Carlos Manuel Brito Leal Queiroz, 64 anos, nasceu em Nampula, cidade de Moçambique. Filho de treinador de futebol, ele diz que não poderia ser outra coisa na vida. E jogar bola era a única diversão para aqueles meninos. “A genética e esse ambiente me levou a esta vida”, conta o atual técnico da seleção do Irã, em entrevista ao blog. A história do moçambicano filho de pais portugueses começa na África e roda o mundo, seja como goleiro — enquanto ainda jogava —, seja na beira do campo, aprendendo e ensinando o esporte. O menino que conheceu o futebol por meio de fitas alugadas na cidade natal, hoje é considerado um dos melhores técnicos do mundo. Uma espécie de precursor dos portugueses donos das pranchetas hoje em dia, como José Mourinho, Fernando Santos e Leonardo Jardim. E ele não aprendeu com qualquer um: foi auxiliar do escocês Sir Alex Ferguson no Manchester United. “Foi a relação de trabalho mais longa que tive, que acabou por passar para fora do campo, para a amizade”, lembra. Fã do futebol brasileiro e do trabalho de Tite desde quando ele dirigia o Corinthians, Carlos Queiroz tem um desafio e tanto agora no comando do Irã. Para começo de conversa, conseguiu classificar o time para a Copa do Mundo da Rússia, no ano que vem.
Nesta quinta-feira, enfrenta a Coreia do Sul, em Seul, apenas para cumprir tabela nas Eliminatórias da Ásia e defender a incrível marca de não ter sofrido gol na fase decisiva da seletiva continental. No bate-papo a seguir, Carlos Queiroz lembra o tempo em que comandou os galáticos do Real Madrid, Portugal e recorda até um título que ganhou em casa diante do Brasil — o Mundial Sub-20 de 1991. Ele também justifica o Brasil como destino preferido nas férias e admite o arrependimento de ter desperdiçado a oportunidade de ter sido o sucessor de Alex Ferguson no Manchester United. “Reconheço que pode ter sido um erro”. Com vocês, Carlos Queiroz…
» ESCOLA PORTUGUESA
Os técnicos portugueses vivem um momento excelente. Você acaba de classificar o Irã pela segunda vez consecutiva para a Copa do Mundo. Fernando Santos é campeão da Eurocopa. Leonardo Jardim conquistou o Campeonato Francês. José Mourinho ganhou a Europa League. André Villas Boas é vice-líder do Campeonato Chinês depois de ser campeão português, russo e da Europa League. O que explica esse momento?
Acredito que é a conjugação de dois fatores: a oportunidade cruzada com a competência. A oportunidade resulta do sucesso e do êxito das equipes e dos jogadores portugueses no futebol internacional. Com essa imagem de marca, constrói-se a oportunidade, a atração pelos treinadores que são base desse sucesso. Depois a competência: o treinador português tem uma formação técnica e profissional muito rigorosa, tem uma abordagem intelectual do jogo que é muito habilidosa e flexível. Temos treinadores com muita capacidade. Somos um país pequeno em número de população e de jogadores, mas temos uma habilidade nata para nos adaptarmos em diferentes contextos.
Quem é o melhor técnico português?
Sabia que há cerca de 200 treinadores portugueses trabalhando fora do país? A análise do melhor treinador depende dos critérios. Geralmente essa resposta baseia-se na superficialidade e no imediatismo dos resultados. Com base nesse critério, eu prefiro deixar a resposta aos jornalistas e torcedores. Para mim, existem outros critérios, como, por exemplo, a capacidade de saber ensinar o jogo ou, se quisermos ser mais exigentes, de conseguir fazer evoluir o jogo e transformar o futebol, garantindo o futuro e o progresso.
“Temos treinadores com muita capacidade. Somos um país pequeno em número de população e de jogadores, mas temos uma habilidade nata para nos adaptarmos em diferentes contextos”
Você classificou a África do Sul para a Copa de 2002, Portugal para a Copa de 2010, e o Irã duas vezes para as Copas de 2014 e 2018. Qual é o segredo do sucesso?
