Não faz muito tempo que cientistas defenderam que a adolescência só terminaria aos 24 anos de idade. Pela lei brasileira, vai até os 18; americanos vão aos 19 (nineteen, último dos teens), quando terminam as principais modificações hormonais do corpo, principalmente o feminino. Mas essa discussão só existe porque esse pessoal não conheceu Orlando Pacheco.
Orlando nos deixou esta semana. Muito a contragosto, diga-se, até porque se recusava a envelhecer, disposto a provar que a adolescência era um estado permanente. Nem os cabelos e o cavanhaque imaculadamente brancos e os nove filhos disfarçaram sua juventude, como se Bob Dylan tivesse escrito a canção Forever Young (Jovem para sempre) para ele.
Enchia o ambiente com o entusiasmo mercurial dos apaixonados; tinha mil ideias por minuto mas, característica rara em publicitários, sabia ouvir, respeitar e acatar opiniões contrárias. Era capaz de pegar uma sacada de alguém e trabalhar nela como se fosse dele; sabia ser gentil, companheiro e grato.
Quando o convidei para um trabalho fora de Brasília, chorou. Não que precisasse do serviço, mas porque ficava comovido quando alguém mais novo o chamava. Não era vantagem, ele chorava à toa. E largava tudo para chegar em casa antes das cinco da tarde: tinha que pôr os passarinhos para dormir.
Foram quatro meses de imersão total, morando no mesmo hotel, comendo nos mesmos restaurantes, trabalhando no mesmo horário. Sanguíneo, como se definia, variava entre a fúria de seu xará da ópera de Vivaldi, e a absoluta doçura, certamente consequência de seu vício em chocolate ao leite.
Orlando ouvia música nos textos. Sua especialidade era dirigir pessoas que tinham que ler algo que ele havia escrito; passava horas a procura da dicção correta, da inflexão exata, ao ponto de irritar os apressados; era um obsessivo, um João Gilberto da oração, a procura da cadência e do tom mais que perfeitos.
Nossa última aventura foi típica de adolescentes; jornada improvável, desafiadora, em que traçamos a estratégia que novamente nos levaria à vitória, como nas aventuras de Tom Sawyer e Huckleberry Finn faziam. Hoje, resta ouvir Dylan.
Jovem para sempre
Que Deus o abençõe e acompanhe sempre
Que todos seus desejos se tornem realidade
Que você sempre faça para os outros
E deixe que outros façam por você
Que você construa uma escada para as estrelas
E suba cada degrau
Que você fique jovem para sempre
Jovem para sempre, jovem para sempre
Que você fique jovem para sempre
Que você cresça para ser justo
Que você cresça para ser verdadeiro
Que você sempre saiba a verdade
E veja as luzes ao seu redor
Que você seja sempre corajoso
Permaneça em pé e seja forte
Que você fique jovem para sempre
Jovem para sempre, jovem para sempre
Que você fique jovem para sempre
Que suas mãos estejam sempre ocupadas
Que seus pés sejam sempre rápidos
Que você tenha uma base forte
Quando os ventos das mudanças voltarem
Que o seu coração seja sempre feliz
Que sua canção seja sempre cantada
Que você fique jovem para sempre
Jovem para sempre, jovem para sempre
Que você fique jovem para sempre
Publicado no Correio Braziliense, em 22 de dezembro de 2019
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