GuedesCCJ Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Guedes tenta reverter decisão do STF sobre ICMS em encontro com Fux

Publicado em Economia

ROSANA  HESSEL

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, tentará, na tarde desta quarta-feira (28/04), negociar com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, algum acordo para a Corte decidir favoravelmente ao governo em relação aos recursos da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), sobre a chamada “tese do século” em direito tributário, que trata da inclusão indevida do Imposto sobre Comercialização de Mercadorias e Serviços (ICMS) na base de cálculo para a cobrança de PIS-Cofins.

 

O encontro não estava na agenda do chefe da equipe econômica de hoje, mas constava na de Fux das 18h30. A assessoria da Economia só divulgou uma atualização no início da tarde, mas evitou comentar sobre a pauta da reunião. Guedes vai ao encontro com o presidente do Supremo acompanhado de Ricardo Soriano de Alencar, procurador-geral da Fazenda Nacional e Paulo Mendes de Oliveira, coordenador-geral de atuação judicial da pasta perante ao STF, para tratar desse assunto que afeta os cofres públicos, pois envolve cifras bilionárias. Várias entidades empresariais já enviaram cartas abertas aos ministros do Supremo contra os embargos da União e, portanto, o embate será de gigantes.

 

O Supremo deverá julgar, amanhã (29/04), os embargos de declaração da PGFN contra o acórdão da Corte que considerou, em 2 outubro de 2017, a inclusão do Imposto sobre Comercialização de Mercadorias e Sereviços (ICMS) na base de cálculo para a cobrança de PIS-Cofins. O processo foi relatado pela ministra Cármen Lúcia  e o placar da votação foi 6 a favor e 4 contra, sendo vencidos os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Antonio Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Votaram a favor e junto com a relatora os ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Celso de Melo.

 

Naquele ano, as estimativas do Ministério da Economia que constavam no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) é que os prejuízos poderiam chegar a R$ 250,3 bilhões e, de acordo com a pasta, o valor atualizado para 2020 sobre o impacto econômico é de R$ 258,3 bilhões.  “É importante destacar que esses valores não consideram a possibilidade de dedução do ICMS destacado na nota, o que tornaria o impacto orçamentário mais difícil de prever”, informou a pasta.

 

Esse montante de perdas, contudo, não é muito bem explicado, na avaliação de analistas, pois o Fisco não vem registrando queda na arrecadação após a decisão do Supremo de 2017. Vale lembrar que, recentemente, o ministro Paulo Guedes, comemorou o dado recorde registrado em março, de R$ 137,9 bilhões, com aumento real (descontada a inflação) de quase 20% sobre o mesmo mês de 2020.

 

Para especialistas, um favorecimento da União para uma decisão sobre uma tese consolidada — a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo sobre PIS-Cofins — e que tem decisões transitada em julgado em várias instâncias após o acordão da decisão de março de 2017 deverá provocar mais insegurança jurídica.

 

Nos embargos de declaração, a PGFN pede uma nova data para a modulação da decisão e pede a consideração dos créditos de ICMS nos descontos do ICMS, ou seja, a inclusão desse desconto na base de cálculo de PIS-Cofins, para que seja destacado nas notas o tributo “efetivamente recolhido”.

 

“O Supremo demorou muito a decidir esse tema que estava sendo discutido desde 2000. Foram 17 anos e não quero entrar no mérito se a decisão foi boa ou ruim. O certo é que foi decidido em 2017 e fazer uma nova modulação não faz sentido. A modulação existe para evitar que determinadas decisões gerem insegurança jurídica, porque a modulação tem que ocorrer em um período próximo da decisão e não quatro anos depois”, alertou o advogado Eduardo Maneira, presidente da Comissão Especial de Direito Tributário da Organização dos Advogados do Brasil (OAB). Para ele, qualquer parâmetro a ser utilizado para modulação a partir de agora será injusta.

 

“Os processos já foram julgados em sua maioria e como obrigar agora a devolução desse dinheiro. Nossa posição em relação aos desembargos de declaração é que decisão de 2017 deve ser mantida na integra”, disse Maneira. O advogado contou que o escritório dele não tem mais nenhum processo pendente sobre esse assunto. 

 

No entender do especialista, além de modular temporalmente, o Ministério da Economia quer que seja apenas o ICMS efetivamente recolhido, ou seja, o que se pagou em dinheiro, para reverter a decisão do plenário do Supremo.  “As empresas já estão descontando o ICMS destacado nas notas fiscais para o cálculo do pagamento de PIS-Cofins, porque estão cumprindo uma decisão do Supremo, que manda excluir o ICMS da base de cálculo, mas isso não quer dizer que o ICMS não está sendo pago, porque, se elas possuem crédito, têm o direito de fazer o desconto O Imposto está sendo pago de qualquer forma. Seja em dinheiro, seja na forma de créditos”, frisou o representante da OAB. 

 

O advogado tributarista Raphael Longo, sócio do escritório R. Longo Advogados e professor da Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo (FIA-USP), também considera um risco jurídico qualquer mudança na decisão do STF de 2017 e vai impactar milhares de ações já julgadas, aumentando a insegurança jurídica, porque vai mudar uma tese consolidada e que gera mais desconfiança de investidores internacionais. “Naquele momento, fixou-se a teste de que o ICMS não pode compor a base de cálculo de PIS-Cofins, porque isso é inconstitucional e vai contra o princípio da não cumulatividade. A decisão podia retroagir até 2012, porque a lei tributária só permite a devolução de impostos cobrados indevidamente nos últimos cinco anos. Foi proclamado um resultado que é definitivo e não poderia sofrer alteração, pois os Supremo demorou meses para publicar o acordo”, defendeu.

 

“A PGFN quer modular os efeitos da decisão e quer que o resultado do julgamento somente depois que os embargos forem julgados e fixar o ICMS que precisa ser descontado da base, considerando apenas os valores recolhidos efetivamente. Essas medidas tendem a diminuir o alcance da decisão”, afirmou. Segundo Longo, mesmo antes da decisão do STF sobre os embargos, a Receita já está considerando essa repactuação do cálculo antes mesmo de o Supremo se pronunciar. Procurado, o órgão respondeu que “não vai comentar o assunto”.

 

“O governo já está incluiu a interpretação dos embargos nas normas internas antes mesmo do julgamento”, alertou.  “Mas muitas empresas entraram com ação sobre o assunto e já ganharam em transito e julgado nesse período e já apresentaram as compensações para a Receita Federal, porque elas confiam na jurisprudência de uma decisão do plenário e que está repercutindo em outras ações, como a exclusão do Imposto sobre Serviços (ISS), porque já existem processos semelhantes”, acrescentou.