Eles pareciam ser um daqueles retratos amarelados que o velho mundo deixou na parede mais suja. Disfarçados como dândis, com seus ternos bem cortados, cabelos engomados e modos afetados, chegaram a fundar um clube que nunca precisou de sede para fazer barulho e espalhar machismo e misoginia: o clube dos cafajestes.
Jovens bem-nascidos, pareciam a cara de um país pronto para se apresentar para o mundo naqueles anos 1940, 1950. Não eram. Fazendo fuzarca, humilhando mulheres, forjaram o protótipo do homem brasileiro, o machão que tudo podia, que usava a mulher como adereço, quando não como saco de pancadas. Dava-se como extintos.
Mas o índice dos agora chamados feminicídios já mostravam que os cafajestes –melhor denominados como covardes – continuam entre nós. Mas esses são a face mais doentia, mais patológica, casos de saúde mental e de polícia. São sujeitos que culpam o ciúme, um modo de buscar alguma justificativa para atos inomináveis .
O que ninguém esperava é que os cafajestes à moda antiga também continuassem por aí, até que o tal Mamãe, Falei – deputado eleito pelo que se anunciava como mais uma face moderna do país – expôs a caricatura que são esses rapazotes, se não bem-nascidos, certamente malcriados, e o desprezo que eles têm não apenas pelas mulheres, mas por qualquer ser humano decente.
“Elas são fáceis porque são pobres”, disse o camarada, revelando mais uma vez o que se esconde sob uma face progressista de quem se apresentava para liderar o país. É o típico caso que uma desculpa não representa nada, porque aquilo saiu como um jorro, mostrando o preconceito latente.
A onda politicamente correta faz isso. Força as pessoas a forçar uma autocensura que em nada é sincera, finge combater o mal sem esconder o rabo. De que adiantam palavras bonitas se a briga interior subsiste?
Brasília, com esse jeitão de cidade do faroeste, com famílias ainda em formação e nenhuma tradição, foi – e talvez ainda seja – um campo fértil para esse tipo de personagem. Os nossos cafajestes nasceram muitas vezes da frustração de não conseguir namorar ninguém sem abrir a carteira e de uma necessidade de se mostrar ativo.
A conversa do tal Mamãe, Falei com os amigos de pelada recorda velhas gírias canalhas de Brasília. “Hoje vou pegar uma o-agá?, diziam os playboyzinhos. Ou: “Hoje é dia de pegar dodó”. E saiam rindo feito hienas se refestelando nas sobras deixadas pelos leões.
‘Dodó’ era o codinome das empregadas domésticas, que naqueles tempos ermos tinham poucas opções de diversão – moravam com patrões, as cidades mais baratas ficavam longe – e se satisfaziam com alguns momentos de canalhice. ‘O-agá’ era uma sigla para origem humilde, mostrando que a pobreza sempre atraiu os canalhas, muito anos antes dessa guerra.
Cafajestes, canalhas, covardes, idiotas, o adjetivo pode variar, mas nenhuma deles alcança inteiramente o desprezo que se deve ter por esse tipo de gente. Não é simplesmente o caso de “cancelar” o perpetrador, como está acontecendo com o deputado, porque o problema é de todos: preconceito sobrevive como barata.
Publicado no Correio Braziliense em 20 de março de 2022
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