A PIOR OPÇÃO

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O Brasil não se cansa de remar contra a maré. Em qualquer economia do mundo, com a recessão que estamos vivendo, o primeiro remédio adotado seria a redução das taxas de juros, como forma de se estimular a atividade. Foi o que se viu em todas as crises mais recentes, seja nos Estados Unidos, seja na Europa. Aqui, porém, mesmo com o Produto Interno Bruto (PIB) desabando quase 4% neste ano e outros 3% em 2016, o Banco Central será obrigado a elevar a taxa básica de juros (Selic), que já está em abusivos 14,25% ao ano, para algo próximo a 16%.

 

Há muitos questionamentos entre os especialistas sobre a eficácia desse possível arrocho. O argumento mais forte dos que são contra o aumento dos juros é o de que a economia enfrentará, no primeiro trimestre do ano que vem, o seu pior momento. O desemprego deve atingir níveis alarmantes, chegando aos 10%, e, endividadas, as famílias tenderão a decretar calote em boa parte das dívidas. Os mais pessimistas já falam na hipótese de convulsão social, o que, para o governo, será um problema enorme se o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff se estender até lá.

 

Na avaliação dos que não veem outra alternativa ao BC, a não ser pesar a mão na Selic, a justificativa principal é a inflação. Mesmo que, no início de 2016, já se vejam indicadores mensais melhores, no acumulado de 12 meses, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) continuará rodando na casa dos 9%, muito distante do limite de tolerância definido em lei, de 6,5%. O entendimento é de que, ao não fazer nada para forçar a queda da carestia, o BC estará se rendendo à visão que prevalece no mercado financeiro de que está de mãos atadas para agir, especialmente por causa da tal dominância fiscal, que tira todo o efeito da política monetária.

 

Intrigas

 

Independentemente do ponto de vista, há um fator de convergência entre os especialistas: mais uma vez, a economia terá de pagar o preço dos erros cometidos pelo governo, parte deles já no segundo mandato de Dilma. Assim que teve a reeleição consagrada pelas urnas, a petista indicou que faria um ajuste fiscal consistente para que a inflação entrasse nos eixos. Surpreendentemente, nomeou Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, sinalizando que, a partir daquele momento, tudo seria diferente em relação aos quatro anos anteriores. Ao mesmo tempo, o BC passou a elevar os juros.

 

O ajuste fiscal prometido com tanta ênfase, entretanto, não veio. E não aconteceu por causa do próprio governo. Em vez da conciliação para o bem do país, prevaleceram as divergências. O primeiro sinal claro de que não havia um real comprometimento do Palácio do Planalto com a arrumação das contas públicas foi a redução da meta de superavit primário de 2015 de 1,1% para 0,15% do Produto Interno Bruto (PIB) e dos anos seguintes.

 

O ápice do descompromisso com o ajuste fiscal, contudo, foi o envio, para o Congresso, do projeto de Orçamento de 2016 com previsão de deficit de R$ 30,5 bilhões. O mais gritante é que, até hoje, mesmo com Levy prometendo economizar 0,7% do PIB para pagar os juros da dívida, ainda não há meta definida para o ano que vem. O ajuste fiscal continua sendo uma promessa, regada à muita intriga na equipe econômica.

 

Apesar de estar explícito que o governo não faria o ajuste fiscal necessário — o rombo nas contas deste ano pode atingir R$ 119,9 bilhões —, o Banco Central resolveu dar um voto de confiança ao governo. Tanto que, desde setembro, vem mantendo a Selic inalterada, mesmo com o IPCA caminhando rapidamente para mais de 10%, como confirmou, na quarta-feira, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Agora, frustrado, o BC decidiu agir. O remédio será muito mais amargo se não tivesse se prendido a promessas que se mostravam impossíveis de serem cumpridas.

 

Frustração

 

O presidente do BC, Alexandre Tombini, sabe que a instituição tem sua parcela de culpa pelo péssimo momento econômico, que combina inflação à beira do descontrole com desemprego e recessão. Em discurso ontem na sede da Federação Brasileira de Bancos, (Febraban), ele admitiu que o atraso na adoção de medidas que resgatem a confiança de empresários e consumidores só afunda mais no país no atoleiro.

 

“Ressalto que uma eventual postergação dos ajustes somente adiaria o início da recuperação econômica, ampliando um círculo vicioso de incerteza, perda de confiança, adiamento de investimentos e reprecificação de ativos, aprofundando a queda da atividade econômica e tornando o próprio ajuste mais prolongado e custoso. No limite, esse círculo vicioso poderia comprometer fundamentos ainda sólidos da economia brasileira”, enfatizou Tombini. E acrescentou: “Clareza e determinação são elementos essenciais para o sucesso desse processo, inclusive para reduzir sua duração e seus custos econômicos”.

 

Infelizmente, entre as palavras e a ação, o presidente do BC e o governo estão devendo muito. Há um bate-cabeça inaceitável entre integrantes da equipe econômica. Enquanto Levy insiste no cumprimento da meta de 0,7% do PIB em 2016, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, trabalha no Congresso para que o superavit primário seja reduzido, provavelmente,  zerado. Tombini, por sua vez, assiste a tudo de forma impassível. Ou seja, aqueles que deveriam resgatar a credibilidade do governo, estimulam as incertezas. E o ajuste, como frisou o presidente do BC, quando vier, será mais prolongado e custoso.

 

Brasília, 08h30min