Há um trem parado na estação

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VISTO, LIDO E OUVIDO, criada desde 1960 por Ari Cunha (In memoriam)

hoje, com Circe Cunha e Mamfil – Manoel de Andrade

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Charge do Adão, de Um Brasil

 

            Em tempos de conflitos e de um embaralhar de línguas, onde parecem prevalecer apenas os monólogos e mímicas de cegos e mudos, melhor mesmo é deter a marcha, olhar para trás, para ver em que ponto dessa jornada tomamos o atalho errado. Com isso, a recomendação é seguir o que recomendam os antigos e mais experientes nesses processos em que os humanos voltam a se perder nos labirintos da Torre de Babel.

            O primeiro passo talvez seja não discutir com os tolos e ignorantes. Do mesmo modo, não insistir em prosseguir jogando ou pelejando xadrez com os pombos. O que parecem ser, à primeira vista, receitas singelas e fáceis, são na verdade potente unguento contra os males das discórdias.

            Diante da impossibilidade de acreditar no relativismo de todas as coisas e de todos os atos, melhor não prolongar o debate e cessar logo o discurso. Não pode haver discussão ou entendimento, onde a verdade foi impedida de se estabelecer. Na ausência da verdade, a estratégia dos antigos mandava imperar o silêncio. Para o leitor e eleitor, apanhado de surpresa em meio a esse tiroteio, não existe justificativa, nem no céu, nem na terra, que faça prevalecer a força que combate a ética e os valores humanos. O mal não necessita de justificativas, pois ele se impõe pela força ou pela falta de raciocínio.

            Quando eleições nacionais, e que dizem respeito apenas aos brasileiros, passam a ganhar grande destaque na mídia internacional, figurando nas primeiras páginas dos principais noticiários do planeta, é que esse pleito específico deve merecer maiores reflexões por parte de nossos eleitores. Num planeta em que a maioria dos países sempre torceu o nariz para nossos assuntos internos, que importância teria essa eleição agora para chamar tanta atenção?

             A resposta a essa questão não está apenas no fato de o Brasil ser o celeiro do mundo. Vai mais além. Muito além. Ocorre que esse destaque internacional, que em alguns casos beira a torcida organizada, é bem mais visível por parte daqueles países e noticiários mais vinculados à ala esquerda. Há, de fato, uma torcida por parte dessas ideologias, para que vença o atual candidato da oposição. Isso é patente. O que não é muito claro são os motivos dessa torcida.

            Nesse mundo onde a inversão dos valores passou a ser o novo normal, o que fica nítido, em primeiro plano, é que o candidato da oposição é, de fato, o escolhido pelo sistema. Que sistema? perguntariam alguns. O sistema é tudo o que engloba as forças e o poderio das finanças da esquerda, espalhadas tanto em nosso continente como alhures. Para esse lado ideológico especifico, o chamado “trem da história” aguarda apitando e soltando fumaça na estação. Os passageiros aguardam apenas a chegada do novo Lenin tropical. Desde sempre, os antigos vêm alertando a todos para que tomem cuidado com aqueles que dizem ter uma missão. Sobretudo se essa missão apontar para além das fronteiras nacionais. Essa é uma experiência do passado e que tem causado muitos sofrimentos e perdas humanas, mas ainda assim é repetida e aceita por força do niilismo que parece imperar nas mudanças de século e de milênio.

            Também foi dito pelos antigos sábios que o melhor é sempre manter distância das ideologias do momento. Principalmente se essas vierem acompanhadas por ideias de paraísos futuros. Líderes autênticos não apontam paraísos fictícios. Falam a verdade como ela é: em preto e branco. Políticos não são arautos de paraísos. Muito menos pai ou mãe disso ou daquilo. O que parece complicar ainda mais toda essa explanação é que vivemos, de fato, tempos em que a censura e o cala boca voltaram com força, anunciando, com sua mordaça, o que poderá ser o porvir. Em momentos assim é que as antigas parábolas e alegorias voltam à tona redivivas.

            Num país onde o ensino e a qualidade da educação formal são escassos, nada mais natural do que termos eleitores médios, com ideias e pensamentos médios e que não prestam muita atenção ao que se passa ao redor, nem em seu meio. A realidade, ao contrário do que muitos acreditam, não está no futuro, mas no passado e em tudo o que pôde ser visto a olho nu, sentido na pele e escoado pelas lágrimas. Na mão de políticos hábeis, a imaginação é manipulada a tal ponto que faz com que a mentira ganhe uma auréola de luz. A política, entre nós, que já não era chegada à verdade e à razão, ganhou ainda mais impulso e vida no mundo virtual das mídias, irmanando-se com o falso perfume das utopias. “Vamos botar fogo no circo”, dizem alguns. “Vamos jogar ainda mais gasolina nas chamas”, dizem outros.

