Sororidade. Representatividade. Empoderamento. Três palavras chave nos dias de hoje para a figura da mulher, que saíram do lugar de fala para invadir os conteúdos audiovisuais. A prova disso é o sucesso das produções protagonizadas por mulheres. Nos cinemas é uma heroína que bate recordes: Capitã Marvel, primeiro filme solo de uma super-heroína da Marvel, tem nocauteado muito longa-metragem de herói , com a simples mensagem de que as mulheres podem ocupar espaços até então destinado aos homens.
Coincidência ou não, no mês em que se celebrou o Dia Internacional da Mulher, a televisão e o streaming se utilizaram dessas palavras e dessa mensagem presente no hit das telonas em produções inéditas e originais protagonizados por elas. Nelas, estão representadas mulheres de fibra e completamente diferentes entre si, que conquistaram, com muita luta, uma espaço na sociedade.
Representatividade
Desde 10 de março, o Fantástico exibe o quadro Mulheres fantásticas, em que conta a história de mulheres que se destacaram em diferentes âmbitos enfrentando dificuldades ligadas ao gênero. Mostrando representatividade, a produção exibe mulheres inspiradoras para os espectadores.
A série se divide em dois momentos. O primeiro, com narração de artistas brasileiras contando a história da personagem seguida de ilustrações. E o segundo, quando a jornalista e apresentadora Poliana Abritta, conversa com uma outra personagem que tem uma relação com a narrativa anterior.
O episódio de estreia teve a atriz Taís Araújo contando a história da paquistanesa Malala em paralelo com a participação da artista plástica Panmela Castro. O segundo episódio teve a cantora IZA relembrando a sambista Dona Ivone Lara, influência da cirandeira Lia de Itamaracá, segunda personagem. No domingo passado foi a vez da atriz Fernanda Torres contar a trajetória da inventora austríaca Hedy Lammar e o público conhecer a astrofísica brasileira Marcele Soares.
Sororidade
Maria Luiza (Maria Casadevall), Adélia (Pathy Dejesus), Lígia (Fernanda Vasconcellos) e Thereza (Mel Lisboa) são as quatro mulheres que protagonizam Coisa mais linda, produção brasileira original da Netflix lançada no último dia 22 na plataforma de streaming. Elas são a engrenagem da série, que retrata a força feminina ao mesmo tempo que conta a história do surgimento da bossa nova e de um período boêmio do Rio de Janeiro, o fim dos anos 1959.
Cada uma delas tem uma narrativa específica que se cruza nos sete episódios da primeira temporada. Maria Luiza, uma jovem paulistana rica, foi abandonada pelo marido e sozinha resolve apostar num clube de música no Rio. Negra, pobre e com uma filha para criar, Adélia acaba largando o trabalho de empregada doméstica a convite de Maria Luiza para ser sócia no clube Coisa Mais Linda, mas enfrenta o preconceito da época. Lígia sonha em seguir a carreira de cantora, mas é diariamente reprimida pelo marido, que quer ser prefeito da cidade. Já Thereza é uma jornalista moderna e decidida, que enfrenta o machismo no ambiente de trabalho.
Sororidade é a palavra que pode definir a união dessas quatro mulheres que amadurecem, batalham e derrubam preconceitos juntas na série. “A maneira como elas se dão as mãos faz com que se empoderem, se transformem. Então eu acho que esses encontros são muito importantes e verdadeiros nessa série. Elas são personagens muito humanas e falíveis”, definiu Mel Lisboa em coletiva de imprensa de divulgação do seriado.
Violência física e sexual, abandono, aborto e entre tantos outros temas ligados à figura feminina são temas de Coisa mais linda. “Somos quatro mulheres protagonistas contando essa história. Nesse momento do mundo, ser mulher e estar viva é realmente alguma coisa que faz a diferença”, define Maria Casadevall fazendo referência aos debates atuais da produção.
