialista. Já os servidores apostam que a equipe econômica da presidente Dilma Rousseff tentará não ficar em situação delicada diante dos investidores internacionais, se não tiver fôlego para cumprir a agenda positiva e se não conseguir levar a cabo as medidas de ajuste fiscal, para reduzir gastos e reequilibrar as contas públicas. “Tudo que o governo não precisa agora é de comprar outra briga com setores importantes que estão à frente das políticas públicas”, complementou Rudinei Marques, secretário-geral do Fórum.

E caso não sejam enviadas contrapropostas à pauta unificada de reivindicações da Campanha Salarial 2015, os impactos da indignação dos servidores nos cofres da União serão difíceis de avaliar, disse Marques. “Uma paralisação na CGU ou no Tesouro, por exemplo, impedirá o dinheiro de circular, até mesmo a verba que vai para Estados e municípios. Tentaremos evitar uma situação limite. Mas a tática de protelar as negociações é perversa”, reiterou. Além disso, após o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, declarar que o reajuste de 27,3% pedido pelos servidores é inviável, sem apontar um percentual, o temor é de que o governo dê mais uma “pedalada” em 2016. “Comenta-se que Barbosa pretende não dar nada em 2016, para, depois, propor um acordo plurianual a partir de 2017. Ou seja, algo ainda pior que em 2012 (reajuste de 15,8%, em três parcelas). Não podemos aceitar”.

Concentração de forças

Na reunião de hoje, a intenção do Fórum é ajustar os ponteiros, costurar um bloco forte e aglutinar movimentos isolados. “Apenas no ano passado, foram R$ 625 bilhões em recursos recuperados ou perdas evitadas pela AGU. Se o trabalho pára, muito dinheiro que poderia entrar nos cofres do Tesouro e contribuir para o ajuste fiscal poderão ir pelo ralo”, destacou Marcelino Rodrigues, diretor regional da União dos Advogados Públicos Federais do Brasil (Unafe). “O pacote de concessões do governo também ficará prejudicado porque uma das orientações aos advogados públicos, que, em protesto, já entregaram seus cargos de chefia, é que não sejam realizados plantões. E é justamente nesses plantões que acontecem os leilões das obras em portos, aeroportos e rodovias”, revelou Rodrigues.

A mobilização de entrega de cargos na AGU também teve adesão das quatro carreiras jurídicas que integram o orgão e são representadas pela Unafe: advogados da União, procuradores federais, procuradores do Banco Central e procuradores da Fazenda Nacional. “Se o governo não cuidar da valorização dos servidores, o ajuste não vai acontecer”, enfatizou o diretor da Unafe. “De fato, entre pedir e conceder 27,3%, principalmente em uma crise como essa, há uma distância enorme. O cenário de dificuldade vai exigir que todos façam sacrifícios. Mas o problema é que o governo não demonstra nem interesse, nem respeito, em sentar à mesa de negociação e assumir uma postura franca. Esse distanciamento só vai agravar o quadro”, finalizou Matias-Pereira.

Brasília, 08h30min