O Ministério Público do Distrito Federal entrou com uma ação civil pública contra o pagamento de auxílio-moradia retroativo a conselheiros e procuradores do Tribunal de Contas do DF. O gasto da Corte com o benefício, retroativo de 2009 a 2013, ficou em R$ 1,39 milhão. Cinco conselheiros e três procuradores receberam a bolada, que chega a R$ 209 mil por pessoa. Só o conselheiro Renato Rainha e a procuradora-geral do MP de Contas, Cláudia Fernanda de Oliveira, abriram mão do auxílio referente a anos anteriores, por considerá-lo ilegal. Na ação, a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e Social pede que os beneficiados devolvam o dinheiro aos cofres públicos. O MP não descarta entrar com uma ação de improbidade administrativa “por violação aos princípios constitucionais da administração pública”.
Na ação, os promotores Alexandre Fernandes Gonçalves e Marcelo Barenco afirmam que houve “evidente desacerto nos atos adotados pela Presidência do TCDF, para pagar o retroativo, em questão, em manifesto vilipêndio aos princípios constitucionais da administração pública, em nítido açodamento”. Na petição inicial, os promotores lembram ainda que o pagamento ocorreu mesmo depois de questionado pelo Ministério Público de Contas, que entrou com uma representação contra o repasse do benefício retroativo. “Além do conselheiro Renato Rainha, apenas a procuradora-geral de Contas, Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira, requereu a anulação do ato, restando os demais beneficiários do ato silentes, o que não obsta tenham que proceder a devolução do pagamento indevido, na forma da lei”, destacam os promotores na ação civil pública.
Para o MPDFT, “trata-se de clara violação ao princípio da moralidade, posto que o objetivo a alcançar era apenas o pagamento, independentemente, do dever de boa-fé. Não fosse isso bastante, o pagamento efetuado também atenta contra a economicidade, em face do atual cenário de grave crise financeira e fiscal que o Estado atravessa, de modo que sequer a oportunidade e conveniência poderiam justificar ou autorizar o TCDF fazer a famigerada autoconcessão”.
Os promotores garantem ainda que o pagamento é “absolutamente ilegal” porque contraria uma decisão do Supremo Tribunal Federal de 2014, que reconheceu o direito dos magistrados ao auxílio, mas não garantiu o pagamento retroativo a 2009. Há também uma decisão do Conselho Nacional de Justiça, que suspendeu o pagamento de valores retroativos do auxílio-moradia de juízes estaduais para o período entre 2009 e 2014.
Benefício mensal
Assim como magistrados e membros do Ministério Público, os conselheiros têm direito a auxílio-moradia mensal no valor de R$ 4.377,73. Os integrantes do Tribunal de Contas do DF e os procuradores do MP de Contas recebem mensalmente o benefício desde setembro de 2013, mas havia um debate sobre o pagamento do retroativo, o que gerou a abertura de um processo na Corte. Esse processo estava sem andamento desde 10 de outubro de 2014 e a tramitação foi retomada em junho deste ano.
A cúpula do TCDF determinou a elaboração de novos cálculos, para liberação dos benefícios passados. Segundo o MP, “não houve parecer jurídico da consultoria. Ao contrário, o que se viu foi a remessa dos autos diretamente à presidente do TCDF, conselheira Anilcéia Machado, que, em 7 de agosto, encaminhou o processo à Secretaria-Geral de Administração a fim de implementar o pagamento”.
Em 18 de agosto, a Presidência do TCDF determinou a inclusão do benefício em folha suplementar. Às 15h04, foi emitida a ordem bancária de R$ 1,6 milhão. Na sequência, o conselheiro Renato Rainha solicitou a exclusão da folha e o depósito foi cancelado pouco depois. No dia 18, a procuradora Cláudia Fernanda entrou com representação contra o pagamento e o documento foi recebido na Presidência às 12h10, pouco antes do depósito.
Em nota, a Procuradoria-Geral do MP de Contas esclareceu que Cláudia Fernanda só soube do pagamento em 22 de agosto, após informação certificada pelo estabelecimento bancário, e, na mesma data, requereu a anulação do pagamento ao TCDF. No dia seguinte, a Corte informou sobre a impossibilidade de anular o pagamento, repassando os dados bancários para depósito da devolução. Assim, a procuradora Cláudia Fernanda devolveu os R$ 209 mil que o TCDF havia depositado. Na nota, a Procuradoria-Geral do MP de contas reafirmou que a procuradora “não requereu e não autorizou o pagamento em sua conta, tendo oferecido duas representações no TCDF para questionar o pagamento retroativo do referido auxílio, tendo em vista o fato de que o STF não autorizou o pagamento retroativo”.
Outro lado
Questionada sobre a ação civil pública, a assessoria de imprensa do Tribunal de Contas do DF informou que “o direito ao recebimento de auxílio-moradia foi concedido pelo Supremo Tribunal Federal, no âmbito daquela Corte, além de CNJ, STJ, CMP, CJF e de diversas magistraturas estaduais, inclusive do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios”. Ainda segundo o TCDF, “a aplicação aos conselheiros deste Tribunal de Contas e membros do Ministério Público junto ao TCDF ocorre por força de equiparação constitucional, e não de decisão desta Corte de Contas”.
A assessoria de imprensa do TCDF afirmou ainda que o reconhecimento do direito ao passivo remanescente, referente ao período de outubro de 2009 a setembro de 2013, “é procedimento administrativo de rotina, e o pagamento é condicionado à existência de recursos próprios”. A Presidência da Corte destacou também que “outras Cortes de Contas, Tribunais de Justiça estaduais e Ministérios Públicos, igualmente abrangidos pela equiparação constitucional no que diz respeito a este benefício, já realizaram ou estão realizando o pagamento de valores retroativos conforme disponibilidade orçamentária e financeira, assim como no TCDF”.
“Por fim, cabe ressaltar que, conforme posicionamento em decisão judicial do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), não há impedimento legal ao pagamento do benefício a quem tenha casa própria, assim como ‘o referido benefício não se revela um exagero ou algo imoral ou incompatível. Cada categoria de trabalhador possui direitos, deveres e verbas que lhe são próprias’”, finalizou o TCDF em nota.
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