           Cuidado com as eleições, sobretudo aquelas em que muitos alimentam com nacos do próprio fígado. Esteja consciente de que seu voto é uma arma apontada para sua própria cabeça, mas que pode ferir e matar aqueles que estão próximos a si. Se não por bala, por desgosto. Não acredite em discursos que falam sobre coisas como a “festa da democracia”. No melhor de Millôr, lê-se: “democracia é quando eu mando em você. Ditadura é quando você manda em mim.”

            Neste dia de eleição, rume rápido e silente para as urnas. Não confie em ninguém. Não declare seu voto. Volte também rápido para casa. Tranque a porta. Desligue o rádio. Realize seu trabalho doméstico como de costume. Mantenha-se alheio ao que se passa nas ruas. Não dê ouvidos aos diálogos sobre política e eleições. Não alimente expectativas. Aprenda que o desejo é a fonte do sofrimento. Cessa o desejo, cessa o sofrimento.

            Se na segunda-feira, quando você se inteirar que seu time não ganhou o campeonato, não se importe. Siga como antes. Não dê os parabéns, nem critique os vencedores. A vida é o que você faz dela. Siga em frente! Não deixe que suas emoções de alegria e dor fiquem estampadas no seu rosto. Em tempos incertos, voltam os antigos a ensinar que a vida, como a política, pode ser sempre um exercício fútil.

 

 

A frase que foi pronunciada:

“O cargo mais importante, e que todos nós podemos e devemos ocupar, é o de cidadão.”

Louis Brandeis

Louis Brandeis. Foto: Biblioteca do Congresso, Washington, DC

 

História de Brasília

Embora ainda distante, a Semana Santa é responsável pela alta desenfreada nos produtos pescados. O “Peixe e Gelo”, que ninguém sabe porque continua na “invasão”, podendo estar nos mercadinhos aumentou consideravelmente seus preços. (Publicada em 13.03.1962)

Sucupira é aqui

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Foto: José Cruz/Agência Brasil

 

           Estivesse vivo hoje, por certo, o dramaturgo Dias Gomes (1922-1999) ficaria espantado com a verossimilhança entre sua peça “Odorico, O Bem-Amado”, de 1960, e o que ocorre atualmente na cena política do país neste ano do nosso Senhor de 2022. É a realidade imitando a ficção e elevando a imaginação aos píncaros da criatividade. De fato, o Brasil é hoje uma imensa Sucupira, local fictício onde se desenrola a trama. Na verdade, desde sempre, o Brasil, pelas próprios personagens e lideranças políticas caricatas, é um país onde a realidade e ficção sempre andaram de mãos dadas. Tanto que é difícil saber, ao certo, onde começa uma e termina outra.
           Certo também é que, no atual contexto político, fica fácil saber a quem melhor encarnaria o personagem de Odorico Paraguaçu, por seu histrionismo e por suas falas amalucadas, cheias de nonsense. Na ficção, Odorico é o prefeito de Sucupira, retratado como um político corrupto, demagogo e que ilude a inocente população local com seus discursos verborrágicos, repletos de neologismos e de ameaças mirabolantes. Odorico é um ufanista, defensor do nepotismo e, na peça, acredita, com segurança, que irá resolver todos os problemas locais de sua administração, como os problemas centrais do planeta, através de medidas como a exportação do azeite de Dendê. “Vamos temperar o Brasil com azeite de Dendê e, prafrentemente, vamos temperar o mundo e o mundo vai se curvar ante o Brasil, ao provar do nosso Acarajé, do Vatapá e do nosso Caruru. Vamos acarajeizar a América, vamos vatapazar a Europa. Para esse meu coração verde amarelecido, que nada de braçada no mar das ufanias, mormentemente considerando que isso representa mais divisas para nosso país, o equilibrismo de nossa balança de pagamentos e quiçá, a salvação da nossa mui amada e afazmente individada pátria.”
           Vivêssemos na terra do nunca, onde até a maldade é de mentirinha, esse seria um discurso apenas hilário. Mas a realidade não tem graça alguma e torna-se até ameaçadora, quando vemos esse tipo de político, milagrosamente ainda aceito pela população iletrada, brandir suas promessas agourentas, cheias de maus presságios.
          Com relação ao petróleo, nada mais atual do que o discurso de Odorico: “Para o problema do petróleo, eu já criei a Petropira, que é para explorar o petróleo de Sucupira, emboramente esses retaguardistas, esses retogradistas, corugistas, digam que não existe petróleo em Sucupira. Mas nós vamos assinar um contrato de risco com a Petrobras, desses em que o risco é todo dela e o petróleo é todo nosso.” Nada mais semelhante ao que escutamos hoje.
          Quando perguntado sobre a posição política desse gênio da raça, filho legítimo do cabrestismo ou voto de cabresto, a resposta é de uma atualidade ímpar: “eu sou partidário da democradura e que bota os pés no hoje com os olhos no depois de amanhã.” Qualquer semelhança é pura coincidência!
          Para que tão nobre e impoluto personagem prossiga sem atropelos em sua caminhada, agora na vida real, levando à frente toda essa farsa sociopolítico-patológica, como definia o próprio Dias Gomes, é que o Tribunal Superior Eleitoral, na figura de seu comandante, mandou censurar, severamente, todas as críticas que porventura venham a ser feitas a esse político de passado ruinoso. É a justiça tentando reescrever a realidade, dando cores fantasiosas aos fatos, numa autêntica medida “marronzista” e “badernenta”. É a história entrando para os anais e menstruais desse país surreal.
A frase que foi pronunciada:
“Vai ter uma confabulância político-sigilista sobre as nossas candidaturas”
Odorico Paraguaçu
Odorico Paraguaçu. Foto: Acervo TV Globo
Contra a lei
Ligações não reconhecidas, cobrança de portabilidade indevida, cobrança de serviço cancelado, propaganda enganosa, telefones fixos sem funcionamento. A população, que teria uma agência nacional para protege-la, está completamente abandonada. A OI, por exemplo, que traz na conta a informação que está em recuperação judicial, não disponibiliza um número que funcione para receber as ligações dos clientes que reclamam sobre os telefones fixos, que não funcionam mais. Basta dar uma volta pelo Reclame aqui. Não há interesse nem em responder os registros no site.
Imagem: SOPA Images/Getty Images
Contra o edital
Uma lástima alguns concursos oferecidos pelo GDF. É preciso considerar o Edital durante a contratação. As vagas disponíveis não são preenchidas pelos cargos oferecidos. O resultado é que o proponente assume o trabalho e, por ter um novo emprego, não reclama. Na realidade, a insatisfação pessoal é nítida quando se empenha dois anos de estudos para não ser o que estudou para ser.
Foto: Divulgação/Sejus
Contra o orçamento
Pelo menos os milhões tirados dos contribuintes e usados para a construção do Buritinga serviram para nortear alguns endereços: “próximo ao Buritinga, retornando o Buritinga.” No mais, está inservível e abandonado.
Centro Administrativo do governo do Distrito Federal, em Taguatinga — Foto: Isabella Calzolari/G1
História de Brasília
Quando surgirem os primeiros casos de polio em Brasília, aí então o ministro Souto Maior sairá em campo, correndo, para trazer vacinas Sabin para o Distrito Federal. Criminoso abandono. (Publicada em 11.03.1962)

