As Primeiras Férias 

Publicado em Autocuidado

Ana Castro & Cosette Castro

 

Brasília – Hoje quem escreve é a Cosette, contando sobre as primeiras férias após o falecimento da sua mãe.

“Os primeiros dias das primeiras férias sem minha  mãe foram como andar  pela metade.

Não tinha como mostrar pra ela como estava me divertindo. Como o por-do-sol  é bonito. Ou como as pessoas estavam mais preocupadas em fotografar do que desfrutar do ambiente.

Dava vontade de pegar o celular e contar, mas não tinha como telefonar, mandar email ou mensagem pelo Whats App. Nem marcar o nome dela no Facebook.

Mesmo que minha mãe ainda estivesse viva, ela  não entenderia nada disso. Nem de tecnologia, nem de celular,  nem de aplicativos, nem de teclados e muito menos dos conteúdos.

Minha mãe foi aos poucos, por isso o luto é um luto de vários anos. É dor acumulada. E foi sendo abafada porque era preciso cuidar.

Também estou em luto coletivo pelos conhecidos, colegas e vizinhos que não sobreviveram ao Covid-19. E respeito a longa lista dos anônimos que já se foram.

Se passaram sete meses e  somente agora sinto que estou saindo da anestesia.  Ainda assim, em alguns momentos, ela seria a  pessoa ideal  pra contar pequenos detalhes, pra fazer algumas  observações enquanto vejo as pessoas passarem. Passearem.

Ela seria uma das pessoas para  quem ligaria pra fazer brincadeiras e gozação. Ou para compartilhar pequenas lembranças, de algo que passamos juntas, ou não.

Enquanto tiro férias depois de três anos e meio e visito o mar depois de quatro anos e meio, me pego pensando como foi possível passar tanto tempo longe.

Tanto tempo sem sentir o pé enterrando na areia, o vento  marinho batendo na cara e enredando os cabelos. A descontração de não precisar pentear. O cheiro de maresia. O sal do mar limpando as narinas.

A descontração cedeu lugar à rotina e ao cuidado.  O material de higiene, a alimentação, as dietas de tubo. A esperança que voltasse a comer. O preço das fraldas, os remédios, que não paravam de aumentar. O dinheiro  curto. O estado de alerta constante.

Antes, durante quase 10 anos, eu respirava cuidado.  Agora, depois de sete meses,  estou respirando mar. Um pouco de chuva, muita umidade. Dias bonitos.

Estou reaprendendo a andar sozinha, enquanto dou espaço pro luto, essa tristeza profunda  que, vira e mexe,  ainda me leva a chorar.

 Não foi por acaso que machuquei o pé poucos dias antes de viajar. Concretizei no corpo o que sentia dentro: capenga, sentindo que faltava algo/alguém.

As vezes para recomeçar, é  preciso chorar. E comer. Dormir. Ler. Caminhar, se possível no mar. Coisas simples.

Enquanto os dias de mar passam, leio o último livro do clube do livro TAG : “Os Cem Anos de Lenni e Margot”.

A obra,  da escritora inglesa Marianne Cronin, conta histórias de amor, vida, perdas. E me ajuda nestes dias  de mar, de  despedidas, individual e coletiva e de recuperação. Nada é por acaso”.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*