Por Pedro Ibarra
Um dos principais questionamentos que são levantados em crimes muito violentos é: o que se passa na cabeça da pessoa que praticou esse ato? As respostas são várias, desde questões passionais até distúrbios mentais severos. Talvez seja por isso que o público tenha tanto interesse pelas histórias de crimes reais, que já viraram até gênero, o true crime. Uma das principais produções do ano que explora esse tema é Amor e morte, que apresentou o último episódio no final de maio.
A série conta a história de Candy Montgomery (Elizabeth Olsen), uma mulher que decide se aventurar em um affair com o marido de uma amiga da igreja que frequentava. Mesmo muito regrada quanto ao que deveriam ou não fazer no caso extraconjugal para não gerar nenhum tipo de sentimento, Candy se vê envolvida e, em um ato passional, assassina com mais de 40 machadadas a esposa do amante. O caso é real e ocorreu em 1980 nos Estados Unidos, gerando comoção, principalmente por a assassina ter sido julgada inocente após julgamento.
Um dos principais fatores do seriado é como retratar essa figura que, mesmo cometendo um assassinato brutal, cativa as pessoas, incluindo um júri formado majoritariamente por mulheres. Esse desafio caiu nas mãos de Olsen, que aceitou o papel por ter sido cativada pela história em primeiro lugar. A atriz conta que estava gravando Doutor Estranho no multiverso da loucura quando foi convidada para o papel e decidiu ler o script nos períodos de folga. “Eu tive muito tempo sem trabalhar e acabei me divertindo e me sentindo empolgada desde a primeira vez que li esses roteiros”, lembra a artista, que viu algo realmente instigante na história. “Eu, geralmente, nem gosto de ler roteiros na folga, mas esse foi diferente”, recorda.
Para ela, Candy era uma personagem até então única na trajetória que está construindo como atriz. “Era uma personagem que eu sabia que conseguiria fazer, já tinha um esboço dela na minha cabeça. Foi inspirador”, conta. Após ficar conhecida pelo papel de Wanda Maximoff no Universo Cinematográfico Marvel (MCU), era hora de explorar outras facetas como intérprete. “Vi nessa produção a oportunidade de fazer algo que eu nunca havia feito antes”, adiciona.
Contudo, o maior desafio era transmitir na tela toda a complexidade de uma personagem que é assassina e também cativante. Fazer com que o público se apaixonasse por Candy, mesmo sem entender exatamente o sentido dos atos que ela praticava. Deixar claro o comportamento paradoxal dessa mulher, dar as intenções certas para uma personagem muito complexa. “Eu fiquei animada em tentar entender que tipo de pessoa seria capaz de fazer essas coisas. O processo foi empolgante”, comenta.
Ela traçou as principais características que fizeram a mulher chegar ao crime na vida real — entender o contexto em que ela estava inserida, no final dos anos 1970 e início dos anos 1980. “A gente não estava necessariamente fazendo uma série de crime real, era sobre ter a oportunidade de mostrar que, mesmo em tempos progressistas, havia pessoas que estavam presas a uma estrutura de pensamento retrógrado”, explica a atriz, que acredita que Candy não viveu as ideias de liberdade que tomaram os norte-americanos nos anos 1970. “Pensar na tragédia da história e como esse crime afetou as pessoas que viviam naquela cidade me fizeram olhar para Candy como atriz e pensar: ‘uau, que personagem!'”, acrescenta.
Elizabeth classifica todo o caso como “muito esquisito”. Porém, conta que se debruçou na personagem para entender, de fato, a linha de raciocínio dela e chegar à persona que iria mostrar na tela. Ela chegou a dois pontos cruciais: a feminilidade e o vazio.
O lado feminino chama muito atenção em Candy. Em um período ainda bem mais patriarcal que os dias atuais, Candy usa de todos os privilégios da mulher para alcançar o que deseja, na opinião da atriz. “Ela usa o feminino para conquistar o que quer. Muito diferente de mim. Ela anda pelo mundo usando o que tem como mulher”, afirma Olsen. A atriz afirma que esse fator muito a desafiou, visto que não se identificava com a personagem no início. “Candy é uma personagem que eu normalmente não me sinto conectada.”
A questão do vazio diz respeito às motivações dessas pessoas no tempo em que viviam. Candy Montgomery tinha uma casa customizada em uma época em que esse tipo de obra era muito caro, um marido que ganhava bem e a sustentava para que ela cuidasse dos dois filhos, que estavam saudáveis e indo bem na escola. “Era muito importante para a gente mostrar que há um check list de coisas que elas querem ter na própria vida. Porém, esses objetivos foram traçados quando essas pessoas eram muito novas, e um dia elas acordam e percebem que já conseguiram tudo o que queriam”, explana Elizabeth. “O que essa lista significa quando essas pessoas já têm o dinheiro que querem e a família que sonharam? Onde está a experiência de vida? Isso é a vida?”, questiona.
Candy era uma mulher que tinha tudo, menos um sentido para viver. Uma vida como planejou, mas que não dava mais prazer. “A série tenta mostrar o que é essa coisa que faz as pessoas tomarem decisões consideradas imorais ou não lógicas, como ter um affair ou até cometer um assassinato. Reações que parecem muito absurdas, mas que vêm de um sentimento de estar perdida”, acredita a artista. “Ela tinha tudo que queria, mas, mesmo assim, não se sentia vivendo”, completa.
Para além de uma personagem intrigante, a possibilidade de trabalhar com grandes nomes dos bastidores da televisão chamou a atenção de Olsen. Lesli Linka Glatter, conhecida por trabalhos em Homeland e Mad men, dirigiu a maioria dos episódios do seriado, escrito por David E. Kelley, que assinou a criação de produções como Big little lies, Anatomia de um escândalo e Goliath. A atriz confirma que o fato de ser a primeira colaboração dos dois profissionais também a seduziu para o projeto.
Nas palavras da artista: “Eu gostei muito da ideia de trabalhar com o David e com a Lesli, dois veteranos da televisão que estavam colaborando pela primeira vez”, conta. “São muitas décadas de experiência nas costas deles, e vi uma oportunidade legal de trabalhar com gente muito experiente. Queria aprender com gente que viveu muito.”
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