A minha grande preocupação foi sempre dedicar-me, de forma muito persistente, aos parâmetros de qualidade em que acredito, tendo sempre uma visão pragmática e realista que, creio, tem ajudado a adaptar-me às diferentes realidades e desafios. Falo da capacidade de ter um caminho próprio, sem imitar modelos que podiam não ser adaptáveis às realidades que encontrei. Ao mesmo tempo, acredito que é muito importante estimular nos jogadores a grande responsabilidade e desafio, não só de competir, mas de saber competir. Acima de tudo isso, claro, importa ter a felicidade de encontrar talentos com capacidade para responder aos desafios.
Há alguma influência brasileira em seu trabalho? Na Copa de 2014, o Irã trabalhou no Corinthians…
O futebol brasileiro está no DNA dos treinadores portugueses. Mais. Eu venho de Moçambique, tenho uma influência africana muito marcada, e a escola africana também tem muito de Brasil. Na África, quem não sabe fazer uma finta não é jogador. Isso está muito próximo do futebol brasileiro. Temos raízes comuns, evoluímos muito dentro daquilo que é esse futebol técnico, ao qual acrescentamos organização e uma dimensão de trabalho muito profissional. No caso específico do Corinthians, há esse fato de termos trabalhado lá com o Irã em 2014, na Copa do Mundo. Aproveito, aliás, para mais uma vez agradecer ao Tite e a todo estafe, pelo carinho e disponibilidade. Costumo dizer que há essa “Corinthians Conection”. Depois de passarmos por aí, o Brasil do Tite, e o Irã do Carlos Queiroz, são as primeiras seleções qualificadas para a Rússia (Copa de 2018). Estivemos numa grande casa, como é a do Corinthians, e ficou essa ligação.
» SELEÇÃO DO IRÃ
Você é o técnico do Irã desde 2011. O que o motivou a aceitar esse desafio?
Foi essencialmente o desafio de trabalhar com uma seleção com enorme potencial; numa altura em que estava de saída da seleção portuguesa. Eu tinha algumas possibilidades, mas os responsáveis pela Federação Iraniana de Futebol quiseram muito que eu fosse para lá. Havia a oportunidade de relançar o potencial e a qualidade do futebol iraniano, apontando também à presença na Copa do Mundo, o que, para mim, com todo o respeito pelas outras competições, é o palco mais importante em que um profissional de futebol pode estar. No Irã, acabamos por cumprir objetivos, fizemos duas classificações, e hoje guardo com muito orgulho esse registo de ser o único treinador em atividade a alcançar quatro classificações para Copas do Mundo.
Houve um tempo em que o Irã tinha vários jogadores no futebol alemão. Zandi, Ali Karimi, Hashemian, Navidkia, Ali Daei… Por que diminuiu o número de iranianos na Europa?
A partir dessa geração de Ali Daei surgiu um vazio, um apagão nas ligas europeias. O futebol do Irã estagnou, regrediu, deixando de ter jogadores bem preparados para criar impacto. Quando cheguei em 2011, havia um jogador na Europa, no Osasuna. Hoje, na base da equipe nacional, que é de 24 jogadores, cerca de 60% estão na Europa. Estamos recuperando isso.
O Irã foi eliminado na fase de grupos da Copa de 2014. É possível ir além em 2018?
Acreditamos muito que sim. A nossa ambição é a as oitavas de final. Mas essa classificação depende fundamentalmente da nossa preparação. Se for competente e ambiciosa, estaremos melhor. Tenho dito com frequência: se o Irã quer fazer diferente, então tem que ser diferente na preparação. Temos o nosso Plano de Preparação definido e esperamos ter os apoios para poder implementá-lo. Depois, na Copa do Mundo, esperamos também ter um pouco de sorte no sorteio da fase de grupos…
“Hoje, guardo com muito orgulho esse registo de ser o único treinador em atividade a alcançar quatro classificações para Copas do Mundo”
Você usa três sistemas táticos no Irã: 4-2-3-1, 4-4- 2 e 4-3- 3. Os jogadores iranianos se adaptaram com facilidade às diferentes configurações táticas?
Sim. Tudo isso é um processo de aprendizagem. No princípio, não era possível tomar decisões complexas na abordagem da estrutura da equipe. Começamos com estruturação em 4-3-3, e, ano após ano, graças ao efeito dos treinos e de toda a preparação, a equipe conquistou outras competências, sem se perturbar e desequilibrar. Hoje, no mesmo jogo, está em condições de fazer abordagens distintas. Ao mesmo tempo, também vamos lançando e tendo cada vez mais jogadores para isso, jogadores com capacidade de adaptação a essas mudanças.
