Reforma trabalhista: Brasil está na lista dos 24 casos mais graves que OIT investigará por violação a normas internacionais do trabalho

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Decisão do Comitê de Peritos foi tomada na 107ª Conferência da OIT, que acontece em Genebra. O Brasil está oficialmente na lista dos 24 piores casos selecionados para a discussão individual, o que trará desgaste político internacional à representação do governo, informou a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra)

O Comitê de Peritos da OIT analisou a atual condição legislativa brasileira e concluiu que dispositivos da Lei nº 13.467/2017 (reforma trabalhista) representam graves violações a normas de proteção internacional com as quais o país se comprometeu. O Brasil é país integrante da OIT desde a sua criação, em 1919, sendo compromissário das regras que são construídas a partir do diálogo internacional tripartite, entre representações de trabalhadores, empregadores e governos. Todavia, não as observou, conforme conclusão dos peritos, denunciou a Anamatra.


Entenda o caso

Ano a ano é divulgada uma lista, conhecida como “long list”, de casos que o Comitê de Peritos considera graves e pertinentes para solicitar, dos Estados-membros envolvidos, uma resposta oficial completa, antes de lançar seus relatórios acerca do cumprimento de determinadas normas internacionais. O Brasil figurou na “long list” em 2017, em razão da tramitação do então PL 6.787/2016 (reforma trabalhista). Ao final, porém, o caso não foi incluído na “short list” – ou seja, dentre os 24 casos considerados mais graves para apreciação no decorrer da Conferência Internacional –, basicamente porque o projeto de lei ainda não era definitivo e seguia tramitando no Congresso Nacional. Ali já se via, entretanto, uma sinalização forte quanto à necessidade de o país reafirmar o seu compromisso com as agendas do trabalho decente, o que inclui a observância das normas básicas de proteção à pessoa trabalhadora. O “caso Brasil” continuou sendo monitorado internacionalmente.

No início deste ano, o Brasil voltou para a “long list” (dentre os mais de 40 casos graves selecionados), desta vez com observações bastante claras quanto à aparente inconvencionalidade de dispositivos que estão na Lei 13.467/2017. Havia muita expectativa sobre se, no decorrer da Conferência, o Brasil passaria a ser incluído na “short list”, compondo o desonroso grupo dos países suspeitos de incorrerem nas mais emblemáticas violações do Direito Internacional do Trabalho em todo o planeta. Foi o que agora ocorreu, conforme decisão do Comitê de Aplicação de Normas Internacionais. O Comitê é um órgão independente composto por peritos jurídicos de diversos países, encarregados de examinar a aplicação das convenções e recomendações da OIT no âmbito interno dos Estados-membros. Com a decisão desta terça-feira, o Brasil está oficialmente na lista dos 24 piores casos selecionados para a discussão individual ao longo da Conferência, o que trará desgaste político internacional à representação do governo.


“Short list”
e violações do Direito Internacional do Trabalho

Após as ponderações preliminares de trabalhadores, empregadores e diplomatas brasileiros, o Comitê de Peritos apontou problemas relacionados sobretudo ao cumprimento dos termos da Convenção nº 98 (direito de sindicalização e de negociação coletiva), por ter identificado indícios de fomento legislativo a um tipo de negociação coletiva tendente a reduzir ou retirar direitos sociais, subvertendo a sua finalidade natural. A conclusão dos peritos aponta, portanto, para a necessidade de revisão dos arts. 611-A e 611-B da CLT, entre outros, na perspectiva de que não é viável preordenar negociação coletiva para redução ordinária de direitos ou diminuição de garantias, e tanto menos negociação direta entre trabalhador e empregador, sem intervenção sindical, para esse mesmo fim. Outra revisão fundamental sinalizada diz respeito ao art. 442 da CLT que, ao estimular contratos precários – o de “autônomos exclusivos” –, formalmente desvinculados de categorias profissionais, tende a excluir os respectivos trabalhadores das salvaguardas sindicais típicas reconhecidas na legislação.


A visão da Anamatra

O presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano, observou que “a notícia consterna, mas não surpreende. A Anamatra alertou, desde o início da tramitação do PL  6.787/2016, para os riscos de uma alteração legislativa tão restritiva – e tão mal construída – sem o necessário diálogo com a sociedade civil organizada”.

Já a vice-presidente da Anamatra, Noemia Porto, que participa da Conferência representando a entidade, viu com preocupação a inserção do Brasil na lista.“Não há dúvida de que fica abalada a credibilidade do país no plano internacional, porque até então vinha sendo construída uma imagem positiva de compromisso com a cidadania, incluindo o respeito aos direitos dos trabalhadores. Isso foi rompido”. A preocupação com o crescimento sustentável, que alie valor social do trabalho e livre iniciativa, é um compromisso estampado na Constituição do Brasil, diz. As inconvencionalidades inerentes à ideia de negociação coletiva com redução de direitos, de negociação direta entre trabalhador e empregador e de proliferação de contratos precários foram antecipadas pela Anamatra desde a tramitação do projeto de lei da reforma trabalhista, tanto nas notas técnicas publicadas como nas participações em audiências públicas. As inconstitucionalidades e inconvencionalidades da Lei nº 13.467/2017 também apareceram nas teses recentemente foram aprovadas no XIX CONAMAT, principal evento da Magistratura do Trabalho brasileira. (Confira aqui a lista das teses)

Luciana Conforti, diretora de Cidadania e Direitos Humanos, que também participa da 107ª Conferência, acrescentou que a Anamatra já vinha documentando os impactos negativos da reforma trabalhista aferidos nos últimos 6 meses, dentre os quais as ameaças à independência judicial dos magistrados – pressionados publicamente por autoridades públicas para dedicarem ao texto legal interpretações de ordem literal –, a drástica redução do número de ações trabalhistas – diante das restrições impostas para o acesso à justiça, inclusive de trabalhadores pobres –, as demissões em massa associadas ao aumento da informalidade e da formalização de contratos precários e a crise no modelo de custeio das atividades sindicais. Para a diretora, a inclusão do Brasil na lista dos 24 piores casos ocorre como consequência da quebra dos princípios fundamentais do diálogo social e da negociação coletiva, que deve visar à melhoria das condições de trabalho. Na data de ontem a Anamatra protocolou ofício de caráter informativo, endereçado ao Diretor-Geral, versando sobre os aspectos acima referidos.

Luciana Conforti referiu, por fim, que a Anamatra, considerando os tradicionais laços de cooperação norteadores de suas relações com a OIT há mais de uma década, já havia reportado ao diretor-geral Guy Rider quais eram os riscos da aprovação da reforma trabalhista como proposta, conforme ofício protocolado pela entidade no decorrer da 106ª Conferência Internacional do Trabalho.

Vera Batista

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Vera Batista
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