Em palestra na Feira do Livro de Brasília, Moacir Scliar disse que no Brasil só há uma unanimidade. É o livro. O país estava em campanha eleitoral. Candidatos de diferentes cores ideológicas e de variados níveis de escolaridade declaravam amor ao objeto que carrega nas páginas o saber e a memória da humanidade.
O escritor gaúcho deve estar se revirando no túmulo. A proposta de reforma tributária encaminhada pelo governo ao Congresso lhe contraria a afirmação. Ao unificar dois tributos federais – o PIS e a Cofins – acaba com um benefício que reduz o custo na produção de livros e, consequentemente, no preço pago pelo consumidor. A majoração será de 12%.
Editores e entidades ligadas ao mercado editorial lançaram o manifesto “Em defesa do livro”. Escolas, professores, estudantes, servidores governamentais, profissionais do setor privado, e público em geral manifestaram o desacordo na imprensa e nas mídias sociais. No Congresso também houve reações. O senador Flávio Arns reconhece que a nova tributação deve isentar o setor.
Questionado sobre a medida, o ministro Paulo Guedes disse que livro é objeto de consumo da elite. No Brasil, quem compra o produto é rico. E rico pode pagar. Nem notará a diferença. Para os pobres prometeu distribuição gratuita de títulos pelo governo. As palavras despertaram indignação e protestos.
Com razão. Ao restringir o mais importante produto cultural a poucos privilegiados, o ministro revela desconhecimento das urgências nacionais. Calcanhar de aquiles do país, a educação precisa de salto qualitativo. O Brasil, diferentemente de outras nações com o mesmo grau de desenvolvimento, democratizou o acesso à escola, não ao conhecimento.
Reduzir o atraso passa necessariamente pela leitura. O brasileiro lê pouco. Pesquisa do Instituto Pró-Livro apresenta números assustadores. Incluindo o livro didático, a média é de 2,43 livros por ano. Excluído o didático, cai para um. (O francês lê 21). A terça parte da população nunca comprou um livro. Analfabetismo, desigualdade social, falta de estrutura educacional e familiar são fatores que impedem avanços.
O desafio é, pois, ler mais. Ler mais pressupõe mais contato com as obras. Impõe-se possibilitar à criança o direito de escolher. Daí por que secretarias de Educação dão aos estudantes vale-livro para eles irem às bienais ou às feiras literárias e exercitem a liberdade: olhem capas, folheiem, admirem as ilustrações, leiam uma página aqui, outra ali – até encontrar o livro que lhes desperte o interesse. É assim que nasce o leitor. Nas palavras de Jorge Amado, “um livro leva a outro”. Fechar essa porta é tiro no pé.
(Editorial do Correio Braziliense de hoje)