Já sabemos que a música tem pelo menos cem mil anos a mais que o homo sapiens. Arqueólogos encontraram flautas primitivas com mais de 200 mil anos, ou seja, o dobro da idade da nossa espécie. Pitágoras acreditava que a música era a responsável pela harmonia entre homens e astros regentes da vida universal. Darwin afirmou que a música foi preponderante para a atração sexual; ou seja, sem ela não haveria reprodução. Ou não haveria tanto prazer, pelo menos.
Mas nos nossos dias a música parece ter virado incômodo. O bar Tiborna, da 403 norte, aberto há mais ou menos um ano e meio com música instrumental ao vivo, acaba de dispensar definitivamente seus músicos. Foi vencido pelo mau humor e pela intolerância de um morador próximo, que pelo jeito não gosta do que Darwin descobriu.
Inicialmente, o bar contava com um grupo de quatro músicos, meses depois reduziu pela metade, sempre sem vocal, para que não houvesse amplificação ou coro dos frequentadores; tudo para que ninguém se sentisse incomodado. Nenhuma das providências satisfez o vizinho que pelo jeito gostaria de morar no Campo da Esperança.
O bar foi multado em R$ 6.000,00 na primeira vez por supostamente superar os decibéis permitidos – sendo que o simples para dos carros na rua faz isso; na segunda, a multa foi de R$ 8.000,00; na terceira, dobrou: R$ 16.000,00.
O grave é que não houve passeata de vizinhos pedindo silêncio; não houve nem uma reunião de moradores; não houve nada. Um único e solitário sujeito, morador da quadra comercial – local em que, se a Lei fosse realmente cumprida no Distrito Federal, seria proibido de abrigar residências – protestava insistentemente, o que mostra que as regras continuam sendo feitas pela minoria, sem conversa, sem razão.
Também impressiona a falta de sensibilidade do antidarwinista que não namora e não quer deixar ninguém namorar, mesmo com a fartura de remédios para estimular o apetite sexual das pessoas nas farmácias.
Não eram músicos quaisquer que atuavam no local. Durante muito tempo, por exemplo, Jaime Ernest Dias dedilhou seu violão por ali. E o valoroso membro da família que se confunde com a história musical da cidade, pode ser acusado de qualquer coisa, menos de fazer barulho.
A qualidade do seu serviço pode ser avaliada pelo disco Violão Brasiliense, em que ele recolheu peças de vários compositores da cidade, para tramar um mosaico da produção local.
Sabemos que a música provoca emoção, liberta o cérebro de hábitos congelados e faz a mente se movimentar de forma diferente do habitual, tudo comprovado pela ciência. A música pode estimular ou acalmar, faz o ouvinte viajar para outras épocas, cria um ambiente mais criativo e ajudar no desenvolvimento da sinapse dos bebês.
Os obtusos acham que vencem quando calam um local dedicado à boa música. Chegam a comemorar no silêncio de suas almas e mentes. Mas o que verdadeiramente acontece é uma derrota da civilização.
Só Drinks – O bar mais botafoguense do mundo foi reaberto, mas em novo endereço. Está na 203 norte, virado para a quadra.
Publicado no Correio Braziliense, em 9 de junho de 2019
Há poucos lugares mais opressivos que sala de espera de médico. Com essas clínicas coletivas,…
Pinheirinhos de plástico com algodão imitando neve, um velhinho barbudo de roupa vermelha, renas do…
A cidade está colorida de novo. Agora são as árvores de cambuís, que vestem as…
Rir é o melhor remédio, diz o bordão popular. Mas certamente isso não se aplica…
Chegara a vez do homem de chapéu. A pele clara e castigada pelo sol tinha…
E agora descobrimos que guardar segredos faz bem à saúde. As tais reservas – desde…