Morar um no outro

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O que aférese tem a ver com namorar? Aparentemente nada. O palavrão é tão sofisticado diante de sentimento tão espontâneo… Mas as aparências enganam. A greguinha exerce senhor papel na caminhada rumo ao coração do outro. Ela diminui distâncias. Trata-se de manha comum na língua. O falante, por comodismo, ignorância ou pressa, passa a tesoura em fonemas do início de palavras. Namorar era enamorar — estar em amor O e caiu fora. Sem ele, dois extremos se ligam em menos tempo. Daí a a graça de Mário Quintana. “O amor”, escreveu o poeta, “é quando a gente mora um no outro.”   Além de Cupido

A aférese não atinge só os eleitos de Cupido. A língua tem montões de exemplos de supressão de fonemas do início das palavras. O povo, sabido que só, lança mão do recurso sem nunca ter estudado grego, linguística ou figuras de linguagem. Na fala informal, professor vira fessor; você, cê; estava, tava; espera, pera. É tudo aférese.