O que o motivou a ser técnico do Irã?
A confiança em mim. Estava ali um grande desafio que, ao mesmo tempo, era a oportunidade de deixar uma marca, um legado.
» POLÍTICA IRANIANA
Qual é a sua opinião sobre o governo de Mahmud Ahmadineyad e de Hosan Rouhani?
Naturalmente tenho as minhas opiniões, mas até como cidadão estrangeiro, e como treinador, creio não ser da minha responsabilidade emitir grandes opiniões políticas, seja em que sentido for. O Irã é um país fantástico, com uma história e uma cultura incríveis, que vale mesmo a pena conhecer.
De que forma o Estado investe no esporte no Irã?
Estamos falando de um país em que o investimento no esporte depende essencialmente do estado, seja no futebol ou em outras modalidades. Os recursos, naturalmente, são muito limitados em consequência do que tem sido a história recente, nomeadamente as sanções internacionais.
“Treinamos em um terrão, num campo com 60 metros. Nem sempre temos os recursos necessários, mas a classificação para a Copa do Mundo ajudou a avançar em alguns projetos, como um centro de treinamento. Creio que vamos deixar melhores condições para o futuro do futebol no Irã”
O Irã oferece equipamentos adequados, estrutura para treinar?
Infelizmente, as condições estruturais são limitadas. Primeiro porque o futebol sofreu a estagnação de que falamos, depois porque essa fase de sanções tem reflexo em toda a sociedade. E o futebol não escapa. Treinamos em um terrão, num campo com 60 metros. Nem sempre temos os recursos necessários, mas a classificação para a Copa do Mundo ajudou a avançar em alguns projetos que desenvolvemos, como um centro de treinamento. Nem tudo estará pronto de imediato, mas creio que vamos ajudar a deixar melhores condições para o futuro do futebol no Irã.
Você trabalhou nos Emirados Árabes Unidos e no Irã. Há preconceito ao mundo islâmico?
O preconceito existe, e no sentido inverso também. Mais preocupante do que um certo nível de preconceito, é a falta de tolerância, são os fundamentalismos, as posturas de isolamento, os comportamentos radicalizados pela ignorância e a falta de cultura. E isso também existe nas várias sociedades. Quando um indivíduo, como eu, tem oportunidade de conhecer por dentro essas sociedades, nascem sempre novos olhares, e uma nova esperança de que o mundo não é um lugar assim tão mau como algumas pessoas pensam.
» DE MOÇAMBIQUE A PORTUGAL
Você nasceu em Nampula, Moçambique. Como começou a gostar de futebol?
Foi genético! Filho de jogador e treinador dificilmente podia resultar coisa melhor. Além disso, na África, no ambiente onde nasci, havia só um par de coisas para fazer: futebol e futebol. A combinação, a genética e este ambiente levou-me a essa vida.
Como fazia para assistir futebol em Nampula?
Líamos revistas que recebíamos de Portugal e da Inglaterra, porque o meu pai conseguia assinar algumas. Nas últimas páginas, algumas revistas tinham índice de filmes disponíveis para alugar. Lembro-me de ver o Aston Villa x Arsenal, na final da Copa da Inglaterra. Os jogos de Portugal na Copa do Mundo de 1966. Alugávamos o filme e víamos 10 vezes. Decorávamos cada lance. Depois, começaram a ter mais filmes. Houve jogos que decorei minuto a minuto. Jogos desse grande Mundial de 1970. O 7 x 2 à Suécia. Os títulos europeus do Benfica na Liga dos Campeões. Não eram jogos, eram peças de arte disponíveis para alugar. Imagina o que é estar vendo um jogo e a fita partir num lance decisivo? E depois colar a fita? Toda a gente tinha receio de que se perdesse um momento decisivo do jogo!
A inspiração para ser goleiro veio das fitas de vídeo?
