Quando foi que a estupidez se tornou um estilo de vida? Até onde eu me lembro, a gente se esforçava para parecer mais inteligente, culto e sábio do que realmente era; muitos decoravam poemas inteiros, outros liam orelhas de livros para tentar substituir o nunca lido – daí a criação da expressão “de orelhada”, para definir qualquer conhecimento raso – e havia quem chutasse. Valia qualquer coisa para não passar batido.
O festival de ignorância é mundial, mas aqui estamos bem representados. Uma pesquisa realizada há dois anos mostrou que o Brasil ocupa um honroso segundo lugar no ranking da estupidez; só ficamos atrás da África do Sul. Os pesquisadores usaram a percepção da realidade como forma de medir o grau de inépcia do povo.
Cerca de 15 milhões de brasileiros acreditam que a Terra é plana. E não adianta mostrar as tantas fotos e a profusão de provas palpáveis e científicas que dizem o contrário, porque essas pessoas foram convencidas por elas mesmas e mais ninguém. Ou seja: não são céticos, só preferem acreditar em outras coisas – mesmo que sejam absurdas.
Ironicamente, a ignorância grassa exatamente na época em que a informação é mais abundante, graças à difusão dos meios digitais. Basta que alguém espalhe que não se deve tomar vacina, que os idiotas se colocam a inventar motivos para justificar a posição, ainda que alguém refute com dados científicos. Há quem veja o fenômeno como uma reação das pessoas ao senso comum, numa época em que se busca desesperadamente uma identidade própria.
Mas não é só, já que muitas vezes a estupidez é oficial. Nos Estados Unidos, o presidente Trump espalhou uma média de 15 mentiras por dia desde o início do governo, segundo o jornal The Washington Post. Foram 10.111 informações falsas ou enganosas em menos de três anos governo.
No Brasil acho que ninguém está contando, mas o festival oficial de disparates não é menos significativo. E aqui o presidente se reveza com os ministros.
Vivemos numa era de preguiçosos. Só isso explica a quantidade cada vez maior de livros de autoajuda – agora com direito a palavrões na capa – nas livrarias que sobraram. Livros como o Segredo da mente Milionária se propõem a deixar qualquer um rico, muito rico; o tema está também em Do Mil ao Milhão, Pai Rico, Pai Pobre e Quem Pensa Enriquece. Mais um pouco, estará resolvido o problema da pobreza.
Mas há títulos para toda angústia: Mais Esperto que o Diabo (que traz uma entrevista inédita com o próprio tinhoso), Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas (que deve ser um manual para amigos da onça), O Poder do Agora (que promete uma iluminação espiritual para a vida) e o Poder do Hábito (que tem mais uma fórmula infalível para o sucesso profissional).
É assim: o sujeito investe algo entre R$ 40,00 e R$ 50,00, lê entre 300 e 400 páginas e está pronto para conquistar o mundo. Ou, no mínimo, contribuir para o festival de bobagens e mentiras que ouvimos todos os dias.
Publicado no Correio Braziliense em 8 de setembro de 2019
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