O recado de Tom Jobim

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Severino Francisco

O nosso Silvestre Gorgulho me enviou mensagem sobre de Tom Jobim em pleno voo e logo imaginei que fosse algo relacionado ao belíssimo Samba do avião, feito para reverenciar a chegada aérea ao Rio de Janeiro: “Minha alma canta/Vejo o Rio de Janeiro/Estou morrendo de saudades/ Dentro de mais um minuto estaremos no Galeão/Este samba é só porque/Rio eu gosto de você.”

Infelizmente, o tema da mensagem do Tom era mais grave e extremamente atual: as queimadas insanas de nossas matas, que turvam o céu e dificultam a respiração. Quando vieram a Brasília para compor a Sinfonia da Alvorada, Vinicius ficou na varanda do Catetinho com o copo de uisquinho, mas Tom era mateiro e se embrenhou pelo Cerrado para conversar com as jaós e inhambus por meio de apitos de madeira. O maestro tinha uma vasta coleção desses instrumentos.

Tom vivia dentro da Mata Atlântica e, por isso, era íntimo de árvores, plantas e bichos. Entrava no mato para caçar música; dizia que música é canto de passarinho aperfeiçoado.As suas canções são florestas transformadas em música: “Eu sou filho da Mata Atlântica, conheço esses bichos todos”, dizia ele.

No entanto, não entendia porque o brasileiro acordava todos os dias para destruir o Brasil: “O Japão é um país paupérrimo com vocação para a riqueza. Nós somos um país riquíssimo com vocação para a pobreza”.

Durante um voo em Boeing 747 de Nova York rumo ao Brasil, Tom ficou estarrecido com os buracos e os desertos cavados na divisa de Minas Gerais com o Rio de Janeiro. Tomado de indignação, o maestro pegou o papel do menu do avião e expressou, em um jato, a revolta com a devastação das árvores. É uma mensagem que parece dirigida especialmente para nós, nesses dias que as queimadas tomam o céu, espalham fumaça tóxica e dificultam a respiração. Ouçamos o que tem a nos dizer o maestro.

“Brasil, um país lindo com nome de árvore. Pau-Brasil é hoje uma raridade. O Brasil era um paraíso, um país mateiro, grande Nação Florestal. Floresta com onça, anta, macuco, madeiras preciosas que nem foram utilizadas, mas queimadas, as queimadas que começaram em Minas e iam até as praias do Espírito Santo.

Queimar: fogo, sempre fogo na fabricação demente, insana, do deserto. Depois vinha a chuva e carregava os restos e vinha o sol e cozinhava o chão.

Ao lado a voçoroca, o buracão profundo. Insensatos. A superfície da Terra virou uma moringa, uma telha.

Amanhece no interior do Boeing Jumbo 747 da Varig. Lá embaixo, Minas, Zona da Mata. Não tem mais mata. Estamos chegando… cadê a Mata Atlântica? E a terra despencando morro abaixo. Um compatriota sentado do meu lado diz:

– Os americanos já destruíram suas matas, seus índios e nós temos os mesmos direitos. Meu Deus, o que os índios pensarão disto, o que as árvores pensarão disto?

Chico Mendes falou na TV americana em bom português: – Vão me matar, não mandem flores, deixem as flores na floresta.”

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