Eu não decidi. Tirando quando era obrigado, jogava no ataque. Eu tinha opinião de que podia jogar no ataque, mas os treinadores achavam que eu tinha jeito para goleiro. Na segunda temporada de júnior, havia um treinador chamado Timóteo. Falei com ele e disse: “Ajude-me lá que eu não quero mais ser goleiro; agora quero é ser zagueiro central”. Às vezes, eu ia lá na frente e fazia uns gols de cabeça. Então, insisti com o Timóteo. “Ou jogo na defesa ou vou embora”. Sabe o que disse o Timóteo? “Então pode ir. Se não é goleiro, não joga em posição nenhuma!” A verdade é que eu não tinha a mesma habilidade para competir com os outros jogadores da frente. Tentei no ataque, tentei como defesa, fui recuando, até que um dia vi a linha de gol e pensei: “é melhor ficar por aqui ou estou fora”.
“Alugávamos o filme em Nampula) e víamos 10 vezes. Houve jogos que decorei minuto a minuto. Não eram jogos, eram peças de arte disponíveis para alugar. Imagina o que é estar vendo um jogo e a fita partir num lance decisivo? E depois colar a fita? Todos tinham receio de que se perdesse um momento decisivo do jogo”
Como foi a sua relação com o Ferroviário de Nampula?
Marcou a nossa vida, tinha sido também o clube do meu pai. Era o clube mais forte e estruturado, recebia os apoios, tinha campos, ginásios, piscinas. Se é que fui jogador, foi ali no Ferroviário.
Pensa em ser técnico de Moçambique?
Não estou num momento da carreira em que possa imaginar muita coisa. Mas isso não quer dizer que não possa ajudar o futebol em Moçambique, como, aliás, sempre procurei fazer. Como técnico ou não, creio não ser relevante discutir. Primeiro tenho que equacionar o que vou fazer depois da Copa da Rússia, vou pensar em ser mais técnico de seleção, na família…
» SELEÇÃO PORTUGUESA
Quem o levou para Portugal?
Tive uma fase na adolescência em que fui estudar em Portugal e fiquei com os meus avós, perto de Lisboa. Regressei e depois da Independência de Moçambique, fui de vez para Portugal, onde continuei a estudar e acabei por seguir ligado ao futebol.
Você levou Portugal ao título do Mundial Sub-20 em 1989 e em 1991, quando derrotou o Brasil na final. Quais são as suas recordações da decisão contra o Brasil?
Foi um momento muito especial, ainda mais que, em 1989, foi em casa, em Portugal. Foi também muito saboroso por ser contra o Brasil na final (em 1989 havíamos eliminado o Brasil nas semifinais). A vitória de 1991 marca a afirmação de um projeto. Se 1989 caiu para muitos como obra do acaso, em 1991, mostramos que o acaso afinal era uma obra. Foi um privilégio para mim, uns anos mais tarde, treinar um jogador daquela seleção (brasileira), o Roberto Carlos. Falar de 1991 era sempre um momento de humor com ele, como, aliás, é característico do Roberto. Muitas vezes nos divertimos com as memórias desse jogo.
Você foi sucessor de Luiz Felipe Scolari. O que Felipão deixou de legado em Portugal?
Foi o legado da confiança no sucesso e no êxito da equipe e dos jogadores portugueses. Ele cimentou a afirmação de qualidade que permitiu ao futebol português, ou à seleção, ganhar prestígio e reputação internacional, e mais confiança e credibilidade. Scolari teve uma passagem brilhante.
“Esse é o momento mais exuberante do futebol português. Esse momento não é um acaso, é o resultado de um percurso, do crescimento, da consistência e afirmação do que a seleção portuguesa tem vindo a fazer nos últimos 25 anos. Agora, é cereja no topo do bolo”
Eusébio, Figo ou Cristiano Ronaldo?
Eusébio. Se compararmos a importância, a qualidade individual de cada um deles por si só, seria difícil tomar uma decisão. Mas se associarmos a importância a um contexto, de formação, de competição, em que evoluíram, diria que Eusébio atingiu o seu nível num contexto muito mais adverso. O Eusébio atingiu um patamar inimaginável para os mais otimistas, em um Portugal pequeno e sem dimensão. Quem olhar aquele jogador e o projetar nos nossos tempos, e perceber e sentir adversidade, as condições difíceis em que evoluiu, o fato de ter estado à altura de Pele e Di Stéfano, diz tudo da sua importância e qualidade. Comparar é sempre subjetividade e sentimento; mas no contexto em que evoluíram, parece-me mais justo considerá-lo o melhor de todos os tempos. Creio que é justo e creio que é um tributo merecido. Não é por acaso que todos sempre lhe chamavam o King. Todos.
