Um mundo de opiniões

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Sheakespeare disse que a gente deve aceitar o conselho dos outros sem nunca desistir da própria opinião. Mas não falou que todo mundo tem que ter opinião sobre qualquer coisa, distribuir pitacos a esmo, como as redes sociais estão propondo e parte do jornalismo vem engolindo. Nunca o povo falou tanto; nunca se ouviu tão pouco.

Aliás, é curioso como o brasileiro elegeu um dos sete sábios da Grécia antiga para ser sinônimo de palpite – que vem do latim palpitare, bater, agitar. Também é curioso que os sete sábios na verdade eram mais e nem pertenciam a uma confraria; historiadores contam até 22 personalidades merecedoras do título.

O fato é que Pitaco – ao lado de Tales, Bias e Solon – sempre esteve entre os sete titulares. E há muito vem sendo esculhambado nos trópicos. Não merecia ser envolvido nessa mixórdia atual, mas que tem origens anteriores.

No recém-lançado nono volume da compilação completa das tirinhas da turma de Charlie Brown e que reúne a produção de 1967 e 1968, Linus larga o cobertor para ligar para uma emissora de rádio: “Alô, quero falar sobre a política externa e sobre o que está acontecendo no exterior e sobre crianças e sobre alta nos preços e sobre filmes antigos…”

Continua no quadrinho seguinte: “Não gosto das tendências recentes e o que elas apontam e quero falar coisas boas sobre as árvores… certo… obrigado…tchau”. E arremata, já com o telefone no gancho (sim, havia ganchos!): “Adoro esses programas de rádio que aceitam ligações dos ouvintes”.

As redes sociais elevaram essa participação popular aos píncaros, mas ainda assim são opiniões presas a determinados nichos; é um ambiente para isso mesmo, participa quem tem vontade, acredita quem quer. Mas, no desespero de dar voz ao povo, os meios de comunicação abrem espaços generosos para participações diretas que deveriam envergonhar os responsáveis pela educação no país.

O poeta e dramaturgo britânico Oscar Wilde, que causou furor no final dos anos 1880, precisa ser sempre lembrado: “O jornalismo moderno tem uma coisa a seu favor. Ao nos oferecer a opinião dos deseducados, ele nos mantém em dia com a ignorância da comunidade”. É uma opinião sobre opiniões, diriam os mentalmente turvos.

Assim, apresentadores de tevê, que têm por obrigação ler os textos escritos pela redação e ainda se esforçar para fazer cara de inteligente, têm-se deleitado ao fingir que se importam com a posição da patuleia. Não se pode dizer que não servem como entretenimento à quem aprendeu a pensar antes de falar.

Estávamos no bar quando acabou o jornal local. Depois que vários telespectadores se manifestaram sobre os assuntos do dia, o Faixa – que não chega a ser um dândi, mas é metido a elite e anda meio amargo – desabafou: “Como é bom ouvir o povo! Só assim podemos saber que a ignorância continua e podemos dormir tranquilos em nosso travesseiro de cetim”.

A essas pessoas tão certas de tudo, sempre podemos apelar para as palavras do filósofo (de verdade) Paul Valery: “Nem sempre sou da minha opinião”.

Publicado no Correio Braziliense em 8 de julho de 2019

Paulo Pestana

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Paulo Pestana

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