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Julia Stockler, a Justina de Éramos seis, é uma atriz de todas as épocas

Publicado em Entrevista

A atriz Julia Stockler passeia no tempo vivendo personagens de época na novela Éramos seis e no filme A vida invisível. Leia entrevista com a Justina da novela das 18h!

Um dos grandes baratos de ser ator ou atriz deve ser poder experimentar “viver” em várias épocas. Julia Stockler pode dizer, por exemplo, que está nas décadas de 1930, 1950 e trazendo assuntos dos dias de hoje. Isso porque a atriz é Justina em Éramos seis e Guida em A vida invisível, filme que pode representar o Brasil na festa do Oscar deste ano.

Em sua estreia na televisão, Julia tem um grande desafio pela frente: dar vida a Justina, uma menina autista. “Eu conversei muito com o diretor geral, o Carlos Araújo. Ele me deixou muito livre para compor a personagem a partir da minha intuição sobre o papel. Tive alguns encontros com um grupo de autista do Instituto Priorit da Barra. Foi uma experiência encantadora e muito emocional. Fiquei com um enorme desejo de interpretar essa personagem que vive à margem porque não é compreendida pela sociedade da época”, conta, em entrevista ao Próximo Capítulo.

Na trama, Justina acaba sendo marginalizada pela própria mãe, Emília (Susana Vieira), que a esconde da sociedade. Vivenciando isso Julia percebeu que a realidade mudou, com alguns avanços, mas muitos obstáculos. “É claro que hoje temos mais conhecimento de causa e isso expande nossa consciência sobre o assunto. Mas, mesmo assim, não é fácil ser inserido no mercado de trabalho, por exemplo. É preciso ainda vencer muitos tabus sobre o nosso mundo psíquico sem que isso fragiliza ou vulnerabiliza o sujeito. Acredito no poder da empatia”, explica a atriz, que não quis assistir a outras interpretações da personagem em versões anteriores da novela.

Já em A vida invisível, o personagem de Julia toca em uma questão muito atual: a condição da mulher na sociedade. “O filme é extremamente atual, infelizmente. Apesar de as mulheres terem conquistado seus direitos, e avançando em vários quesitos, ainda vivemos em uma sociedade machista e misógina. Temos taxas altíssimas de feminicídios, uma estrutura governamental praticamente inteira governada por homens, e um desinteresse total sobre as questões relacionadas ao poder de escolha da mulher em relação ao seu corpo”, diz. Julia é mesmo de todos os tempos!

Entrevista// Julia Stockler

Atriz Julia Stockler como Justina em Éramos seis
Crédito: Globo/Raquel Cunha. Julia Stockler: “Decidi compor a minha Justina. Sem interferências e pré-determinações”

Você estreia na televisão num papel desafiador e ao lado de grandes nomes, como Susana Vieira e Gloria Pires. Isso te dá mais gás ou mais medo?
Essa experiência, de poder contracenar com atrizes incríveis da televisão, só me dá mais gás e vontade de aprender com elas. O processo na TV tem uma agilidade, uma dinâmica impressionante e totalmente nova pra mim. Estou adorando. Minhas cenas são principalmente com a Susana que faz a minha mãe e ela está sendo muito generosa e receptiva comigo.

Éramos seis está na quarta versão. Você chegou a assistir a alguma para compor a Justina de 2019?
Não assisti a nenhuma versão anterior porque decidi compor a minha Justina. Sem interferências e pré-determinações. Foi um desafio descobrir em mim onde estava a sua alma e como construir sua realidade. Justina tem um universo muito particular e estou construindo esse espaço lúdico e também muito solitário com bastante calma e cuidado.

A Justina tem uma doença. Foi necessário que você passasse por algum “laboratório” para vivê-la?
Eu conversei muito com o diretor geral, o Carlos Araújo. Ele me deixou muito livre para compor a personagem a partir da minha intuição sobre o papel. Tive alguns encontros com um grupo de autista do Instituto Priorit da Barra. Foi uma experiência encantadora e muito emocional. Fiquei com um enorme desejo de interpretar essa personagem que vive à margem porque não é compreendida pela sociedade da época.

A trama de Éramos seis se passa nos anos 1930 e 1940. A Justina acaba sendo escondida pela mãe da sociedade, o que era relativamente comum àquela época. A sociedade está mais bem preparada para lidar com seus doentes hoje ou o preconceito ainda é muito grande?
Acredito que ainda existe preconceito, sim. É claro que hoje temos mais conhecimento de causa e isso expande nossa consciência sobre o assunto. Mesmo assim não é fácil ser inserido no mercado de trabalho, por exemplo. É preciso ainda vencer muitos tabus sobre o nosso mundo psíquico sem que isso fragiliza ou vulnerabiliza o sujeito. Acredito no poder da empatia.

Você fez a série Gilda, do Canal Brasil. O que pode adiantar desse projeto?
Ainda não posso adiantar muito desse projeto. Apenas que é uma personagem totalmente diferente de mim. E essa é a maravilha de ser atriz.

Você está em Vida invisível, filme premiado em Cannes e que representa o Brasil na corrida pelo Oscar. Quais são as expectativas para a estreia do filme?
As expectativas são as melhores. Em todos os lugares que já apresentamos o filme tivemos uma recepção maravilha. Fomos muito bem recebidos e recolhemos muitos abraços emocionados. Nosso desejo é que esse filme possa atravessar muitas memórias, histórias, afetos. Apesar de ser um filme que fala principalmente sobre a condição de invisibilidade das mulheres diante de um cenário patriarcal, queremos que ele seja visto principalmente pelos homens.

Como foi a experiência em Cannes?
Foi uma experiência libertadora. Perceber que o mundo quer ver cinema brasileiro sendo feito é um tapa na cara dos governos que estão cortando nossas verbas para criação.

O filme fala muito sobre a condição feminina na década de 1950. É possível traçar um paralelo com a sociedade atual neste sentido?
O filme é extremamente atual, infelizmente. Apesar das mulheres terem conquistado seus direitos, e avançando em vários quesitos, ainda vivemos em uma sociedade machista e misógina. Onde temos taxas altíssimas de feminicídios, uma estrutura governamental praticamente inteira governada por homens, e um desinteresse total sobre as questões relacionadas ao poder de escolha da mulher em relação ao seu corpo.

Tanto A vida invisível quanto Éramos seis são produções de época. Você gosta desse tipo de trabalho mais do que os contemporâneos?
O que eu gosto é de contar histórias.