Portugal disputou oito competições com Cristiano Ronaldo e chegou a cinco semifinais. É o melhor momento da história da seleção portuguesa?
Aqui, os resultados sobrepõem-se à subjetividade. Esse é o momento mais exuberante do futebol português. Esse momento não é um acaso, é o resultado de um percurso, do crescimento, da consistência e afirmação do que a seleção portuguesa tem vindo a fazer nos últimos 25 anos. Agora, é cereja no topo do bolo.
» GOLEADA NO GAMA E COPA 2010
Em 2008, Portugal perdeu por 6 x 2 para o Brasil aqui em Brasília. Até que ponto aquele resultado prejudicou o seu trabalho?
Foi o contrário. Ninguém gosta de ter o nome vinculado a uma goleada dessa, mas foi o jogo mais importante nesse trajeto, até a eliminação contra a Espanha na Copa do Mundo. Temos jogos que ganhamos e parecem muito bons, dos quais não aprendemos nada; e outros que custam caro, nos quais aprendemos tudo, para em seguida vir o sucesso. Depois daquele jogo, foram tomadas muitas decisões que nos levaram ao caminho da classificação (para a Copa de 2010). Depois daquele jogo, lembro-me de um dia encontrar o ex-capitão do Porto João Pinto, em Portugal. Ele disse: “Carlos, agora é que tenho certeza de que você vai classificar Portugal”. Como se disse na época, quando se salta para a selva de helicóptero temos que ter a certeza do que contamos. Esse jogo desfez muitas dúvidas, foi ajuda preciosa, e daí até a Copa do Mundo, creio que fizemos 20 jogos e tivemos apenas uma derrota: precisamente contra a Espanha nas oitavas de final. Por sinal, sofremos um gol em impedimento.
Você comandou Portugal na Copa de 2010. Por que foi eliminado tão cedo?
Ficaram duas leituras, a do copo meio cheio e a do copo meio vazio. Apareceu diante de nós o campeão do mundo, que eliminou sucessivamente vários adversários. O primeiro foi Portugal. Poderia ser a final se a nossa posição fosse a da Holanda.
“Aquele (Brasil 6 x 2 Portugal, no Gama) foi o jogo mais importante até a eliminação contra a Espanha na Copa de 2010. Depois daquele jogo, foram tomadas decisões que nos levaram ao caminho da classificação. Fizemos 20 jogos e tivemos apenas uma derrota: precisamente contra a Espanha nas oitavas de final. Por sinal, sofremos um gol em impedimento”
As rebeliões de Deco e Cristiano Ronaldo prejudicaram o seu trabalho na Copa de 2010?
Não reconheço rebeliões nessa competição. Se você se refere a um ou outro comentário após o jogo com a Espanha, também não, porque o Mundial havia acabado… O que prejudicou o trabalho da seleção portuguesa foi o trabalho demonstrado dentro do campo pela seleção espanhola. E, se me permite de novo, um gol em impedimento definiu a vitória. Uma decisão errada que, aliás, foi denunciada publicamente denunciada pela crítica brasileira e argentina.
» ALEX FERGUSON
Você trabalhou por muito tempo com Sir Alex Ferguson. O que aprendeu com ele?
Muito. Foi a relação de trabalho mais longa que tive, que acabou por passar para fora do campo, para a amizade e campo pessoal. Não é por acaso que o Alex é reconhecido como o treinador com maior êxito no futebol. Houve muitos fatos, decisões, que se aprenderam num segundo e nem em 10 anos poderia aprender. Como líder de equipe, umas das virtudes mais importantes do Alex era a arte de delegar, era a confiança que depositava nas pessoas que escolhia e que liderava. O que não significa dizer que não exigisse grande responsabilidade. Pelo contrário.
No livro Liderança, Sir Alex Ferguson disse que você teve um papel fundamental na contratação de Cristiano Ronaldo pelo Manchester United…
As grandes decisões não são magia. Nem capricho. São decisões maturadas. O scouting do Manchester observava jogadores e tomava decisões; naquela altura existiam algumas dúvidas, aliás, no futebol português havia uma grande dúvida sobre quem contratar: Ronaldo ou Quaresma? E eu, que vinha de Portugal, disse: não há dúvidas, é simples, contratem os dois! Não havia dúvidas que eram os dois jogadores que teriam futuro e impacto no clube; precisávamos de opções para lançar no futuro, por exemplo, nos lugares de Giggs e Beckham. Depois formos obrigados a uma escolha e fizemos valer a prioridade Ronaldo, não por desvalorizar o Quaresma, mas porque o risco de se perder o Ronaldo era maior. Fizemos o tal jogo com o Sporting, de inauguração do novo estádio de Alvalade, e a contratação foi fechada.
