Corrida contra o veto

Publicado em Servidor

Especialista em gestão pública calculam que a tesoura do Executivo, em apenas dois artigos, economizou R$ 11 bilhões aos cofres públicos, até 2019

Tão logo foi publicada a Lei 13.464/2017, que reestrutura carreiras e reajusta salários de oito categorias de servidores, os profissionais que se sentiram prejudicados iniciaram imediatamente a se movimentar para derrubar os sete vetos do presidente Michel Temer. Alguns dos itens excluídos da antiga MP 765/2016, que deu origem à lei, não tem impacto financeiro. Em parte, as reivindicações são por exclusividade de determinada carreira ou por mudança no acesso por concurso público àquele cargo. No entanto, técnicos do governo garantem que “a sociedade ganhou com a medida”. Calculam que a tesoura do Executivo, em apenas dois artigos, economizou R$ 11 bilhões aos cofres públicos, até 2019.

A explicação é porque a canetada do presidente Michel Temer excluiu, entre outros itens, quatro emendas parlamentares que permitiriam uma recomposição remuneratória para 69.149 professores, policiais, arrecadadores de impostos, engenheiros, arquitetos, economistas, estatísticos e geólogos do Amapá, de Roraima e de Rondônia (29.394 ativos e 38.755 aposentados e pensionistas). Na exposição de motivos do Ministério do Planejamento, com esses funcionários dos ex-territórios, estavam estimados gastos totais de R$ 10,913 bilhões: R$ 223 milhões, em 2016; R$ 3,7 bilhões, em 2017; R$ 3,42 bilhões, em 2018; e R$ 3,57 bilhões, em 2019.

O valor dos gastos subiria para R$ 10,913 bilhões, nos próximos dois anos, se fosse contemplado o artigo que incluía o pedido dos analistas de infraestrutura, de equiparação salarial ao pessoal do ciclo de gestão, com impacto de R$ 26 milhões, ao final do período. Para André Perim, presidente da Associação Nacional dos Analistas e Especialistas em Infraestrutura (Aneinfra), a proibição do Executivo surpreendeu. “O impacto era de 0,6% do valor total da MP e só entraria em vigor em 2019. Nós apresentamos cálculos, estudos técnicos e a adequação ao orçamento”, estranhou Perim. Segundo o líder sindical, o pessoal de infraestrutura pertence ao único cargo de nível superior que recebe salário abaixo da maioria.

“Nossa remuneração final é inferior à inicial do ciclo de gestão”, destacou Perim. Hoje, segundo ele, o ciclo recebe entre R$ 17 mil a R$ 25 mil e passará, em 2019, para o inicial de R$ 19 mil e ganho em final de carreira de R$ 27 mil. Os de infra, atualmente entre R$ 12 mil e R$ 16 mil, ficarão com R$ 13 mil a R$ 18 mil, respectivamente. “O governo tem que entender que não se trata de simples equiparação. O importante é reter o servidor e evitar que os projetos de infraestrutura percam a continuidade. Em 2012, tínhamos 100 profissionais no Ministério de Minas e Energia, por exemplo. Hoje, são apenas 60”, revelou o presidente da Aneinfra. Ele vai tentar primeiro, pelo lado administrativo, convencer o Planejamento.

Revolta

Os servidores mais indignados com o veto do Executivo são os médicos-peritos do INSS. Não se conformam porque não tiveram autorização para a exclusividade nas perícias da Previdência Social. “A categoria está perplexa e indignada. O governo se contradisse. O assunto já tinha sido discutido e aceito internamente, com a aprovação de todas as instâncias federais envolvidas. No final, a Advocacia-Geral da União (AGU) barrou o que era do desejo do próprio Ministério do Desenvolvimento Social (MDS)”, enfatizou Francisco Cardoso, presidente da Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência (AMNP).

A Associação trabalha pela derrubada do veto, exige do governo uma saída legal para esse impasse e o reconhecimento de que o país não pode abrir mão de uma perícia pública de qualidade. Estudos da ANMP apontam que os credenciados que fazem o trabalho da categoria, de cada 100 perícias, autorizam 85 pessoas a continuar de licença médica. Não definem de imediato o afastamento pelo período necessário. Fazem o paciente retornar ao consultório mensalmente para receber pelo atendimento. “Isso é um contrassenso que aumenta as despesas do Estado. E não é por falta de profissionais. É devido à má gestão do INSS, que coloca mais de 50% da força de trabalho em atividades-meio. Acho que agora a AGU vai ter que dar conta desses gastos”, reclamou Cardoso.

Desde terça-feira, quando foi publicada a Lei 13.464, no Diário Oficial da União (DOU), Carlos Silva, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (Sinait) já havia declarado que lamentava a não permissão à classe do direito de ter como privativo aos auditores o cargo de secretário de Inspeção do Trabalho. “Vamos trabalhar para derrubar o veto”, disse. O Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal) também garantiu que, imediatamente, iniciará uma nova fase do trabalho. “Que volta a ser a do convencimento parlamentar, desta vez para a derrubada do veto, muito mais difícil e pouco utilizada pelos nossos congressistas, mas que, nem por isso, pode ser desprezada”, destacou o Sinal.

Os insatisfeitos terão que correr contra o tempo. O pedido de derrubada de veto tem que ser feito por parlamentares. Assim, vão ter que se aliar a deputados e senadores que concordem em tomar a iniciativa. A partir do recebimento da informação da existência de vetos, o Congresso tem até 30 dias para apreciar em sessão conjunta (Câmara e Senado). “Para que o veto seja rejeitado, é necessário o voto da maioria absoluta dos deputados (257) e senadores (41). Não vale a soma dos parlamentares (298). Ao completar os 30 dias, caso os vetos não tenham sido apreciados, a pauta fica sobrestada (trancada)”, explicou Vladimir Nepomuceno, consultor e ex-assessor do Ministério do Planejamento.

No Congresso, já existem 17 vetos aguardando a união das duas Casa. O que pode impedir a votação do Orçamento de 2018, prevista para segunda-feira. “Se os servidores quiserem ser incluídos nesse rol de trancamento, deverão ter seus pedidos apresentados até essa data”, informou o especialista. A questão, no entender do advogado Marcos Joel dos Santos, do escritório Cassel Ruzzarin Santos Rodrigues Advogados é que uma atitude dessa natureza tem alto custo político. “Normalmente, o presidente da República tem maioria no Congresso. Ir contra o veto, significaria que a base está se insurgindo. Soaria até como um desaforo. Mas, em um governo fragilizado, tudo pode acontecer”, admitiu Santos.