A apresentação do PL5864/2016, que dispõe sobre a Carreira Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil, em julho passado, pôs fim a um longo processo negocial entre representações sindicais de servidores da Casa e o governo. A esta altura, projetos relativos à maioria das Carreiras de Estado já haviam encerrado sua tramitação ou aguardavam apenas sanção presidencial.
No entanto, os termos de acordo assinados, efetivados em projeto de lei, não representaram um atendimento satisfatório aos anseios de grande parte da categoria, nem sequer parecem ter contribuído para pacificação do clima interno.
Em audiência pública na última terça-feira, 4 de outubro, para debate amplo acerca da matéria, entidades de analistas-tributários, auditores fiscais e agentes administrativos demonstraram o quanto vai ser difícil conciliar as reivindicações e acalmar os ânimos mediante o PL.
Vale lembrar que o deputado Chico Lopes (PCdoB/CE) apresentou, no último dia 14 de setembro, emenda ao projeto, com o objetivo de assegurar aos Especialistas do Banco Central do Brasil patamares salariais similares a carreiras de mesma importância para o Estado.
Defesa da paridade e do subsídio
Em discurso durante o evento da última terça, o presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip), Vilson Romero, criticou a quebra de paridade entre ativos e aposentados. “Fere um princípio constitucional, ao instituir uma parcela de nítido caráter remuneratório em valores diversos entre ativos, aposentados e pensionistas”, observou.
Críticas também à nova formatação salarial, que, segundo o projeto, voltara a ser vencimento básico (VB). De acordo com o Romero, a mudança também fere a Constituição Federal no que se refere à caracterização de Carreira Típica de Estado. “Excluir a carreira da modalidade por subsídio é praticamente excluí-la do grupo de carreiras típicas, trazendo consequências graves aos Auditores, cujas atribuições se mostram incompatíveis com VB”, concluiu.
O presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), Cláudio Damasceno, alegou que o acordo foi assinado sob a aprovação de assembleias com mais de nove mil servidores, cada.
“Superpoderes”
Outra peculiaridade que tem causado divergências entre os representantes das carreiras não diz respeito à pauta salarial, mas às atribuições e prerrogativas dos cargos. O Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal (Sindireceita) contesta o artigo 4º do PL5864/2016, que versa sobre poderes e garantias aos auditores fiscais. “Não se quer invadir o campo de atuação de ninguém. De forma alguma. Mas como vamos ser subordinados a uma autoridade no ambiente onde atuamos em pé de igualdade? Aqui não é carreira de hierarquia militar”, questionou a presidente do Sindireceita, Sílvia de Alencar.
O sindicato dos analistas reclama ainda do fato de não ter sido chamado a construir, nem a assinar, o acordo não remuneratório. “Queremos respeito ao nosso histórico profissional e clareza na lei de atribuições. Nossas propostas não engessam a Receita”, encerrou Sílvia.
Em sua exposição, o presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco), Kleber Cabral, acusou o Sindireceita de fazer “terrorismo” nos gabinetes parlamentares ao, supostamente, afirmar que o artigo 4º do projeto criaria uma “casta de super autoridades”. “É lamentável que o sindicato de uma categoria esteja interferindo no cumprimento do acordo firmado por um sindicato de outra categoria”, ponderou.
Cláudio Damasceno criticou uma possível “desfiguração” da matéria. “A Receita Federal será a única instituição no Executivo que terá duas autoridades, sendo que uma delas será uma autoridade de apoio, acessória e preparatória”, afirmou, referindo-se aos analistas tributários.
Também quero!
O Sindicato Nacional dos Servidores Administrativos do Ministério da Fazenda (Sindfazenda), também presente na audiência, reivindicou o direito dos servidores do Plano Especial de Cargos ao bônus de eficiência oferecido a auditores e analistas. “Dependendo do estado que você estiver, será atendido por um servidor administrativo. Não existe diferenciação no atendimento entre um Pecfaz que desempenha as mesmas atribuições dos servidores da carreira de auditoria”, enfatizou.
Já a Associação Nacional dos Servidores da Extinta Secretaria da Receita Previdenciária (Unaslaf), traçou um panorama histórico da carreira, sua legislação e ligação à Receita Federal. “Ocorre que, passados nove anos da extinção da SRP, nós somos os únicos servidores que não integram a carreira de auditoria da SRF. Um claro descumprimento à lei. Isto precisa ser corrigido”, exigiu o presidente da Unaslaf, Marco Antônio da Silva.
O deputado Cabo Sabino (PR/CE) alertou para uma “digladiação” das carreiras nos gabinetes parlamentares e exigiu mais diálogo e entendimento, pela união do órgão.
Em meio ao “fogo cruzado” o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, pediu apenas celeridade na tramitação. “É muito importante para o governo que o PL, com os ajustes necessários, saia o mais rápido possível”, pontuou e afirmou às carreiras não contempladas que o Executivo estuda propostas.
O relator da matéria, Wellington Roberto (PR/PB) deve apresentar parecer na próxima semana.