Do “Fergie Time” ao “Jesus Time”: o milagre da multiplicação de gols na épica final da Libertadores

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Acaba a final da Libertadores. O amigo são-paulino Gustavo Marcondes envia mensagem via Whatsapp refrescando a memória: “Épico, hein?! Igual Manchester United x Bayern. Verdade!

Confesso que, na hora dos gols de Gabriel Barbosa na virada do Flamengo por 2 x 1 sobre o River Plate, nem lembrei dos gols de Sheringham e Solskjaer na reviravolta ainda mais histórica dos Diabos Vermelhos, no Camp Nou, na decisão da Champions League de 1999. Acho até que aquela foi maior. O jogo estava nos acréscimos. O empate saiu aos 46 e o título chegou ao 48. O feito ficou marcado como “Fergie Time”, referência ao vitorioso técnico escocês Alex Ferguson comandante do United por 26 anos.

Gabigol empatou no “Pet Time”, ou seja, aos 43 do segundo tempo, lembrando a cobrança de falta perfeita do meia sérvio na decisão do Carioca de 2001. Gabigol voltar a balançar a rede aos 46. Logo ele, refugo da Europa. Não vingou na Inter nem no Benfica, mas será lembrado para sempre como o João Danado de 2019 — apelido de Nunes, o Artilheiro das Decisões no timaço dos anos 1980 regido por Zico, Júnior e companhia limitada.

O fato é que a primeira decisão da Libertadores em jogo único foi um espetáculo do início ao fim. Apedrejei a ideia da partida única. Defendi a manutenção do velho modelo de ida e volta. No entanto, me rendi aos dados do governo peruano. Os números apontaram que 24 mil brasileiros e 17 mil argentino entraram no país — 60% nos três dias anteriores à decisão. Sinal de que os fanáticos vão de qualquer jeito. Talvez, o problema seja quando os finalistas não forem tão populares quanto Flamengo e River Plate.

Apesar da crise no Chile, dou a mão à palmatória: a Conmebol se superou. Não estive em Lima, mas pele tevê achei a festa linda do início ao fim. O amigo Fernando Jordão marcou presença no estádio e reclamou apenas da demora na abertura dos portões. Não sou fã dos artistas que se exibiram no pré-jogo do Estádio Monumental, porém, se a tentativa foi dar um clima de final de Champions League ao espetáculo, a tão criticada entidade sul-americana conseguiu. A cópia foi praticamente perfeita até na customização da bela arena do Universitario.

Sucesso fora e dentro do campo. Antes de a bola rolar, conversava com um dos maiores ídolos do futebol argentino. Mario Alberto Kempes, símbolo do primeiro título dos hermanos na Copa do Mundo de 1978 dizia-me que a decisão tinha nível de final de Champions League. Achei exagero, mas como discordar de um craque como ele. Houve intensidade do início ao fim, debate tático à flor da pele entre os competentes Jorge Jesus e Marcelo Gallardo, belos gols, uma organizadíssima cerimônia de premiação e a grandeza do tetracampeão River Plate nas redes sociais ao parabenizar o adversário pelo bicampeonato continental. Sem contar o comportamento harmonioso no estádio (até onde eu vi) entre as duas torcidas.

A clonagem da Champions League ficou mais legal com o sucesso de Jorge Jesus. O português igualou o feito do croata Mirko Jozic à frente do Colo-Colo, em 1991, e se tornou o segundo europeu a colocar o título da Libertadores no currículo. Mais um exemplo a alguns treinadores xenófobos do futebol brasileiro de que o intercâmbio faz muito bem deste e do outro lado do Oceano Atlântico. O argentino Luis Carniglia brindou o Real Madrid com o bi da Liga dos Campeões em 1958 e 1959. Helenio Herrera foi o mentor do bi da Inter em 1964 e 1965.

Por falar em treinadores, Marcelo Gallardo mostrou mais uma vez que está na hora de pegar o rumo da Europa. Fez o Flamengo provar o próprio veneno. Sufocou os laterais Rafinha e Filipe Luís; deixou Willian Arão e Gerson em pânico na saída de bola; desarticulou enquanto pôde o quarteto formado por Everton Ribeiro, Arrascaeta, Bruno Henrique e Gabigol; e fez Diego Alves trabalhar horrores. O Flamengo Jorge Jesus sabe jogar bola, mas não conseguiu. Mas, por incrível que pareça, Jesus mostrou o que a maioria dos técnicos brasileiros adora: soube sofrer.

Se a épica final da Champions League de 1999 está eternizada com o “Fergie Time”, a de 2019 da Libertadores pode ser lembrada pelo “Jesus Time”. Uma apoteose em três minutos iniciada por um inesperado gol de Gabriel Barbosa no “Pet Time” em uma rara escapada da marcação implacável do veterano zagueiro Pinola. O beque de 36 anos deixou Gabigol no bolso por 88 minutos. Esqueceu que o jogo ainda não havia acabado e viu o camisa 9 acabar com a partida depois do chutão pra frente de Diego, lembrando o gol de empate do Brasil contra a Argentino na final da Copa América 2004. Aquele do Adriano Imperador, que também tirou a camisa na comemoração ao igualar o placar nos acréscimos e forças os pênaltis também em Lima.

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Marcos Paulo Lima

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