Juízes trabalhistas contrários à reforma entram na mira de advogados

Compartilhe

RODOLFO COSTA

A guerra entre advogados e juízes trabalhistas em torno da Lei 13.467/17, que trata sobre a reforma das legislações do trabalho, está apenas começando. Depois de a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) ter divulgado uma cartilha no qual sugere como interpretar a lei, advogados já elaboram teses para pedir a suspensão dos árbitros no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Os processos de averiguação da conduta dos magistrados não será feito a esmo. Advogados en/stão mapeando juízes que se manifestaram contrários à reforma. A ideia é aguardar decisões adotadas por essa categoria após a Lei 13.467/17 entrar em vigor, em 11 de novembro. A partir daí, ficarão atentos nas decisões adotadas pelos juízes.

A depender de uma sentença que contrarie os dispositivos legais previstos na reforma trabalhista, os advogados planejam pedir uma punição administrativa pelo CNJ ao magistrado que, por ventura, tenha dado opinião contrária à Lei antes que ela entre em vigor. “A não imparcialidade para julgar uma lei depois de um julgamento pode provocar a suspensão do juiz. É possível arguir a suspensão e isso está previsto na lei orgânica em toda ocasião que o juiz se torna suspeito”, afirmou o advogado trabalhista Eduardo Pastore, sócio-diretor do escritório Pastore Advogados.

Não faltam posicionamentos contrários de juízes em relação à reforma trabalhista. Alguns emitiram posições que deram até a entender que não aplicarão a lei em suas decisões. Por conta disso, Pastore entende que esses magistrados que fazem oposição à lei estão indo contra à própria Lei Complementar nº 35/1979, que dispõe sobre a Lei Orgânica da Magistratrua Nacional, e o Código de Ética da Magistratura.

As matérias em questão expressam, por exemplo, que o juiz deve cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais. E ainda advertem que o magistrado deve ser imparcial, devendo buscar nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo, ao longo de todo o processo, uma distância equivalente das partes. Devido às críticas proferidas antes mesmo que a reforma trabalhista entre em vigor, Pastore sustenta a tese de que os magistrados faltam com a ética e imparcialidade.

“Quando o juiz fala que não vai aplicar uma lei, será que não fere um princípio ética e da imparcialidade? Eu acredito que sim. Na minha avaliação, um juiz que já critica abertamente a reforma não terá imparcialidade para julgar esta lei”, criticou Pastore. Para ele, qualquer outro profissional poderia fazer crítica à lei, mas não um juiz trabalhista. “Esses magistrados não podem se manifestar da maneira como estão fazendo. São eles que vão julgar uma causa trabalhista”, protestou.

O entendimento de Pastore é partilhado pelo advogado trabalhista e vice-presidente da Central Brasileira do Setor de Serviços (Cebrasse), Ermínio Lima Neto. Para ele, posicionamentos contrários de magistrados à reforma expressam uma vontade de legislar. “Se o juiz modifica a intenção do legislador, ele está legislando. E ele não tem autorização para isso. É por isso que o magistrado deve seguir com orientação a essência da lei. Ao dizer que não vai cumprí-la, ele está cometendo um grave erro, inclusive, inconstitucional”, declarou.

Para Ermínio, há, na verdade, um alvoroço entre juízes por terem sofrido limitações para propor súmulas em decorrência da reforma trabalhista. A legislação expressa que súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) e pelos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) não poderão restringir direitos legalmente previstos, nem criar obrigações que não estejam previstas em lei.

“A reforma limitou a capacidade deles de impor verdadeiras leis, através das súmulas, produzidas em linha de montagem e aprovadas sempre em reuniões fechada. O que não será mais possível, pois as sessões terão de ser públicas e aprovadas por maioria dos membros, e com participação da sociedade”, disse Ermínio.

Liberdade

A categoria dos magistrados do trabalho, no entanto, mostra confiança de que não fere as lei orgânica e o código de ética da magistratura. O presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano, declarou que juízes podem questionar uma lei, na medida em que exercem o direito de discutir tecnicamente e cientificamente o texto. “Alguns escrevem livros e dizem isso. Também em nenhum momento dizemos que todos os juízes pensam ou devem pensar da mesma forma. Defendemos, antes de tudo, a liberdade técnica”, afirmou.

Da mesma forma que a Anamatra defende que juízes questionem uma lei, Feliciano garante que magistrados tenham liberdade para entender que uma legislação não tem defeito algum. “Sempre discutimos tecnicamente leis que estão em vigor e vão entrar em vigor. É absolutamente natural”, declarou.

Na avaliação do presidente da Anamatra, há um entendimento absolutamente equivocado que juízes têm a obrigação de interpretar literalmente as leis. “Desde que o mundo é mundo, todo texto deve ser interpretado”, argumentou Feliciano. “Os juízes interpretam as leis para aplicá-las. O que não significa desobediência civil. É o papel que os juízes têm, de interpretar os textos. Isso não afeta a imparcialidade e nem o dever ético”, sustentou.

Os magistrados, inclusive, estão confiantes de que não serão punidos pelo CNJ. “O Conselho cuida de matéria disciplinar e tem todo o caso de tomar cuidado para fazer a separação entre o joio e o trigo. Entre o que é uma questão disciplinar e de um juiz que violou e se envolveu com corrupção, por exemplo. Juízes devem ter independência para decidir. Então, ele não pode ser responsabilizado por isso”, disse Feliciano. Questionado, o CNJ não se posicionou sobre o assunto.

Vicente Nunes