Dinheiro Governo deve antecipar o 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS. Foto: Daniel Alves/CB/D.A Press

Depósitos compulsórios crescem na contramão das medidas de estímulo do BC

Publicado em Economia

ROSANA HESSEL

 

Apesar de o Banco Central (BC) ter atuado logo no início da crise provocada pela pandemia de covid-19 para aumentar a liquidez no mercado financeiro, reduzindo o percentual para os depósitos compulsórios, essa medida tem se mostrado ineficaz aos olhos de analistas que acompanham atentamente os dados do do BC.

 

O volume de dinheiro parado nos cofres do BC como depósito compulsório, medida prudencial para o mercado financeiro, já cresceu R$ 87,7 bilhões entre abril e julho, mostrando que, apesar do estímulo ao crédito do BC, as operações de empréstimo não estão ocorrendo no meio da crise provocada pela pandemia de covid-19. Em grande parte, devido à desconfiança dos agentes financeiros que não querem correr riscos ofertando crédito no mercado, apesar de a taxa básica de juros estar em 2% ao ano, menor patamar da história.

 

Em janeiro, o total de depósitos compulsórios estava em R$ 475,6 bilhões, o pico do ano, e, março, quando o BC reduziu a alíquota de 25% para 17%, o volume tinha recuado para R$ 354,9 bilhões. Contudo,  no meio da pandemia, esse saldo voltou a subir mês a mês desde abril, passando para R$ 442,6 bilhões, em julho, último dado disponível. Logo, um aumento de R$ 87,7 bilhões em cinco meses, ou seja, de 24,7% no período. Mais do que o dobro dos 11% de crescimento que o BC espera no mercado de crédito neste ano.

 

Durante a apresentação do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, classificou que um dos problemas da crise atual provocada pela covid-19 é a falta de liquidez do mercado. Mas, na avaliação do consultor Roberto Luis Trostes, ex-economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), considera o diagnóstico está equivocado ao buscar soluções para a crise atual igual com as da crise financeira global de 2008 e 2009. Ele lembra que os dados “Não existe problema de liquidez, mas falta de demanda. Eles resolveram um problema que não existe e não conseguem resolver o existente”, destacou.

 

Conforme dados do Ministério da Economia, as medidas complementares ao aumento de gasto público adotadas para melhorar a funcionalidade do mercado financeiro somam R$ 3,8 trilhões, dos quais R$ 1,4 trilhão referentes a liberações de depósitos compulsórios. 

 

De acordo com Troster, a paralisação da economia por conta da covid-19 fragilizou ainda mais o balanço das empresas e gerou incertezas sobre o potencial de superação da crise de cada uma. Resumidamente, é um quadro em que a boa prática bancária prescreve: diminuir a oferta de crédito, encurtar prazos, aumentar
taxas, elevar as exigências e exigir mais garantias. “Acontece justamente num momento em que a crise exige dos bancos exatamente o oposto: aumentar a oferta de crédito, alongar prazos, reduzir taxas, diminuir as exigências e exigir menos garantias. Algo está sendo feito pelo setor. Mas é necessário mais. O ponto é que mais do mesmo pode levar o país a crise de crédito grave. Urge uma mudança na política bancária”, destaca o economista em artigo recente.

 

Segundo ele, o sistema bancário está sólido e pode suportar perdas pesadas de crédito mas não está disposto a correr o risco de serem um dos propulsores da recuperação ou se tornarem um dos fatores de agravamento.  ‘Há capacidade de emprestar mais. Todavia depende da política bancária a ser adotada. Até agora, foi de “muito vento e pouca chuva'”, resumiu .

 

Procurado, o BC evitou comentar a questão da liquidez e informou apenas que os recolhimentos compulsórios correspondem à parcela de depósitos mantidos pelos clientes nas instituições financeiras. “Dessa forma, se esses depósitos aumentam, o volume de recolhimentos compulsórios no Banco Central também aumenta. É exatamente o que se observa agora: as captações das instituições financeiras, relativas aos depósitos sujeitos aos compulsórios, vêm sofrendo crescimento, implicando aumento do valor recolhido”, destacou a nota.

 

Veja o histórico dos depósitos compulsórios na conta do BC:

 

Mês  Valores em R$ bilhões

Jul/19 — 428, 7

Ago/19 — 441,8

Set/19 — 438,4

Out/19 — 447,6

Nov/19 — 446,7

Dez/19 — 448,7

Jan/20 — 475,6

Fev/20 — 457,9

Mar/20 — 354,9

Abr/20 — 382,7

Mai/20 — 408,9

Jun/20 — 418,2

Jul/20 — 442,6