Barrigadas e nado cachorrinho

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DAD SQUARISI // dadsquarisi.df@dabr.com.br

O pai considera o filho pra lá de talentoso. Amante da água, o garotão promete. Mergulha sem medo. Boia. Bate pernas e braços (meio descompassado) na tentativa de atravessar a piscina. A respiração ofegante não ajuda, mas ele alcança a borda. O paizão, orgulhoso, decide investir no rapazinho. Contrata um instrutor.

Três meses depois, arranja um tempinho pra assistir aos treinos. Ops! Esperava mergulhos de ponta, respiração cadenciada, movimento ritmado de cabeça, braços e pernas, luta contra o cronômetro. O que vê? Nada mais que o repeteco do desempenho anterior. Questionado, o técnico responde:

— Calma. Corrigir traumatiza. Temos de respeitar o ritmo dele. Um dia ele passa pra patamar superior.

Enquanto isso, os futuros campeões se exercitam. Investem horas diárias em musculações, braçadas e superação de dificuldades. Feriados e fins de semana não significam descanso, mas chance de avançar. Eles sabem que a medalha olímpica não cai do céu nem salta do inferno. É resultado da conjugação de três virtudes: empenho, empenho e empenho. Se sobrar um tempinho, mais empenho.

Na hora do pega pra capar, quem tem chance de se destacar? A escolha começa no clube. Os melhores receberão treinamento avançado. Primeiro no Brasil, depois no exterior. Cada vez mais competitivos, ganharão patrocínios e bons contratos. Disputarão torneios internacionais. Exibirão ouros no peito. E o garotão? Mudou de turma, mas continua nas barrigadas e no nado cachorrinho.

A analogia vale para o ensino da língua portuguesa. Livro didático que considera corretas construções como “os livro ilustrado mais interessante estão emprestado” e “nós pega o peixe” abre caminho pra lanterninhas. Os da rabeira são os expulsos das oportunidades. Sem compaixão ou paternalismos, as boas universidades lhes fecharão as portas. Os concursos públicos parecerão miragem. A disputa por direção ou assessoria em empresa privada tropeça nos campeões. “Quem nasce pra tostão não chega a milhão”, conformam-se eles. Ufa! Finalmente aprenderam a lição que a escola lhes ensinou.