Quem toca um instrumento logo conhece alguém que também toca, que conhece outro e normalmente isso acaba numa roda musical. A cada encontro, uma descoberta, uma alegria que contagia também quem gosta de música mesmo sem tocar nada; alguns até decidem aprender. Não há nada de anormal nisso.
O que é fora de série é um pessoal assim estar junto há 32 anos. Muitas caras novas apareceram, mas a Turma do Gambá parece invencível. Invulnerável até às intempéries.
Nem mesmo a pandemia que assusta principalmente quem tem idade provecta – como boa parte da turma – abala o pessoal. Sem poder celebrar como se deve, com abraços e coros improvisados, pegam carona na tecnologia e as reuniões semanais, que vinham sendo realizadas no Clube dos Médicos, agora ocupam o telefone celular.
Sem poder tocar juntos por causa da diferença de tempo causada pelas variadas conexões, o jeito foi improvisar para não deixar a música morrer, A cada semana é formado um grupo de WhatsApp e, pontualmente às 20h 30, Marco Aurélio dá início à cantoria acompanhado de seu violão, quase sempre com um clássico da música brasileira.
E os músicos – que durante o dia estão de gravata em alguma empresa, repartição ou até de pijamas e pantufas, no caso dos aposentados – vão se revezando, quase sempre em participações solo, algumas vezes em gravações feitas durante a semana e que são editadas para que todos os instrumentos obedeçam a ordem correta.
De vez em quando há um brinde – aos búfalos. Os neófitos podem estranhar o que bovinos e marsupiais fazem juntos, mas a justificativa é o efeito manada que, diante do predador, vitima os mais velhos, que vão ficando para trás.
Mas o que vale é a diversão e, se alguma coisa a pandemia está fazendo pelo grupo, é a renovação do repertório. Como um não depende mais do acompanhamento dos outros para inserir uma música menos conhecida, canções que andavam esquecidas ressurgem, arrancando aplausos virtuais da plateia que se diverte como se estivesse ao vivo.
Os músicos tocam de casa, uns na varanda, outros na sala, um deles (Marcondes) prefere gravar no banheiro, certamente para aproveitar a acústica dos azulejos. No repertório, há de tudo um pouco; muito Chico Buarque, algum Gilberto Gil, Caetano Veloso, muitas canções dos anos 40 e 50, como se a missão dos Gambás fosse cutucar cada um dos ouvintes para mostrar que o Brasil já teve uma das melhores produções de música popular do planeta.
A festa virtual também tem revelado outros talentos. Alguns músicos que atuavam mais como acompanhantes quando estavam ao vivo, estão se soltando e cantando, revelando novas facetas para os companheiros, alguns aparecendo diante de um piano – instrumento difícil de carregar.
O mais importante da iniciativa é preservar a amizade e a camaradagem da confraria, que já havia passado por vários locais antes de se instalar no éter, espera-se que por pouco tempo, já que o aumento de colaborações entre eles – na forma de gravações compartilhadas e editadas – mostra que os gambás estão loucos para se abraçar. É uma saudade de 32 anos.
Publicado no Correio Braziliensee, em 13 de setembro
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