Assombração, fantasma, aparição, visagem – os nomes são muitos para tentar definir o indefinível, normalmente ligado a tempos antigos, ambientes em ruínas ou abandonados e com teias de aranhas. Pelo menos é isso que nos apresentam desde que o homem começou a contar histórias, provavelmente em volta de uma fogueira com suas sombras bruxuleantes, e que a literatura e o cinema popularizaram.
Nos primeiros tempos eram histórias para, por meio do medo, catequizar, tirar as pessoas do mau caminho; uma espécie de educação social. Foi só em 1764 que o inglês Horace Walpole transformou o horror em divertimento, assombrando leitores com o livro O Castelo de Otranto.
Depois vieram Poe, Lovecraft, Shelley e Stephen King, entre milhares de escritores de maior ou menor talento, todos nos esperando atrás da porta que é a capa do livro para insuflar medo. Hoje nenhum deles é páreo para a nossa realidade.
Meu amigo não é supersticioso. Ao contrário. É um cético de carteirinha, quase um cínico quando alguém vem lhe contar uma história que não possa ser cientificamente comprovada. Depois de convencer a família, decidiu trocar o apartamento por uma casa com quintal, onde pudesse andar descanso na grama, deitar ao sol, essas coisas, sem ter que, antes, entrar no carro.
Encontrou uma casa antiga, mas bem conservada até porque havia sido reformada, num bairro tranquilo da cidade e que não tinha grandes diferenças das outras construções da rua. É preciso ressaltar que no caso de Brasília, antiga é uma casa de 50 anos, mais ou menos, ou seja, pelo que nos diz a tradição, não haveria tempo de um fantasma se instalar por aqui.
Empolgado, foi dormir na casa antes mesmo da mudança. Levou um colchão, roupas de cama e chamou a mulher; uma noite a dois, na casa que seria a definitiva. Traziam vinho, queijos e muita vontade de aproveitar a noite, que começou muito bem; namoraram como não faziam há tempos, celebraram, conversaram e foram dormir.
Um insistente barulho no sótão chamou a atenção. Era como se alguém estivesse esfregando alguma coisa no forro; não eram passos, mas um ruído constante que ia a voltava. Corajoso, o amigo pegou a escada e foi espiar, voltando aliviado e sorridente para a mulher: “Nem chegamos e já temos inquilinos – uma família de saruês!”.
Voltaram a deitar e pegaram no sono, até que outro barulho os acordou. Desta vez vinha do quarto ao lado mesmo, quem sabe da sala um pouco mais distante. Era um ruído metálico, acompanhado de uma estranha e monótona melodia. O bravo levantou-se, acendeu a luz e foi em direção ao silêncio, porque o barulho tinha parado. Não viu nada.
Voltou a deitar e o barulho voltou. Tudo se repetiu pelo menos cinco vezes. Abriu a janela para ver se era um vizinho. Nada. Ficou parado no quarto ao lado. Nada. Recostou-se na parede da sala. Nada.
Foi embora depois da noite em claro e decidiu que ficaria com a casa, mas antes encomendaria um descarrego, porque ele pode ser cético mas não é burro.
Publicado no Correio Braziliense em 27 de janeiro de 2023
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