Por Ana Dubeux – À queima-roupa – Vilma Pinto, primeira mulher negra a exercer cargo de diretoria da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado
Ser a primeira mulher diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado é o maior desafio da sua vida? Como foi a trajetória da filha do pescador Jorge Henrique e da gari Carmélia até chegar ao Congresso?
É um dos maiores sim. Meu trabalho como analista de política fiscal começou ainda na época de estágio na Fundação Getúlio Vargas (FGV). Entrei na Faculdade de Ciências Econômicas da UERJ em 2009 e, em 2011, comecei o estágio na FGV. Fui contratada após alguns meses, inicialmente como assistente de pesquisa até chegar à posição de pesquisadora. Ainda na FGV, eu tive a oportunidade de cursar o mestrado em economia empresarial e finanças. Em 2020, eu dei um salto na minha carreira com a oportunidade de assessorar o secretário de Fazenda do Paraná. Em 2021, fui apresentada ao senador Otto Alencar, então presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e que tinha a prerrogativa de indicação para a diretoria da IFI. Após longa conversa sobre assuntos econômicos diversos, ele resolveu apoiar meu nome.
Dois anos depois da sua posse no IFI ainda a procuram para falar sobre representatividade preta?
Esse tema é muito importante. Infelizmente ainda estamos em um contexto muito desigual, apesar dos modestos avanços observados nas últimas décadas.
Quais barreiras, além do preconceito, precisam ser vencidas por uma mulher negra para alcançar um bom cargo ou realizar seus sonhos?
Precisamos avançar cada vez mais em ações relacionadas ao tema para que consigamos também apresentar resultados mais efetivos.
Hoje, como a senhora avalia o comportamento da economia nacional, diante de tantas desigualdades, sobretudo em relação aos negros, em particular as mulheres, que apequenam o nosso país?
São vários fatores, mas acredito que a questão sócio econômica contribui muito para as disparidades que encontramos nas estatísticas. Eu sempre gosto de sugerir os estudos que a Janaína Feijó realiza para a FGV sobre o tema. São números surpreendentes.
A reforma tributária sobre o consumo prevê mudanças nas políticas fiscais no Brasil para promover maior equidade de gênero e racial?
O objetivo da reforma tributária é promover uma simplificação do sistema atualmente existente. Não vejo como foco dessa reforma (PEC 45) tratar de questões associadas a redução de desigualdade e regressividade do sistema como um todo, embora a simplificação em si possa gerar efeitos indiretos nessa direção. No entanto, a reforma prevê a criação do “cash back” nos moldes da experiência do Rio Grande do Sul. Se bem sucedida, ela poderá ter impactos também na questão da desigualdade de renda.
Como as desigualdades sociais e econômicas contribuem para a disparidade no pagamento de impostos pelas mulheres negras?
Existe uma característica importante na tributação sobre o consumo, que é a regressividade. Ela se dá na medida em que não é possível identificar o contribuinte para que, com suas características individuais, se possa estabelecer uma tributação mais justa. A compra de um mesmo bem tem o mesmo tributo, seja para uma pessoa de alta renda, seja para uma pessoa de baixa renda. Quando olhamos esse consumo em percentual da renda individual, vemos que a tributação desse bem acaba pesando mais para a pessoa de baixa renda que a de alta renda. Uma característica adicional, que está muito associada ao tipo de reforma pretendida atualmente, diz respeito a diversidade de alíquotas e regimes que existem nos diferentes bens e serviços da economia. Essa diferenciação pode também contribuir para disparidades no pagamento de tributos por parte da sociedade. O nosso sistema tributário tem muitas distorções e elas acabam por onerar mais um individuo que outros.
Como podemos garantir uma maior participação das mulheres negras nas discussões sobre políticas fiscais e reformas tributárias?
Começa pelo aumento da representação em cargos políticos, de gestão e lideranças. É importante ampliar o diagnostico em relação as desigualdades de gênero e raça que existem atualmente. Nessa linha, o fortalecimento de agendas como ESG, ODS e orçamento sensível a gênero e raça são fundamentais para a realização de ações (públicas e privadas) para redução dessas disparidades.
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