Sobre os personagens homens terem menos destaque as atrizes explicam. “O gênero masculino não é o antagonista dessa série. O antagonismo é o preconceito, é a forma de se relacionar com uma estrutura social já estabelecida e é isso que entra em conflito direto com as questões que estão sendo discutidas”, defende Fernanda Vasconcellos. Em relação a mudança de ponto de vista Maria Casadevall define: “Acho que, nós mulheres, crescemos vendo histórias sendo contadas pela perspectiva dos homens e isso não deixou de ser humano mesmo assim. A gente não deixou de se identificar com essas histórias; então, colocar também essa perspectiva humana é muito importante, porque a história é contada por meio dos nossos olhares, mas isso não quer dizer que não diz respeito a todos nós, aos homens e as mulheres. Acho que o Coisa mais linda é um ponto de partida e se propõe a uma discussão relevante dentro desse contexto”.
Empoderamento
A jornalista Rosiska Darcy de Oliveira, detentora da cadeira 10 da Academia Brasileira de Letras, é o exemplo vivo de empoderamento. Ela precisou se empoderar quando teve que se exilar em Genebra durante a ditadura militar e para participar do movimento feminista no mundo e no Brasil. Hoje, com 74 anos, ela divide a própria trajetória de luta pela igualdade de gênero no documentário Elogio da liberdade, com estreia neste domingo (31/3), às 21h, no canal MAX, com produção da HBO.
Dirigido pela atriz Bianca Comparato, que faz o seu début como cineasta, o longa-metragem mostra um bate-papo entre protagonista e diretora com o objetivo de compartilhar uma história de lutas, mas também de vitória feminina. “O que me motivou foi exatamente a oportunidade de contar para outras pessoas a história da Rosiska e mostrar as ideias dela para o máximo de pessoas possível. Esse filme é parte dessa necessidade minha de mostrar para as mulheres da minha geração e depois da minha, que elas não estão sozinhas. E mostrar também que existe esperança, apesar do cenário atual e que teve gerações lutando muito pela nossa liberdade”, afirma Bianca.
É por meio da história de Rosiska que o filme fala sobre os 70 anos de causas das mulheres no Brasil. “Eu tinha vontade de contar isso, essa experiência no movimento das mulheres. Foi uma ideia de refazer um percurso de uma geração que começou lá atrás com grupos pequenos e que transformaria o século 20 e continua transformando até hoje. É uma mensagem para as próximas gerações”, explica Rosiska.
A mulher do humor
De segunda (1º/4) até sexta-feira, a Globo exibe o programa Viver do riso após o Jornal da Globo. Transmitida no ano passado no canal Viva, a produção tem Ingrid Guimarães à frente de uma atração que celebra diferentes aspectos do humor, entre eles, a inserção da mulher, que dá o tom do primeiro episódio. “Eu quis começar com um programa da mulher no humor para contar a nossa história de saída do papel subjugado. É muito importante contar e mostrar o papel da mulher no humor e na sociedade, que não foi criada para ser engraçada, rir de boca aberta. Ser engraçada não era sinal de boa moça, era sinal de moça louca”, afirmou em entrevista ao Correio no ano passado.
Três perguntas // Bianca Comparato
Como foi para você dirigir Elogio da liberdade?
Mexeu muito comigo, com a minha vida. Não só por estrear como diretora, mas também como mulher. Coisas que eu achava normal, até limitações da carreira, porque eu trabalhei com poucas diretoras… Era muito difícil me ver como diretora. Eu via homens ganhando mais e achava aquilo normal. Muitas vezes, eu mudava a maneira de me vestir. Tudo isso que eu achava normal, quando eu conhecia a Rosiska percebi que não era assim. É um filme muito pessoal, de muito aprendizado. Eu era uma pessoa antes do filme e hoje sou outra.
Durante muito tempo, as histórias foram contadas sob o ponto de vista dos homens. Pensar nesse filme foi um jeito de mudar a perspectiva da narrativa?
Acho que isso, na verdade, tem a ver com o patriarcado. Quem tinha a caneta de escrever as histórias sempre foram os homens. A gente quis registrar essa história e passar essa ideia para o máximo de pessoas possíveis.
Sendo uma pessoa do meio audiovisual, como vê a presença feminina hoje nesse mercado?
Acho que existe, sim, uma mudança na indústria mundial, não só no Brasil. O Oscar e Emmy são dois prêmios que se abriram muito mais para o internacional, para as mulheres. Falando da minha vida e da minha carreira, vejo que todo mundo despertou e existe uma demanda das vozes para serem mais escutadas. Não tem mais como parar essas mulheres em movimento. Sinto essa diferença nos projetos que estou, nos roteiros que leio, que são diferentes de oito anos atrás, por exemplo.
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