A greve, por tempo indeterminado, pode prejudicar o ajuste fiscal do governo.
Os auditores-fiscais da Receita Federal vão cruzar os braços, em todo o Brasil, nesta terça-feira, em protesto contra a aprovação, em 31 de março, das emendas 40 e 41 à Medida Provisória (MP) 660/14, que compartilha atribuições privativas da classe com um cargo de auxiliar (analista-tributário). Segundo o presidente do sindicato nacional dos auditores (Sindifisco), Cláudio Damasceno, a greve, por tempo indeterminado, prejudicará o ajuste fiscal da equipe econômica da presidente Dilma Rousseff para cumprir a meta de superávit primário (economia para pagar os juros da dívida) de R$ 55,3 bilhões.
“Vamos parar até que a Receita Federal e o governo decidam interferir. A MP afronta a Constituição, atinge nossas atribuições e cria um trem da alegria. A paralisação pode comprometer o ajuste fiscal, porque os auditores, embora não tratem diretamente com o público, são responsáveis pela fiscalização, arrecadação e julgamentos na Receita Federal”, ameaçou Damasceno. Ele disse que o governo havia pedido um esforço concentrado da categoria. “Isso vinha sendo feito até a aprovação da MP”, reforçou.
Os auditores entendem que “há uma confluência de interesses inconfessos, para se alcançar, ao fim, a ascensão funcional de um cargo”. Dizem que a ampliação das responsabilidades mais tarde trará sérios impactos financeiros ao Tesouro, pois os analistas vão reivindicar promoção e elevação de salários. O movimento dos auditores estava previsto para o dia 16, com a ressalva de que seria antecipado se o texto passasse pela comissão mista do Congresso. Com a aprovação, a MP tranca a pauta e deve ser apreciada pela Câmara em 7 de abril. Vai depois ao Senado e à sanção presidencial.
Concentração de poder
Nos cálculos do Sindifisco, um dia de greve custa à sociedade e ao governo cerca de R$ 1,5 bilhão. Para o Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários (Sindireceita), acontece o contrário. “A União só tem a agradecer. Toda vez que eles param, a arrecadação aumenta. Basta olhar o histórico das paralisações”, ironizou Silvia de Alencar Felismino, presidente do Sindireceita. Ela informou que a MP 660 atende reivindicações de mais de 30 anos, sempre jogadas para debaixo do tapete pela RF. “Pleiteamos a melhoria dos serviços. Não queremos tomar o lugar de ninguém, muito menos burlar a Constituição”, explicou.
Silvia contou que, até 1997, as atribuições dos analistas iam além do que determinam as emendas 40 e 41. Quem fez mudanças radicais foi o então secretário de arrecadação, hoje secretário da RF, Jorge Rachid. “O resultado, na malha fiscal, por exemplo, foi que, antes, os pagamentos eram feitos ao longo do ano. Hoje, demoram mais de cinco anos. Quem perdeu? Nós ou a população”, questionou. E o trabalho era muito maior e feito no papel. Hoje, a tecnologia tornou tudo infinitamente mais fácil.
“Os auditores sabem que estamos com a razão e que a lei nos protege. Querem pressionar o governo e assustar a população”, desafiou Silvia, ao ressaltar, que as mudanças previstas nas emendas já estão consolidades em 24 estados. Além disso, as questões mais complexas, que envolvem altos volumes de dinheiro (empresas que optam por lucro real e presumido) são de responsabilidde dos auditores. Os analistas tratam apenas de pessoa física e micro e pequena empresas.
“Eles reclamam de coisas absurdas. Querem, por exemplo, trabalhar de 8 horas às 18 horas em aduanas, o que faz com que o Brasil perca competitividade. Mas e o crime? Trabalha em horário comercial ou é ininterrupto?”, ironizou. Ela revelou também que os auditores querem “salvar a nação de mais um trem da alegria”, mas a maioria deles não entrou na Receita por concurso público.
Em nota, o Sindireceita denunciou: “Curioso constatar que a esmagadora maioria dos auditores-fiscais nunca prestou concurso para o cargo. Entre os mais exaltados estão ex-controladores de arrecadação federal, ex-fiscais do IBC, do IAA, da Sunab e muitos ex-fiscais da Previdência, todos cargos transformados, a certa altura, no de auditor da Receita. Há muitos colegas do concurso de 1991, aquele que, por via judicial, permitiu o ingresso de mais de 5 mil pessoas ao cargo de auditor. Então, não seriam todos esses passageiros de legítimos trens da alegria? Não, em nossa opinião.”
Brasília, 08h00