“Reconheço que a saída do Manchester United possa ter sido um erro, mas ninguém adivinha o futuro e não me arrependo do rumo que a minha carreira seguiu. Foi uma grande decisão e a única possível. Quando o Real convida, primeiro você diz que sim, depois é que se pensa”
Você também indicou Anderson ao Manchester United…
Sim. Foi mais tarde. O Anderson (e também o Nani) chegaria também com objetivo de preparar o futuro. Rooney, Keane, Verón, Scholes, etc., estavam com idade avançada. Tínhamos necessidade de um meia criativo, com visão. O Anderson poderia ter tido grande futuro, mas depois sofreu com questões de idioma, de adaptação, afetivas. Aliás, tenho certeza de que, com a minha presença em Manchester, o Anderson teria tido muito mais apoio e quem sabe outro rendimento.
Alex Ferguson escreve no livro Liderança que, se você não tivesse deixado o Manchester para assumir Real Madrid e Portugal, teria sido o sucessor dele no United. Concorda?
Era o que estava definido e acordado. Era uma decisão estratégica que o Alex tinha desenhado para o futuro do clube, precavendo vários cenários. O destino não quis que fosse assim. Não me custa admitir que, tendo em consideração o que se passou após o Mundial 2010, nomeadamente alguns fatos que me foram criados pelas autoridades do governo português, em que houve uma acusação* torpe e infundamentada, como, aliás, ficou provado pelo Tribunal Europeu, nessa situação reconheço que a saída do Manchester United possa ter sido um erro, mas ninguém adivinha o futuro e não me arrependo do rumo que a minha carreira seguiu. Quando a política se mete no futebol, não podemos criticar o futebol… o futebol é uma coisa e a conduta de certas pessoas que se encostam ao futebol, é outra. (*Antes da Copa de 2010 n África do Sul, Carlos Queiroz foi acusado de atrapalhar o procedimento de médicos que tentavam realizar o controle antidoping em jogadores da seleção de Portugal. O técnico foi inocentado e absolvido pelo Tribunal Arbitral do Esportes (CAS). Houve provas de manobras de que o governo e a federação portuguesa teriam manobrado para arranjar um motivo para demiti-lo por justa causa).
“Se queres compreender o que é o Real Madrid e o Alex Ferguson, veja isto: quando lhe telefonei para anunciar a minha decisão de partir, Alex, hoje meu amigo, respondeu: “Fico muito triste com a tua decisão, mas ficaria mais desapontado se não tivesses aceitado o convite para treinar o Real Madrid. Por isso te desejo o melhor”
Foi um erro ou um acerto ser técnico do Real Madrid?
Foi uma grande decisão e a única possível. Quando o Real convida, primeiro você diz que sim, depois é que se pensa. Vou dizer algo do Real relacionado com o Ferguson. Chegou o convite e disse ao Ferguson o que estava acontecendo. Ele defendeu naturalmente os seus interesses, avisou-me e deu-me todos os alertas do que poderia vir a enfrentar, de bom e de ruim. Aí fiquei de lhe anunciar a decisão posteriormente. Se queres compreender o que é o Real e o Alex, veja isto: quando lhe telefonei para anunciar a minha decisão de partir, Alex, hoje meu amigo, respondeu: “Fico muito triste com a tua decisão, mas ficaria mais desapontado se não tivesses aceitado o convite para treinar o Real Madrid. Por isso te desejo o melhor”.
» FUTEBOL BRASILEIRO
Confirma ter recebido proposta do ex-presidente Roberto Dinamite para assumir o Vasco em 2011?
O Vasco, colocado por mim a par da situação, de que tinha sido movida contra mim a tal acusação (de dificultar o exame antidoping na seleção portuguesa antes da Copa de 2010), da qual eu estava inocente, estava me defendendo, mas havia risco de ter alguma suspensão, teve que desistir da ideia. O cenário da suspensão poderia causar embaraço ao clube.
