Cristiano Caus Para Cristiano Caús, limite de comissão e condição de pagamento alimentam o imbróglio Para Cristiano Caús, limite de comissão e condição de pagamento alimentam o imbróglio

Agentes de futebol x Fifa: entenda o cabo de guerra nos bastidores do mercado

Publicado em Esporte

Enquanto o mercado fervilha no abre e fecha das janelas de transferências, atores decisivos nas negociações se articulam nos bastidores em uma arrastada disputa jurídica. Suspenso pela 7ª Vara Cível da Regional da Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro, desde 18 de dezembro do ano passado, o Regulamento Nacional de Agentes de Futebol da CBF perdeu temporariamente a aplicabilidade. A nova ordem havia sido introduzida pela Fifa em janeiro de 2023, e reproduzida no país a partir de outubro do ano passado. No entanto, as diretrizes sofreram resistência em cadeia na Alemanha, Espanha, Inglaterra e no Brasil. Os principais pontos da discórdia são o limite de comissões e pagamento trimestral; necessidade de licença Fifa para atuação nacional e, especificamente para brasileiros, a exigência de provas em inglês, espanhol e francês. Na entrevista a seguir ao blog Drible de Corpo, o advogado Cristiano Caús, especialista em direito desportivo e sócio fundador responsável pela área de Direito Desportivo da CCLA Advogados, explica a queda de braço didaticamente.

 

De uma forma didática, o que é um agente de futebol? 

Agente de futebol é um profissional habilitado pelas entidades esportivas (CBF e/ou Fifa) para atuar como representante de atleta e/ou intermediário de transações que visam a transferência do jogador, contratação ou a renovação do contrato com o clube. Os agentes podem representar também treinadores e clubes.

 

Como se tornar um agente de futebol?

Cristiano Caús — Na CBF, segundo o regulamento em vigor (19/2/2024), você deve apenas se cadastrar por meio do envio de documentos, pagamento de taxa e contratação de seguro. Na Fifa, você deve ser aprovado em exame organizado pela entidade e depois pagar uma taxa de inscrição.

 

Concorda com a exigência de uma prova aplicada pela entidade para que eles possam atuar em transações de jogadores e treinadores entre países diferentes?

Concordo.

 

Como era o regulamento dos agentes de futebol?

Até 2015, o regulamento de agentes de futebol era muito parecido com o que a Fifa publicou no ano passado (2023). A profissão era internacional e havia a necessidade de aprovação em exame. No entanto, os exames foram interrompidos ainda na década anterior, o que fez com que muitas pessoas trabalhassem sem licença.

 

Houve mudanças depois disso?

Em 2015, a Fifa publicou o regulamento de intermediários e a partir de então os cadastros passaram a ocorrer nas federações nacionais, sem a necessidade de exame. Ano passado, a Fifa voltou a tratar do tema e trouxe de volta os exames. Entretanto, a Fifa mexeu no limite de comissões e condições de pagamento, o que causou muita insatisfação. Choveram ações em diversos países contra o novo regulamento. 

 

Qual é o panorama atual?

Por conta de decisões emanadas dos principais países do futebol mundial, a Fifa recuou e hoje está em vigor, novamente, o regulamento de intermediários. Porém, tal assunto não está encerrado e novas decisões poderão ser proferidas.

 

Por que foi proposta uma reforma?

A FIfa pretendia cuidar diretamente dos agentes como era no passado. Para isso, criou uma câmara internacional para os agentes, o que é muito melhor do que litigar em cada país a qual pertence eventual clube inadimplente, por exemplo. Ela também organizou exame para que os agentes tivessem um mínimo de conhecimento sobre os regulamentos do futebol e lançou mão de um sistema de registro de contratos. Até aí, tudo positivo, mas o problema foi mexer nas comissões e na forma de pagamento das mesmas. Essa talvez tenha sido a real intenção por trás do novo regulamento, e isso não foi aceito pela categoria. 

  

Quais são os principais focos de polêmica?

Limite de comissões e pagamento trimestral; necessidade de licença Fifa para atuação nacional e, para brasileiros, provas em inglês, espanhol e francês.

 

A Associação Brasileira de Agentes de Futebol (Abaf) entrou solando contra a decisão. Tem razão?

A Abaf representa agentes associados e defende os interesses deles.

 

Por que é um erro considerar agentes de futebol membros associados da Fifa ou da CBF? Não são profissionais autônomos?

Segundo diversas decisões antigas e atuais, a Fifa tem o direito de regulamentar a matéria, uma vez que os agentes exploram uma atividade cuja titularidade é dela. Além disso, a dimensão internacional das operações acarreta na necessidade de padronização e regulamentação.

 

Em quais pontos o regulamento fere regras nacionais como a Lei Geral do Esporte? 

Não fere. As ações intentadas se basearam na constituição e em outras leis para alegar reserva de mercado, proibição ao livre exercício da profissão, direito adquirido nos contratos em vigor, etc. 

 

Por que Alemanha, Brasil, Espanha e Inglaterra se mobilizaram contra a Fifa e conseguiram suspender a implementação?

Basicamente, limite de comissão e condição de pagamento. No Brasil, ainda, o exame em outro idioma.

 

Qual é a solução em curto prazo para pacificar os dois lados?

Difícil dizer, mas no momento a Fifa espera decisões definitivas nas ações propostas. Depois analisará se o regulamento necessita de ajustes. Por enquanto, o regulamento está suspenso e volta a vigorar o regulamento de intermediários nacionais. Porém, os exames estão mantidos e para operações de dimensão internacional, em alguns países, a licença Fifa ainda é exigida.

 

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