A culpa é da vaca

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O anúncio do fim de mundo vem sendo feito há pelo menos 2.500 anos. O vaticínio pode estar numa placa carregada por um sujeito barbudo, nas profecias esotéricas ou nos cálculos matemáticos. Até agora temos resistido, aos trancos e barrancos; e os cientistas mais otimistas dizem que o fim virá, mas só daqui a 10 duotringitilhões de anos – faça os cálculos!

Até agora todo mundo errou. Cincaram clérigos como o bispo Hilário de Poitiers, que marcou o ano 365 como o fim da humanidade, a partir da chegada do anticristo; gorou. O monge espanhol Beato de Liebana apostou do dia 6 de abril de 793 e até o Papa Silvestre II, que detinha a representação divina no planeta, fez sua fezinha: o apocalipse se daria dia primeiro de janeiro do ano 1000.

Matemáticos falharam nos cálculos. Michael Stifel acreditou que a existência acabaria em 1533, enquanto Jacob Bernoulli marcou a última folhinha para 1719. Piramidólogos são sujeitos que enxergam fenômenos a partir dos mausoléus faraônicos e, assim, Charles Piazzi Smyth, também astrônomo da corte britânica, marcou o encerramento das atividades humanas para algum dia entre 1892 e 1911 – como morreu em 1900 não passou muita vergonha.

Muita gente séria caiu na tentação de marcar data para o fim de tudo. Camille Flammarion, chamado de poeta da astronomia por causa de seus estudos sobre o efeito do sol sobre as paisagens lunares, afirmou que o cometa Halley passaria tão perto da Terra que iria impregnar a atmosfera acabaria com a vida, em 1910. Espertos da época ganharam dinheiro com o aval do sábio, vendendo pílulas anticometa e até guarda-chuvas contra radiação.

Cristovão Colombo devia estar inebriado pelo sucesso da sua empreitada pelo Novo Mundo quando escreveu o Livro das Profecias e garantiu a data fatal em 1656. E explicou: como mundo havia sido criado em 5343 a.C. e duraria 7.000 anos, era só fazer as contas. Mas o mundo dele acabou em 1506.

Até santos erraram. Santo Irineu de Lyon previu o fim para 500, São Gregório de Tours marcou entre 799 e 806. Martinho Lutero, religioso que cindiu a Igreja Católica e, em última instância é o responsável por esses pastores da TV, acreditava que a gente só iria até 1600. Picaretas também erraram: terraplanistas como Wilbur Glenn Voliva (1935), ufólogos como Dorothy Martin (1954) e até profetas com Nostradamus (1999), que dizem ter acertado tanta coisa, passaram longe nas previsões catastróficas.

A Terra foi condenada de diversas formas. O planeta seria vítima de um choque cósmico com um cometa desgovernado, poderia acabar em chamas provocadas por uma explosão solar ou pela pressão de seu centro incandescente que explodiria num mar de lava.

Houve quem vaticinasse a inundação de tudo a partir do degelo das calotas polares, quem previsse uma invasão de alienígenas malvadões ou até a chegada de anjos pilotando naves espaciais. Tudo espetacular. Menos os que apostaram na destruição por um vírus…

O que ninguém nunca esperou é que o mundo fosse acabar por causa do pum de uma vaca gorda.

Publicado no Correio Braziliense em 21 de novembro de 2021

Paulo Pestana

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Paulo Pestana

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