Netflix/Divulgação. Cena da terceira temporada da série 3%. Netflix/Divulgação. A personagem de Gloria ganha posição importante na temporada.

Terceira temporada de 3% mostra personagens mais complexos e bem desenvolvidos

Publicado em Séries

Primeira produção brasileira da Netflix estreia nesta sexta (7/6) os oito novos episódios da terceira temporada. A série apresenta ao público novas dimensões do universo distópico e personagens em dilemas diferentes. Confira a crítica de 3%.

A segunda temporada de 3% acabou com personagens principais divididos, um plano de arruinar o Maralto destruído e um suspeito acordo entre Michele (Bianca Comparato) e os representantes do poder. O trailer da terceira parte da série apresenta uma alternativa à miséria do Continente e à inacessibilidade do Maralto. A Concha, desenvolvida por Michele, é um espaço livre e colaborativo aberto a qualquer um que procura refúgio. A temporada começa com a desconfiada e resistente Joana (Vaneza Oliveira) chegando ao lugar com intenções próprias. Logo no começo, 3% nos apresenta a diferentes personagens das temporadas anteriores que preferiram buscar seu lugar ao sol como Rafael (Rodolfo Valente), acompanhado do irmão mais novo, Marco (Rafael Lozano) e o filho pequeno, e Gloria (Cynthia Senek).

A presença de familiares humaniza a imagem de personagens já conhecidos pelo público e apresenta uma nova faceta de Rafael e Marco, que carregam nas costas o peso de erros passados e a responsabilidade de serem pessoas melhores, exemplos para o irmão e o filho, respectivamente. Michele assume a posição de líder e fundadora da Concha e tenta deixar para trás o reflexo de poder abusivo do Velho (líder da Causa) e de Ezequiel (João Miguel), que a treinaram para manipular. As semelhanças dela com o líder do Processo, no entanto, são notáveis (desde o tom de voz assumido pela personagem até a postura corporal). Michele se apega à imagem da fundadora esquecida, Marisa (Maria Flor), para construir a Concha: um lugar que oferece a tecnologia do Maralto para todos.

Os novos episódios são fruto de uma melhora considerável nos investimentos da produção. É possível ver figurinos e cenários elaborados com mais qualidade, além de uma direção de arte que contribui, de forma satisfatória, para a contextualização e para o desenrolar da trama, sempre permeada de situações limite. O roteiro e os textos, bem amarrados, dão fluidez e conduzem bem o espectador. Já no primeiro episódio, em cena apresentada no trailer, uma tempestade de areia destrói a Concha e deixa o lugar desamparado. Sem fornecimento de água, com plantações destruídas e os estoques saqueados, a população se vê desamparada. A Comandante Marcela (Laila Garin) retorna, taciturna, oferecendo todos os suprimentos necessários em troca de controle do Maralto na Concha. A proposta é mantida em segredo por Michele, que não acredita nas boas intenções da Comandante e vê seu desafio de liderança ser posto em prova.

Netflix/Divulgação. Michele passa a usar o colar de Marisa, fundadora apagada da história do Maralto, como homenagem.

A personagem de Bianca Comparato desenvolve, então, uma seleção para deixar apenas 10% da população da Concha no local. Os que ficarem serão responsáveis por reconstruir o lugar, que será reaberto e acolherá de novo os eliminados quando se reerguer. Durante todo o processo, ela tenta conduzir de forma justa e mais distante possível do Processo. Como já era de se esperar, porém, aqueles que ficam de fora não aceitam voltar para as condições precárias do Continente e redefinem os rumos da temporada em um levante popular encabeçado pela jovem Gloria, que assume uma posição de destaque na temporada. Ela é motivada, majoritariamente, pela morte do melhor amigo de infância Fernando (Michel Gomes) e também por um fio de esperança que a menina nutre pelo Maralto desde pequena. Ela encontra em Marco o apoio e a força bruta para reivindicar a liderança de Michele, a quem considera, de certa forma, tirana.

Netflix/Divulgação. Gloria toma a frente para lutar pelas próprias convicções.

Do lado do Maralto, também é possível ter uma nova impressão dos personagens. Enquanto André (Bruno Fagundes) aparece cada vez mais poderoso e convicto da ideologia que adota (diferentemente da imagem passiva e distante que o personagem tinha nas temporadas anteriores), Marcela também é aprofundada. Enquanto espera pelo colapso da Concha, a Comandante precisa lidar com o estado de saúde delicado de um dos conselheiros vivido por Ney Matogrosso, pai da personagem e Alvares convicto – a família que se gaba por, de geração em geração, vencer o Processo e conquistar lugar no Maralto. Marcela, que é mãe de Marco, teme pela proteção do neto em segredo.

Personagens femininas em destaque na terceira temporada de 3%

Além de Gloria, que se torna um trunfo importante para ambos os lados, duas outras mulheres do enredo (introduzidas na segunda temporada) ganham mais espaço: Natalia (Amanda Magalhães) e Elisa (Thais Lago). A primeira, membro da Causa, acredita na Concha como uma alternativa à tirania do Maralto e tenta incentivar Joana a baixar a guarda e adotar a mesma postura. Elisa, por sua vez, se vê dividida entre Rafael e Otávio, antigo namorado de quem se separou quando passou no Processo. Acostumada com a vida mais tranquila do Maralto, ela fica no centro de dilemas interessantes de serem observadas e se sente responsável pelos dois homens, o que acrescenta uma complexa carga emocional à personagem.

Netflix/Divulgação. Cena da terceira temporada da série 3%.

Evolução

Os oito episódios conduzem de forma envolvente. Os conflitos não se arrastam além do necessário e é possível ter diferentes leituras de cada um dos personagens, sempre interessantes por adotarem medidas mais complexas do que pode parecer à primeira vista. A trama surpreende de forma sutil e entrega uma boa dose de ação. É possível notar um trabalho mais efetivo da equipe, pioneira no gênero no país, que se adaptou melhor à linguagem distópica. 3% adota um padrão de qualidade mais alto sem deixar de ser tipicamente brasileira, embalada por Elza Soares e Chico Buarque.