Você ainda pretende trabalhar no Brasil?
Sabe, houve um jogador português que jogou e foi campeão no Brasil, o Fernando Peres, que eu muito admirava. Era um grande jogador do Sporting, que jogava numa seleção portuguesa cheia de jogadores do Benfica. O fato de ele ter ido para o Brasil, para a pátria do futebol, criou um grande fascínio para mim. Quando comecei a minha carreira, sempre disse: não posso terminar a minha carreira sem treinar no Brasil.
Por que Paulo Bento não deu certo no Cruzeiro?
Importa perceber por que razão os treinadores brasileiros também têm muitas dificuldades em ter sucesso… O problema não é exclusivo do Brasil, mas esse é um dos países do mundo em que eventualmente há maior rotação de treinadores por temporada e por clube… É natural pensar que o problema pode não estar só nos treinadores. Os dirigentes em geral encontram sempre uma forma prática de diminuir tensões, ganhando tempo até que o sucesso chegue pelo acaso ou pela coincidência.
“Quando comecei a minha carreira, sempre disse: não posso terminar a minha carreira sem treinar no Brasil”
Torce para qual time no Brasil?
Todos acham que os portugueses seguem o Vasco. Claro, tenho simpatia, mas tive o privilégio de ver jogo do Zico pelo Flamengo, no Maracanã, e também sou Flamengo. Depois, em 2014, com todo aquele apoio e ajuda no Corinthians, fiquei fã do Corinthians também. Quando eles se enfrentarem, espero que empatem.
Você tinha uma amizade muito forte com Carlos Alberto Torres…
Houve dois mundiais da minha infância que me marcaram muito. 1966, pela campanha de Portugal. E a Copa de 70! O Carlos Alberto era o senhor. Uns jogavam a bola, os outros eram os senhores. Uns anos mais tarde, estou no Japão e o Alexandre (Torres, filho de Carlos Alberto) é meu jogador. Por causa do Alexandre, tive que comunicar com o pai. É fantástico que aquele senhor tenha tido sempre a isenção de falar sempre em patamares diferentes, o que causou profunda admiração por ele: era capaz de falar como pai; e quando falava como homem do jogo não se confundia; apesar de falar do filho, nunca teve outra coisa que não fosse grande isenção na análise técnica. Isso me marcou. Desenvolvi ainda maior respeito. Depois tive a oportunidade de conhecê-lo melhor. Tinha uma auréola que só as pessoas especiais têm. Um grande senhor.
Como avalia o trabalho de Tite na Seleção Brasileira?
Tite é um grande treinador. Competente, simples, inteligente, culto. Não é o estilo popular, e às vezes, no futebol, esse não é o melhor cartão de visita para entrada, mas é sempre o melhor cartão de saída. Quem via o Corinthians jogar, como eu vi, percebia que aquilo só podia vir de mão competente. A diferença na Seleção Brasileira, creio, é do dia para a noite. Há um antes e um depois de Tite. Não tinha dúvida de que faria um grande trabalho, mas o que impressiona é a forma tão rápida como impôs a sua marca. Creio que vamos assistir ao reconhecimento unânime da sua qualidade e capacidade, até em nível internacional.
“Tite é um grande treinador. Competente, simples, inteligente, culto. Não é o estilo popular, e às vezes, no futebol, esse não é o melhor cartão de visita para entrada, mas é sempre o melhor cartão de saída”
Cristiano Ronaldo, Messi ou Neymar?
Por que escolher? Não cabem os três na mesma equipe? Por favor, não me obrigue a uma escolha. Vamos escolher antes os outros atrás deles, só para concluir um onze e confirmar que ganhamos os jogos.
Por que o Brasil é o seu destino preferido nas férias?
São três as razões: praia, samba e futebol. Mas, falando sério, é um país fantástico, de gente muito especial, que tem uma dimensão muito mais elevada do que por vezes se lhe reconhece. O provo brasileiro é por vezes vítima de uma imagem menos positiva, por causa da instabilidade social e da segurança, que não é o retrato de um povo trabalhador, alegre, aberto, sofredor, comunicativo e competente. Quem, como eu, tem o privilegio de conhecer esse Brasil do povo, das pessoas, que riem e choram e levam os filhos à escola, só posso falar bem. Sinto-me bem, tenho imensos amigos, sou bem tratado e gosto.
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