Você gosta de ouvir um redondo não? Ninguém gosta. Mãe, pai, marido, mulher, namorado, ficante, chefe, subordinado, todos perdem o humor diante das três letrinhas. Nem os bebês ficam imunes. Dizem que a criança que escuta muitos nãos nos primeiros meses de vida grava a negação na mente. Aí, Deus a acuda. Candidata-se ao título de adulto infeliz. Para alegria do psicólogo, claro. O leitor e o ouvinte também têm horror a esse advérbio. Fazem tudo para ignorá-lo. Muitas vezes, passam batido por ele. Aí, ops! Entendem o recado pelo avesso. Para evitar traumas e distorções, há saídas. A melhor: fugir do não. Use uma linguagem positiva. Diga o que é, nunca o que não é. Não chegar na hora é chegar atrasado. Não ser necessário é ser dispensável. Não vir à aula é faltar à aula. Não acreditar é duvidar. Não saber é ignorar. Não lembrar é esquecer. Não alterar é manter. A aversão ao não cresce dia a dia. Ultrapassou a fronteira humana e chegou à linguística. Mais precisamente: atingiu o hífen. Ao tomar conhecimento de que haveria mudanças na grafia das palavras, o tracinho se ajoelhou diante dos acadêmicos. “Por favor”, suplicou ele, “afasta de mim esse cálice.” Comovidos diante de tanto sofrimento, Suas Excelências disseram sim. O acordo ortográfico cassou o hífen diante do não. Adeus, indesejado das gentes e das palavras. Doravante, sem elo, é um lá e outro cá. Assim: não agressão, não alinhamento, não conformismo, não fumante, não intervenção, não participação, não alinhado, não beligerante, não combatente, não conformista, não engajado, não intervencionista, não ferroso, não verbal, não viciado. Ufa!