Ao ler notícias no Correio e ver matérias em emissoras de tevê sobre a volta de ocupação do Parque da Cidade — com algumas pessoas desrespeitando as orientações das autoridades, ao não usar máscaras e provocar aglomerações —, me veio à mente os tempos do “antigo normal” em que multidões se reuniam em torno de eventos ligados à música neste ícone da geografia da capital. Desde os primórdios de Brasília ocorriam shows ali, como parte da programação da, hoje histórica, Festa dos Estados, no Pavilhão de Exposições.
O Pavilhão tinha ao lado a desativada Rampa Acústica que, na década de 1980, acolhia o lendário Concerto Cabeças, palco para apresentação de brasilienses daquela geração, como Cássia Eller, Janete Dornellas, Flávio Faria, Liga Tripa, a banda Fallen Angel e o grupo de jazz Chakras, liderado pelo guitarrista Toninho Maia. Em uma das edições, percebi a presença na plateia de Renato Russo, que era fã de Toninho. Numa das entrevistas que me concedeu, já como ídolo do rock nacional, em tom de lamúria, Renato comentou; “Nunca me convidaram para participar do Cabeças”.
Quem também tomou parte algumas vezes daquele projeto foi o Mel da Terra, que, em 21 de abril de 1982, em outro local do parque, abriu um show de Ney Matogrosso em comemoração ao aniversário da cidade. Voltando ao Pavilhão, recordo-me de incontáveis shows, como o da banda Engenheiros do Hawaii, o de Gal Costa, interpretando clássicos da obra de Tom Jobim; e o primeiro, aqui no DF, da dupla Jorge & Mateus, em cima de trio elétrico a convite de Durval Lelys — então líder, vocalista e guitarrista do Asa de Águia.
Mas é em outro ponto do Parque da Cidade, a Praça das Fontes, onde a música tem sido mais ouvida. Lá, ocorreu, por exemplo, entre 2014 e 2017, quatro edições do Nívea Viva, que celebraram o rock, o samba, Tim Maia e Jorge Benjor, com participação de artistas como Nando Reis, Paralamas do Sucesso, Martinho da Vila, Alcione, Diogo Nogueira, Ivete Sangalo, Criolo e Skank.
Também naquele espaço, em 2018 e 2019, rolou o Carnaval no Parque, com destaque para cantores e bandas de axé music, entre os quais Saulo, Léo Santana, É o Tchan e Harmonia do Samba, além de blocos brasilienses, como Eduardo e Mônica, Divinas Tetas e Brega e Rosas. Na mesma Praça das Fontes, em 25 de maio de 2019, Ivete Sangalo reuniu plateia frenética de 50 mil pessoas, que foram ali para curtir o lançamento do Live Experience, DVD que a estrela da música brasileira havia gravado, meses antes, no Allianz Parque (do Palmeiras, em São Paulo).
Um pouco antes, na área do estacionamento 4, por três anos — de 2017 a 2019 — foi promovido o Funn Festival, com artistas bem diversificados, como Elba Ramalho, Ludmila, Marcelo D2, Thiaguinho e Tiago Iorc. Já a desativada Piscina de Ondas, recebeu de 7 a 29 de setembro do ano passado, o Festival Ocupa, que teve como atrações as cantoras Clarice Falcão, Alice Caymmi, Roberta Sá e Paula Lima, convidada do coletivo candango Samba Urgente, com a presença recorde de quase 10 mil pessoas. Diante de tudo isso, essa aprazível e aconchegante área verde de Brasília — uma das maiores do mundo —, pode ser vista também como Parque da Música.
Artigo publicado nesta quinta-feira (24/9) no Correio Braziliense