Dizer coisa com coisa

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“Socooooooooooooooooooooooooorro!”, gritam os concurseiros de Europa, França e Bahia. O motivo: perdem pontos a rodo num tal item chamado coesão. Eles procuram o assunto nas gramáticas. Não encontram. Celsos Cunhas, Becharas, Cegalas não dedicam nenhum capítulo ao tema. Por quê?

A razão é simples. Coesão está presente na morfologia, na sintaxe, nas figuras de linguagem. Ao estudar substantivos, verbos, pronomes, conjunções, preposições, coordenação, subordinação, etc. e tal, indiretamente estudamos coesão. Eles oferecem recursos pra ligar palavras, ligar períodos, ligar parágrafos. Em suma: juntar partes soltas em unidades coerentes.

Anel e ouro são duas palavras que não se conhecem nem de elevador. Mas formam uma unidade com a ajuda da preposição de: anel de ouro.

Cozinho estamos sem empregada.

Que relação existe entre enunciados assim independentes? A conjunção se encarrega de pôr os pontos nos ii. Ela pode indicar causa (cozinho porque estamos sem empregada). Pode indicar tempo (cozinho quando estamos sem empregada). Pode indicar duração (cozinho enquanto estamos sem empregada). Pode indicar condição (cozinho se estamos sem empregada).

Pronomes exercem duplo papel. Além de auxiliar a coesão, contribuem para a elegância. Como? Evitam repetição. Veja: Rafael e João Marcelo são irmãos. Este estuda medicina; aquele, direito. (Este substitui João Marcelo; aquele, Rafael.)

Oscar Niemeyer se casou aos 99 anos. Ele e a noiva se conheceram anos antes.

Por falar em repetição…

A repetição estilística dá charme e liga ao texto. É o caso do “pode indicar” reiterado acima. É o caso, também, deste texto de Barack Obama:

Sim, nós podemos. Nós podemos recuperar a economia do país. Nós podemos legar uma pátria melhor pra nossos filhos e netos. Nós podemos respeitar os direitos humanos. Nós podemos zelar pelo meio ambiente. Nós podemos construir um mundo mais justo e democrático. Sim, nós podemos.

Em parágrafo   3. de pronomes que retomam nomes ou passagens citados: JK construiu Brasília. JK nasceu em Minas. JK, que construiu Brasília, nasceu em Minas.   Obama e Michelle compareceram a 10 bailes no dia da posse. Os americanos os acompanharam pela tevê. 4. de sinônimos: Há quem diga que Lula e Obama se parecem. Os dois presidentes têm talento especial pra falar ao coração do povo. 5. Referência catafórica: Fernando Pessoa escreveu este verso: Tudo vale a pena se a alma não é pequena. : Cozinho por. , clamam os conurseiros. Imagine a situação. Com carta branca, Alex Serguson forma o time de futebol com os melhores jogadores do mundo. Todos do nível Cristiano Ronaldo, Kaká, Messi, Gerrad. Confiante no talento individual, o técnico põe a equipe em campo antes de definir a posição e movimentação de cada um pra atingir o objetivo. Qual? O gol, claro. Sem plano que os orientasse, os jogadores não se entendiam. Corriam sem rumo, chutavam a esmo, estranhavam a bola. Eram 11 Pelés transformados em 11 patetas. O resultado? Fiasco nota 10. (Qualquer semelhança com a Seleção Brasileira de 2006 não é mera coincidência.) A imagem vale para a redação. Belas ideias, belas palavras e belas frases não resultam necessariamente num bom texto. Pra chegar à unidade de composição, elas precisam se articular, se entrosar com clareza, harmonia e coerência. Em bom português: as palavras têm de conversar pra formar períodos. Os períodos têm de conversar pra formar parágrafos. Os parágrafos têm de conversar pra formar o texto. O bate-papo ajuizado da língua tem nome. Chama-se coesão textual. O entrelaçamento das idéias se dá por meio de vários mecanismos. Um deles é a manutenção do tema. Ou seja: perseguir o tema sem desvios. É a tal história: quem se ajoelha tem de rezar. Veja exemplo de parágrafo do livro Sonhos de Einsten, de Alan Lightma: Minúsculos sons da cidade flutuam pela sala. Uma garrafa de leite tilinta contra uma pedra. Um toldo é esticado em uma loja. Uma carroça de verduras transita lentamente por uma rua. Um homem e uma mulher sussurram em um apartamento próximo. Viu? O tópico frasal amarrou as idéias. Sem ele, os exemplos de sons da cidade ficariam soltos, sem nexo. O leitor não saberia aonde as frases querem chegar. Em suma: um amontoado de ideias e nenhum recado. Outro recurso: referência anafórica. Anáfora quer dizer repetição. Pode ser: 1. da mesma palavra: Tudo cura o tempo, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba. Irene preta / Irene boa / Irene sempre de bom humor. 3. de pronomes que retomam nomes ou passagens citados: Rafael e João Marcelo são irmãos. Este estuda medicina; aquele, direito. (este substitui João Marcelo; aquele, rafael.) JK construiu Brasília. JK nasceu em Minas. JK, que construiu Brasília, nasceu em Minas. Obama e Michelle compareceram a 10 bailes no dia da posse. Os americanos os acompanharam pela tevê. Oscar Niemeyer se casou aos 99 anos. Ele e a noiva se conheceram anos antes. 4. de sinônimos: Há quem diga que Lula e Obama se parecem. Os dois presidentes têm talento especial pra falar ao coração do povo. 5. Referência catafórica: Fernando Pessoa escreveu este verso: Tudo vale a pena se a alma não é pequena. 6. a mesma frase ou de palavras que remetam ao que foi dito. É o caso de pronomes pra obter a coesão textual é a referência anafórica. autor amarrou as idéias não fugir do tema. O parágrafo se dá por meio de mecanismos Soltos, os vocábulos ficam em situação dicionária. O pai-de-todos-nós tem 400 mil verbetes. Cada um fica na sua. Todos juntos, sem articulação, não compõem uma frase sequer. Eles precisam de organização pra dar o recado. conversar. m De nada adiantam Um corria prum lado, a bola estava no outrode jogo e sem definir o objetivo do gol. Resultado: sem conjugar as habilidades de cada um na posição e movimentação no campo sem conjugar as habilidades de cada um na posição e movimentação dentro do campo estratégia, Ronaldinho Coerência vem do latim. Cohaerens, na língua dos Césares, quer dizer o que está junto ou ligado. A palavra tem sinônimos. Trata-se da união das diversas partes de um corpo