Nem o Brasil nem o Chile. Muito menos Roberto Rojas ou Rosinery Mello. O maior punido pela farsa de 1989 é Mário Filho. Não o jornalista e escritor. O estádio que o homenageia. Trinta e dois anos depois do maior incidente diplomático entre as duas seleções no campo da bola, o Maracanã voltará a receber o duelo nesta quinta-feira, às 20h30, pela penúltima rodada das Eliminatórias para a Copa do Catar.
Em 3 de setembro de 1989, Brasil e Chile se enfrentaram pela última vez na principal arena do futebol nacional. Apenas três jogadores convocados por Tite eram nascidos: Daniel Alves, Weverton e Felipe. Valia vaga para a Copa da Itália, em 1990. Aos 24 minutos do segundo tempo, quando a Seleção vencia por 1 x 0, gol de Careca, a torcedora Rosinery Mello, de 24 anos à época, atirou no gramado um sinalizador usado em embarcações. A chama caiu perto do goleiro Roberto Rojas. Ele atirou-se ao chão e saiu ensanguentado. O Chile seguiu para o vestiário, não voltou a campo, e o juiz Juan Lostau encerrou o confronto.
Presa em flagrante, Rosinery foi solta quando a farsa chilena veio à tona. O sinalizador não atingiu Rojas. Ele mantinha uma lâmina na luva e cortou o supercílio para simular o atentado. Exames de corpo de delito não encontraram vestígios de pólvora no ferimento do goleiro.
O Brasil avançou à Copa. Desqualificado, o Chile ficou impedido pela Fifa de disputar as Eliminatórias de 1994. Rojas, o técnico Orlando Aravena, o médico Daniel Rodríguez e o dirigente Sergio Stoppel foram banidos. Rosinery virou celebridade. Posou para a revista Playboy, recebeu homenagens no Chile e morou em Brasília, onde vendeu cachorro-quente na QI 22. Em 2011, sofreu aneurisma cerebral e morreu aos 45 anos, no Rio.
O goleiro Roberto Rojas vive em São Paulo. Na Copa América de 2019, lembrou do episódio em entrevista ao blog. “Assumi o erro. Sou pai, chefe de família. Como eu poderia cobrar um filho meu sem tentar corrigir o meu passado? Assumi o que cometi. Eu decidi reconstruir a minha vida depois de ficar muito tempo escondido dentro de casa e recuperei o respeito”, diz.
A reinserção ao futebol teve o afago humano de um mestre. “Quando você assume os erros, as portas se abrem. Em 1993, o Telê Santana convidou-me para trabalhar com ele sem nos conhecermos. Conversamos em Santiago, e ele disse que queria trabalhar comigo. Respondi: ‘como assim?’. Ele reiterou. Como eu diria não? Ali começou uma nova etapa na minha vida”, emociona-se.
O castigo do Maracanã chega ao fim depois de 32 anos. Após perambular por 20 estádios diferentes, o duelo entre Brasil e Chile retornam ao estádio onde o Chile eliminou a Espanha da Copa de 2014, mas não enfrenta Brasil desde aquele 3 de setembro de 1989. Depois de perambular por 12 países diferentes, incluindo o duelo está de volta para o seu aconchego: o Maracanã.
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