Pandemia e Sofrimento Mental

Publicado em sofrimento mental

Ana Castro & Cosette Castro

Brasília – A pandemia de Covid-19 tem causado  diferentes níveis de sofrimento mental nas famílias.

Isso não ocorre por acaso. Estamos vivenciando em isolamento lutos individuais, com perda de familiares, amigos, vizinhos, colegas de escola ou trabalho.

Ao mesmo tempo,  vivemos um luto coletivo, em um país que ultrapassou a casa dos 470 mil mortos. Quase meio milhão de vidas ceifadas por falta de vacina e desinformação.

Como se fosse pouco, os cientistas anunciam a chegada da terceira onda da pandemia já no mês de junho. Tudo isso,  junto com as baixas temperaturas, principalmente  nas Regiões Sul e Sudeste.

Estudo realizado  entre os meses de abril e junho de 2020  por médicos do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP)  comprovou algo que cuidadoras familiares e informais (amigas e vizinhas) estão sentindo na prática desde o começo do Covid-19.

A pandemia  e a exigência de isolamento social atingiu  tanto os pacientes com demências, entre elas o Alzheimer,  quanto as cuidadoras.  Não bastasse os protocolos de saúde e higiene que requerem mais atenção e tempo de  toda população, há o  medo da doença e principalmente, o medo da morte. Seja a da pessoa doente, seja a da própria cuidadora e demais membros da família.  

Na pesquisa do Instituto de Psiquiatria foram entrevistados por telefone  e via questionários online 100 pacientes, sendo 71 idosos com transtornos neurocognitivos/psicogeriátricos e 29 adultos com Síndrome de Down. No grupo dos idosos, 65% relataram que houve aumento de ansiedade; 44% tiveram sensação de insegurança, 38% sentiram aumento de desânimo e 35%, de irritabilidade.

O principal  ponto, segundo os idosos,  para o agravamento dos distúrbios de saúde mental,  foi a impossibilidade de sair de casa (56%). Logo atrás veio o próprio isolamento social (43%).  As  cuidadoras também observaram piora do estado cognitivo em 34 idosos.

Entre os novos  sintomas  ou mais prevalentes do declínio do estado cognitivo  estão: agravamento da desorientação e confusão, percebido em 59% dos pacientes; abandono das tarefas habituais (50%); aumento da  dependência (47%) e piora na desorganização (44%). 

O estudo também apontou  uma alta correlação entre a piora dos sintomas neuropsiquiátricos presentes nos idosos com demência (como apatia, irritabilidade, prejuízo do sono, distúrbios do movimento e psicose) e o aumento do sentimento de sobrecarga física e mental  das cuidadoras.

No que diz respeito à apatia dos enfermos, ela  cresceu durante a pesquisa. Quando uma pessoa está apática, uma características de pacientes com Alzheimer, fica pouco responsiva e pouco interessada no ambiente a sua volta.

Em tempos de pandemia houve  cortes bruscos e profundos na convivência entre as famílias, entre  vizinhos e com profissionais da área de saúde, como fisioterapeutas, fonoaudiólogos e musicoterapeutas. Isso sem falar dos  passeios,  restritos ou realizados com distanciamento, sem abraços. Isso, além da doença,  contribuiu para a apatia. Por outro lado, acompanhar  idosos nessa situação  aumentou a sensação de impotência e a ansiedade das cuidadoras.

Na falta de possibilidade de vida social presencial segura, já que apenas  10, 4% dos brasileiros receberam a segunda dose da vacina, resta  o plano B. Isto é,  reinventar  a vida, inclusive dos pacientes com demências, no mundo virtual.

Pode ocorrer através de consultas online com psiquiatras, geriatras ou neurologistas  para os pacientes. No  atendimento terapêutico semanal online para cuidadoras. Ou em reuniões virtuais com a família que podem ocorrer diariamente, principalmente em famílias participativas, independente do tamanho.

Os profissionais da saúde lembram que  manter uma  rotina diária,,  com horários para cada atividade, contribui para saúde mental tanto de pacientes como de  suas cuidadoras. Mas há outras maneiras de cuidar e estimular o autocuidado.

Entre elas, comer nas horas certas, com  uma alimentação saudável, balanceada,  com pouco sal, gorduras ou frituras em excesso. E tomar líquidos para evitar desidratação.

Os exercícios também fazem parte da lista de atividades que contribuem para a saúde física e mental. No caso das cuidadoras, há práticas gratuitas ou com preço social, disponíveis no YouTube, no Instagram e em grupos de WhatsApp.

Algumas são estimuladas por departamentos de educação física das universidades públicas, como é o caso do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Atividade Física para Idosos (Gepafi), da UnB, que atende os +60. Outras são práticas integrativas de saúde ofertadas online pelo SUS. Ou você pode começar aos poucos,  caminhando com máscara.

Em termos de políticas públicas, precisamos urgente  de vacinas já. E que pessoas  com demência e suas cuidadoras  sejam  incluídas nos planos de recuperação para o futuro.

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