E Se For Demência?

Publicado em Alzheimer

Cosette Castro

Brasília – O envelhecimento costuma escamotear os primeiros sinais de demência, síndrome neurodegenerativa progressiva e ainda sem cura. O preconceito e a falta de informações também.

O familiar pode estar esquecendo atividades básicas que dominava (datas, vestimenta, uso de senhas, do cartão). Ou mudando de comportamento. Mas, em geral, a primeira reação da família é colocar a responsabilidade na idade.

Além de ser um preconceito, também chamado de idadismo, etarismo, ageismo, ou velhofobia, faz com que os indícios de uma possível perda cognitiva ou de demência sejam minimizados e colocados de lado. Em muitos casos, parte da família se nega a aceitar que há algo errado.

Mesmo com sinais que deveriam acender uma luz de alerta. Entre eles, esquecimentos de situações recentes, objetos que são guardados em locais estranhos, mudanças repentinas de humor ou de comportamento.

Há sinais diferentes para cada caso. Isso ocorre porque há diferentes tipos de velhices e de histórias de vida. E diferentes tipos de demências. A mais conhecida é o Alzheimer.

O que pouca gente sabe é que existe, em 6% dos casos, a demência precoce, que atinge pessoas com 38, 40 anos. Ou seja, as demências não acontecem apenas depois dos 60 anos (Relatório Nacional de Demências 2024).

Há pessoas que, depois de desenvolverem algum tipo de demência, ficam mais ansiosas. Outras, mais agitadas e até violentas. Ou ainda podem ficar alheias ao que ocorre ao seu redor.

O familiar pode passar o dia perguntando ou comentando repetidamente sobre os mesmos temas, sem se dar conta que já falou sobre isso anteriormente. Algumas pessoas podem pensar que é só “chatice de gente velha”, que “não tem o que fazer”.  Às vezes, é mais do que solidão e falta de atenção.

No caso de familiares independentes, como profissionais que viajavam muito, é possível que comecem a arrumar a mala com uma semana de antecedência. Mas esqueçam itens básicos, como calcinhas, escova e pasta de dentes.

Pode ser que levem na viagem vestimentas inadequadas ao clima. Ou muitas blusas e nenhuma calça. Ou seja, há um comprometimento no planejamento que indica que o familiar precisa de ajuda. E muita atenção.

Há quem, ainda sem diagnóstico, se negue a levar o celular em uma viagem para “não ser controlada”. Ou desligue o telefone na viagem, causando preocupação à família e às pessoas que viajam juntas.

Há quem chegue ao aeroporto de madrugada para uma viagem na hora do almoço, com receio de perder o vôo. E há quem se esqueça da viagem. Esquecimentos podem levar a atos repetitivos como a compra de várias passagens aéreas sem utilizar.

Ou ir a consultas médicas e repetir os exames sem buscar resultado. Outra possibilidade é a pessoa fazer ultrassonografias e holters a cada dois meses. Por isso, é importante que nossos familiares tenham companhia na hora de ir a consultas e fazer exames.

Pacientes com demência ainda sem diagnóstico, ou em estágio inicial, muitas vezes desenvolvem estratégias para disfarçar suas fragilidades. Isso pode dificultar a percepção de que algo está errado.

Entre pacientes, principalmente aqueles com maior nível educacional, o que se tornou difícil de executar passa a ser contornado, considerado chato até ser deixado de lado. Exemplos: alimentação que passa a ser feita só fora de casa. Deixar de usar redes sociais porque não lembra mais como fazer. Ou abandonar um hobby.

Há quem se perca dirigindo. Há quem esqueça para onde estava indo ou como voltar.  Outros se perdem no trajeto do ônibus que fizeram a vida toda, principalmente no caso de pessoas idosas que moram no mesmo bairro.

Não é incomum se perder na rua ou até mesmo dentro de casa, sem reconhecer móveis ou objetos que, muitas vezes, elas e eles mesmos compraram.

Dirigir é uma atividade a ser observada. O carro é uma das primeiras restrições após as mudanças de comportamento, de linguagem, de memória ou do diagnóstico definitivo.

Para a segurança da pessoa com demência e da população em geral, é possível alegar que o carro está na oficina. Ou, como medida extrema, informar que foi roubado. Esconder as chaves deixando o carro à mostra é uma tática que, em geral, não funciona. E ainda pode causar ansiedade e agitação.

No mundo, a cada três segundos, uma pessoa é diagnosticada com Alzheimer ou outros tipos de demências. E a tendência do número de casos é aumentar. Ainda mais em países em desenvolvimento como o Brasil, com tanta desigualdade social. E diagnósticos que demoram cerca de 03 ou 04 anos na saúde pública e de 02 a 03 anos na saúde privada (IPE-DF, 2022).

Precisamos de muita informação e campanhas nacionais para as famílias acreditarem que, sim, pode ser perda cognitiva ou demência. E que pode acontecer antes dos 60 anos.

PS: Na semana passada um novo medicamento para o Alzheimer (a Kisunla /donanemab) foi aprovado pela Anvisa. O medicamento poderá ser utilizado por pessoas com perda cognitiva e estágio inicial de Alzheimer.

PS 1: Esse texto foi publicado no Blog em 2021, sendo assinado por Ana Castro e Cosette Castro e foi atualizado para esta edição.

 

 

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