Difícil o público leigo, do qual o blogueiro faz parte, ter elementos para torcer por um candidato ao Oscar de melhor montagem, devido ao caráter técnico da categoria. Este ano será um pouco diferente. A montagem de Os 7 de Chicago chama a atenção literalmente desde o primeiro minuto, quando, na sequência inicial, uma colagem de tirar o fôlego nos apresenta aos personagens principais do drama. O longa está indicado ao Oscar em outras cinco categorias ー melhor filme, melhor ator coadjuvante (Sacha Baron Cohen), melhor roteiro original, melhor fotografia e melhor música original ー e pode ser assistido na Netflix.
Sob a direção e com o roteiro de Aaron Sorkin (premiado com o Oscar pelo roteiro de A rede social), Os 7 de Chicago se passa em 1969 e em 1970, durante os mais de 150 dias de julgamento de um grupo acusado de liderar um confronto histórico em Chicago, em 1968, contrário à Guerra do Vietnã e a favor da candidatura de Hubert H. Humphrey à Casa Branca. O conflito com a polícia deixou feridos e escandalizou o país. Estava dado o impasse: os manifestantes se excederam e provocaram a polícia ou eles eram as vítimas da violência policial desmedida.
Mas não se engane, mais do que um thriller de tribunal daqueles que a gente adora, estamos diante de um longa sobre os homens por trás dos fatos históricos: Abbie Hoffman (Sacha Baron Cohen), Jerry Rubin (Jeremy Strong), Tom Hayden (Eddie Redmayne), Rennie Davis (Alex Sharp), David Dellinger (John Carroll Lynch) e Bobby Seale (Yahya Abdul-Mateen). A ação nos é mostrada a partir de flashbacks durante o julgamento dos 6 suspeitos ー o sétimo acaba tendo o julgamento separado. O recurso batido, usado à exaustão pelo cinema e uma armadilha para furos no desenrolar da trama, se ancora no ótimo roteiro de Aaron Sorkin.
Sobre gritos de “o mundo está assistindo”, o juiz Julius Hoffman (Frank Langella) começa o julgamento ー definido por um dos réus como “o Oscar dos julgamentos” devido à ampla visibilidade trazida pela cobertura do caso por parte da imprensa ー meio que sabendo a decisão que tomaria, mesmo sem antes ouvir os réus e as defesas dele.
Está exposta aí uma ferida da democracia: a interferência do poder Executivo no Judiciário e vice-versa. A disputa de poder do juiz com o advogado de defesa William Kunstler (Mark Rylance, muito bem no papel) e com os réus Bobby Seale e Abbie Hoffman é notória e, aos poucos, abre espaço para uma corajosa ode à democracia e à importância da independência entre os poderes.
É preciso o ex-procurador da república Ramsey Clark (Michael Keaton) entrar em cena como testemunha a favor dos réus. Ele ironiza (e irrita o magistrado, que o repreende) ao dizer que a disseminação de ideias pode representar mais perigo do que o tráfico de drogas ou armas e que, por isso, o juiz deveria tomar cuidado com protestos como os vistos em Chicago.
Assim como Michael Keaton, Sacha Baron Cohen brilha em tocante sequência em que o personagem dele fala no julgamento em nome de todos os acusados. Único réu negro do julgamento, Yahya Abdul-Mateen chama as atenções da primeira metade do filme todas para si. Cada um tem seu momento de protagonismo, o que faz de Os 7 de Chicago melhor.
Os 7 de Chicago é baseado em fatos reais, o que pode aumentar o choque de quem se vê diante dessa história pela primeira vez. É mais um dos casos em que gostaríamos que a realidade não passasse de mera ficção científica.
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