Não acredito mais em cigarras. Semana passava elas se engoelaram numa algazarra infernal e pararam de repente, anunciando uma chuva que, pelo menos até a hora em que essas linhas vão preenchendo a página branca, não caiu. Como diz minha mãe, e ninguém mais, que canícula!
Eu sempre acreditei mais nesses insetos – que aliás não têm goelas, mas um aparelho estridulatório – do que na Maju do Jornal Nacional. Melhor que elas, só Dona Amelinha que tinha o dom de dizer até a hora da chuva cair, avisada pela dor nas juntas.
No interior me ensinaram que basta olhar o café para saber se vem água do céu. É só reparar nas bolhas formadas pelo líquido quando sai do bule para a xícara – se forem para um dos cantos, batata! Vai chover. Se ficarem no centro, pode deixar as galochas em casa.
Vou logo adiantando que nunca testei, porque não sou de ficar olhando café, mas há uma explicação científica: a pressão atmosférica mais elevada faz com que as bolhas fiquem nas bordas. Não funciona com pinga, porque quando são formadas bolhas nas bordas é melhor beber logo – sinal que a qualidade é boa.
Também vem do interior outro modo de detectar se vem chuva: se as vacas se deitarem é sinal que estão sentindo a pressão aumentar. É parecido com o fenômeno dos pássaros, que voam mais baixo pelo desconforto causado pela mudança de tempo.
Conheci uma moça que tinha um método infalível, que inclusive a deixava de mau humor: observava os próprios cabelos que, no primeiro sinal de umidade, se encaracolavam. E ela nem sabia que os primeiros instrumentos para medir a umidade do ar foram feitos a partir de fios de cabelo tensionado.
O fato é que a chuva pode espantar o calor, mas pode ser problema. Como cantavam Teodoro e Sampaio na velha moda: “Será que vai chover?/ Não, não vai/ Se chover faz muito barro/ E de casa meu amor não sai”.
No caso das cigarras, a explicação também é científica: não conseguem bater as asas quando a umidade está muito alta; e sem esse movimento elas não gritam. Como a gente sabe que só os machos cantam, e o fazem para chamar as fêmeas para copular, é de se imaginar que eles não gostam da função durante o banho.
Curioso é que apesar da fábula de Esopo – adaptada por La Fontaine e Monteiro Lobato – a própria cigarra não suporta o canto, tanto que tem tampões naturais que protegem os tímpanos da zueira. É como um metaleiro com tufos de algodão nas orelhas.
Não sou biólogo nem naturalista, mas não encontro sentido na vida de um bicho que fica enterrado de dois a cinco anos antes de sair para morrer; no caso das fêmeas, morrem assim que põem os ovos. Além disso, implico com as cigarras desde que descobri que foram as responsáveis pela morte do meu pé de acerola.
Ou seja, as cigarras não servem para nada. Como se vê agora, nem para anunciar chuva.
Publicado no Correio Braziliense em 6 de outubro de 2018
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