Ciranda de uma perna só

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Charge do Duke

 

Nestes tempos mimizentos

De muito patrulhamento de ideias

e de pouca reflexão

Vivemos a angústia de ter que escolher

o que pode ser dito e o que não pode não

A palavra amordaçada

perdeu a verdade e força

acorrentada em grilhões de ferro

na mais brutal das censuras

preferiu então se recolher

a ter que concordar

com tamanha impostura

Nesses tempos cinzentos

a palavra calada

mostra sua melhor expressão

Ao dizer que não disse nada

nem que sim nem que não

Melhor então emudecer

recolhendo a pena e o pensar

E com toda a prudência e atenção

livrar-se de ser mais uma vítima

de tão feroz repressão

A censura sempre pouco ilustrada

só enxerga e teme

seja o cargo que ocupa ou a mão fraca no leme

De tanto podar aqui e ali

e de tanto o texto esfacelar

encontra em frases escritas

o que de fato lá não há

Por isso mesmo

A censura e a repressão

vivem sempre em harmonia

em perfeita união

uma atalhando o texto

a outra esfaqueando a mão

Se é nesse tipo de democracia

que viemos dar

isso depois de tanta luta

depois de tanto penar

melhor então voltarmos ao dia exato

em que tal abertura foi prometida

quem sabe naquela ocasião

Alguma coisa foi esquecida

Que rumo é esse que agora tomamos

sem propósito, ânimo ou paixão?

Será que n’algum atalho do passado

perdemos o sentido e a direção?

desviamos do caminho sonhado

dispersos em algum abismo distante

agora, cegos e mudos, não podemos seguir adiante

Quem sabe perdermos o mapa da liberdade

esquecido n’alguma dobra desses últimos trinta anos

era o que tínhamos em mãos

era todo o nosso plano

Uns lhe chamavam de Carta Magma

outros de Constituição

Alguém sabe por onde anda

esse desejo da nação?

até mesmo o noticiário

que antes se atinha em informar e ilustrar

agora por linhas tortas

se contenta em bajular

fazendo propagandas

de olho na aprovação

daqueles que nada querem

a não ser a perdição

Se já não podemos falar, pensar e escrever

melhor buscar em outras bandas

quem possa nos socorrer

Há tempos já se sabe

que a tirania para prosperar

necessita de mil bocas

e mil olhos a vigiar

A frase que foi pronunciada:

“É melhor escrever errado a coisa certa do que escrever certo a coisa errada…”

Patativa do Assaré

Patativa do Assaré. Foto: Fernando Travessoni

História de Brasília

Quando o dr. Jânio estava no gôverno, mandou retirar as buzinas a ar de todos os ônibus chapa brancas. Agora, a moda voltou, e os carros, principalmente da Câmara, incomodam tremendamente a população. (Publicada em 01.03.1962)