O mercado vai testar até o último instante, mas dificilmente o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central cederá às pressões para aumentar a taxa básica de juros (Selic), que está em 6,50% ao ano, o nível mais baixo da história. Não há, no entender dos diretores do BC, nada que justifique a elevação dos juros neste momento. A inflação, que seria a razão principal para um ajuste na taxa Selic, está há quase um ano abaixo de 3%, o piso da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Mesmo com o dólar em alta, encerrará 2018 na casa de 4%, índice confortável segundo o modelo definido pela autoridade monetária.
Também não há crescimento econômico. Muito pelo contrário. Todas as estimativas estão apontando para uma forte desaceleração do Produto Interno Bruto (PIB). O Itaú Unibanco chegou a projetar avanço de 4% neste ano. Agora, trabalha com um resultado próximo de 1%, que, se confirmado, já será uma grande vitória, dado o estrago provocado pela greve dos caminhoneiros. Mesmo com a paralisação suspensa, vários setores enfrentam dificuldades para retomar a rotina. Não por acaso, cresce o número de analistas prevendo queda do PIB entre abril e junho, trazendo de volta o fantasma da recessão.
O crescimento menor, por sua vez, tenderá a ampliar o desemprego. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que a taxa de desocupação atingiu 12,9% no trimestre terminado em abril, com aumento de 0,7 ponto percentual em relação ao índice observado entre novembro de 2017 e janeiro de 2018, de 12,2%. Mais de 13 milhões de brasileiros estão sem trabalho. Quando incluídos na conta aqueles com empregos precários, quase 28 milhões de cidadãos não têm renda suficiente para bancar despesas básicas.
Esses argumentos, inclusive, têm sido usados pelo presidente Michel Temer em conversas com integrantes da equipe econômica para enfatizar sua contrariedade em relação a um eventual aumento dos juros. “Será um desastre se o BC ceder às pressões do mercado”, vem afirmando ele. Na visão de Temer, desde o início, o Banco Central acertou na condução da política monetária. Tanto que levou a inflação para os menores níveis em duas décadas e conseguiu derrubar os juros de 14,25% para 6,50% ao ano. Para o presidente, “o que estamos vendo é um movimento especulativo contra o BC”, que não pode ser combatido com mais juros.
Riscos no horizonte
O governo reconhece — aí incluído o BC — que a disparada do dólar nas últimas semanas deve mexer com as estimativas de inflação, mas nada que leve os números a descolarem das metas. Apesar de toda a pressão, o time do BC comandado por Ilan Goldfajn acredita que a situação está sob controle e que as intervenções no câmbio têm sido suficientes para reduzir a volatilidade do dólar. Para o BC, o câmbio no Brasil é flutuante e deve refletir as condições do mercado, tanto para cima quanto para baixo. Mas os movimentos devem ser graduais, sem provocar distorções.
O dólar chegou a encostar nos R$ 4, o que obrigou o BC a anunciar um arsenal que já chega a US$ 50 bilhões em contratos de swap cambial, que consiste em venda da moeda norte-americana no mercado futuro. As portas estão abertas para que as intervenções superem os US$ 110 bilhões. O Banco Central reconhece que as condições com as quais vinha lidando pioraram, devido ao aumento mais forte dos juros nos Estados Unidos e a guerra comercial travada entre o país de Donald Trump com a China. Há, ainda, incertezas sobre as eleições de outubro próximo, uma vez que os candidatos mais bem posicionados nas pesquisas de intenção de votos não mostram compromisso com reformas como a da Previdência Social.
Contudo, esse ambiente mais adverso não justifica aumento da taxa Selic, sobretudo se for levado em consideração que, até a última reunião do Copom, a aposta geral do mercado era de que haveria queda para 6,25%. A decisão do Copom de manter os juros em 6,50%, por sinal, foi questionada por muita gente. “A pergunta que todos nós fazemos no governo é o que mudou de tão profundo para que os juros aumentem. Tivemos a greve dos caminhoneiros, mas todas as consequências dela justificariam queda da Selic, não alta. Vamos ver avanço menor do PIB e desemprego maior. Nesse ambiente, não há pressão inflacionária”, afirma um técnico da equipe econômica.
No Palácio do Planalto, todos ressaltam que o BC tem total autonomia para definir os juros. O bom-senso, no entanto, justifica a manutenção da Selic. O que o mercado quer, neste momento, é garantir ganhos maiores. Há, sim, riscos no horizonte. Mas o Copom terá tempo de sobra para avaliar, a cada 45 dias, até quando poderá sustentar a taxa básica da economia em 6,50% ao ano. Se, mais à frente, perceber o risco de a inflação se desvirtuar da meta, agirá com rapidez. O BC tem responsabilidade com o país, não está à mercê de um grupo de operadores que aposta no caos para de dar bem.
Brasília, 06h57min