Depois das manifestações

Publicado em Análise da semana

Tá bom. Você foi pra a rua, as manifestações foram expressivas, está tudo resolvido, Dilma sai em junho. Não. Nada é tão simples assim, nem se pode tratar qualquer coisa nesse momento como fato consumado. Porém, é notório que o impeachment bate à porta da presidente com maiores chances de ser aprovado do que no ano passado e as margens de manobras do governo são cada vez menores. Mas não dá para cravar que isso ocorrerá, uma vez que o imponderável Lava jato continua dando as cartas e agitando a política. Vejamos alguns fatores:

PMDB _ O partido vai tentando se mostrar uma opção de poder. A decisão da convenção, de impedir seus filiados de assumirem cargos no governo, tem endereço certo: o deputado Mauro Lopes, do PMDB de Minas Gerais. Que esta terça-feira seria nomeado ministro. A bancada de Minas Gerais é importante demais para deixar que seja cooptada pelo governo nesse momento. Michel Temer e Eliseu Padilha, o ex-ministro da Aviação Civil que Lopes iria assumir, decidiram apoiar essa moção contra as indicações porque foram pressionados pelo grupo contrário ao governo, o que mais apoia Michel hoje. Além do mais, se, em 30 dias, o partido vai definir seu destino, não dá para ficar nomeando ministro.

Nos bastidores do próprio PMDB, entretanto, há quem diga que essa pressa para se afastar do governo e abraçar a tese do impeachment tem um outro objetivo velado: entregar a cabeça de Dilma para ver se, em meio à confusão na sala principal da política, os peemedebistas enroscados na Lava Jato terminem esquecidos. Ocorre que as mesmas ruas que pedem o afastamento da presidente Dilma também citam Eduardo Cunha e Renan Calheiros. No geral, os peemedebistas sabem que Dilma não etá sendo investigada na operação e que esses dois peemedebistas estão. Portanto, ainda não se sabe se o PMDB terá esse fôlego todo para conduzir o país, apesar do equilíbrio de Michel Temer.

TSE _ A maioria dos oposicionistas deseja mesmo é uma nova eleição. Esse tema está a cargo do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que analisa a legalidade das campanhas. O processo no Tribunal é lento. Seus ministros, para julgar, precisarão ter acesso às delações da Lava Jato que falam em caixa dois na campanha de 2014. Se isso ficar realmente comprovado, adeus Dilma e… Temer.

O futuro julgamento do TSE é hoje mais um incentivo para que os peemedebistas tentem correr com o processo de impeachment de Dilma. O raciocínio de alguns é o seguinte: quem sabe se, com um fato consumado, Temer na Presidência, o TSE termine não cassando a chapa e deixe o vice governar em paz?

Lava Jato _ O maior vitorioso das passeatas de ontem foi mesmo o juiz Sérgio Moro. É nele que a população deposita suas esperanças. E, embora muitos não gostem, o Supremo Tribunal Federal hoje deseja muito mais se assemelhar a Moro do que a um Tribunal que deixa as coisas correrem frouxas. Melhor assim.

Moral da história:
Com tantos fatores ainda para acontecer e tantas perguntas ainda sem resposta fica difícil traçar um cenário preciso para o futuro, apesar das manifestações de ontem. O fato é que, dentro de alguns dias, a Câmara começará a analisar o processo de impeachment, que deve atrair mais a imprensa como um todo. Paralelamente, o Conselho de Ética segue suas apurações sobre Eduardo Cunha e o ministro Teori Zavaschi vai despachando os processos contra os parlamentares. E Sergio Moro detonando novas fases da Lava Jato. Tudo indica que antes do final de maio não teremos um desfecho da crise. É o Brasil vivendo a cada dia a sua aflição.