O homem como ele é

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Todo homem é mau, nasce violento e precisa de um estado com leis fortes para conter seus impulsos. A teoria é de Thomas Hobbes, filósofo inglês do século XVI, que se debruçou no estudo da natureza humana em obras como Leviatã.

E mais: sustenta que, para conviver socialmente – o que seria contra sua natureza – o ser humano precisa se abster do que é mais importante no seu natural estado de selvageria: a liberdade. “O homem é o lobo do homem”, escreveu, defendendo que o cidadão deve se render a um poder absoluto – era intransigente defensor na monarquia.

No mundo atual as ideias de Hobbes foram inteiramente abandonadas; mais até, foram subvertidas. Os direitos individuais sobrepõem o coletivo; os desejos – qualquer um – são encarados como apanágios inalienáveis, ainda que sejam negações científicas. Mais vale o privilégio de se reconhecer como qualquer coisa – até uma bananeira, se quiser.

Enquanto isso, direitos de animais irracionais – ainda existe essa classificação? – aumentam. Cachorros podem andar de avião, quem não socorrer um bicho pode ir preso, se um saruê entrar no seu sótão não pode ser apreendido nem para ser devolvido à mata. Mais um pouco, comer um frango ao molho pardo vai ser considerado incentivo ao crime.

Voltemos a Hobbes e aos homens, já que os outros bichos não sabem ler. O que nos separa – principalmente o gênero masculino – da barbárie são as mães e as Leis. Há uma raiva reprimida que explode por quase nada. Num átimo, todo resquício de racionalidade dá lugar ao Mr. Hyde que trazemos na alma, pronto para irromper.

O homem só deixa de ser violento quando reconhece a própria agressividade, quando tem a chave da própria jaula. E olhe lá. Essa beligerância aparece com mais força nas relações com a mulher; aí o bicho macho pega.

No reino animal – com exceção da abelha e das formigas, que regem suas comunidades com ferrão de ferro, como gosta Hobbes – o homem usa a força para se impor. Quando as mães falham, a Lei é o único freio.

Menino de calça curta, lembro que o pai de um dos meus melhores amigos, todo sábado de manhã, se trancava com a mulher no quarto do casal; o barulho das chibatadas do cinto era ouvido de longe, assim como os gritos da dona Neuza.

Os filhos fingiam não saber nada, os vizinhos até ligavam para a polícia, mas a violência doméstica ainda não estava na agenda daquela época. Em briga de marido e mulher ninguém metia a colher.

Não é preciso chegar às vias de fato para que a violência emerja. Um gentil amigo quebrou quatro dedos da mão com um murro na parede; numa briga com a mulher, socou o reboco. Melhor assim, mas foi castigado: foi ela quem o levou ao hospital, repetindo tudo.

Nos anos 70 o profeta Gentileza passou um tempo em Brasília, com suas barbas longas e carregando um cartaz: “Gentileza gera gentileza”, estava escrito, entre frases e palavras. Era chamado de louco. E há quem ache que esses brutamontes do UFC é que são normais. E a pergunta roda: como domar o lobo do homem?

Publicado no Correio Braziliense em 6 de agosto de 2023

Paulo Pestana

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Paulo Pestana

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