Na última quarta-feira (24/10), a Netflix lançou em sua plataforma a série Bodyguard. A produção britânica foi realizada pelo canal estatal inglês BBC e já tinha ido ao ar no país da Rainha ainda em agosto. A série – que tem só seis capítulos – entrega acentuado grau de qualidade técnica, uma história criativa e consegue prender o público, mesmo abordando um tema já desgastado.
No enredo, Richard Madden – conhecido por interpretar Rob Stark, na série Game of thrones – dá vida ao sargento David Budd, um agente extremamente profissional e bem qualificado, entretanto, profundamente traumatizado pela participação na guerra que a Inglaterra empreendeu ao Iraque por anos. Budd, ao participar do embate, acabou sentenciando o casamento com Vicky (Sophie Rundle) ao fim, mesmo com os dois jovens filhos.
Os seis episódios da produção foram roteirizados por Jed Mercurio – também responsável pela criação da história – e a direção dos primeiros três ficam por conta de Thomas Vincent. A dupla aposta em pontos de clímax que não se limitam aos últimos minutos de cada capítulo, pelo contrário. E no piloto este é o caminho escolhido para apresentar ao público um conjunto de personagens chaves. A começar pelo próprio Budd, que em menos de cinco minutos impede um ataque terrorista a um trem de passageiros, onde estavam os próprios filhos do sargento.
A cena de abertura é fundamental. Cada diálogo, ângulo de direção, movimento e close é delineado com perfeição e consegue prender a atenção de uma forma que poucas séries do gênero conseguem. Como um thriller policial, Bodyguard foge da clássica linha narrativa dos filmes e séries populares do gênero, com uma mistura equilibrada de qualidade técnica e criatividade.
Após o incidente no trem – apresentado na série como o “atentado de 1º de outubro” – Budd ganha uma promoção dentro do departamento de polícia de Londres para proteger a Home Secretary da Inglaterra, a ambiciosa Julia Montague (Keeley Hawes).
A promoção rapidamente se transforma em um pesadelo para Budd, especialmente, pelo fato do homem ter a obrigação legal de proteger com a vida, uma das responsáveis pela ida do próprio agente a uma guerra que só lhe trouxe tragédias. Julia está em busca do poder parlamentar britânico sob uma bandeira conservadora que vai contra tudo o que Budd deseja, especialmente a resposta mais violenta e sanguinarina da Inglaterra contra o terrorismo.
Outro ponto de fundamental construído no piloto é a família de Budd. Ainda inconformado com o fim do relacionamento com ex-esposa, o agente é atormentado pela forma como o casamento se desenrolou, a ponto de perseguir Vicky por uma retomada do matrimônio, influenciado pelo TSTP (estresse pós-traumático) – que se recusa a tratar apropriadamente. Em meio a este caos na vida privada, Budd entra na órbita de Julia sem saber muito bem o que lhe espera.
O enredo de Bodyguard consegue um feito extremamente raro no mundo das séries: um segundo episódio melhor do que o primeiro. Isto porque neste segundo ato é onde o agente passa a ter um relacionamento amoroso com Julia, um fato que pode mudar para sempre não só sua própria vida, mas também a relação com toda a profissão.
O envolvimento dos dois ocorre, especialmente, pela extrema carência, medo e susto dos personagens com um mundo dominado pela violência e o terrorismo. O tema, inclusive, é tão protagonista da série quanto Madden e Hawes. De uma forma profunda e reflexiva, o enredo mostra um lado até então pouco conhecido nessas produções: o contexto interno de como o governo responde as tentativas de ataques.
Julia tem o objetivo de aprovar um conjunto de leis denominada RIPA 18, que endurece a legislação contra o terrorismo na Inglaterra ao dar poder maior às forças de segurança. O grande problema é que a política não busca tal objetivo como uma solução de fato viável para o problema, e sim como uma forma de ganhar visibilidade e assumir a liderança do parlamento. Nesse sentido, sutilmente, mas de forma absolutamente assertiva, Bodyguard levanta a inconveniente pergunta: e se o problema – e a presença – do terrorismo não for só os ataques externos, mas também como o governo dos países evoluídos lida com o tema?
Vale citar um dos pontos altos da produção: a cena do tiroteio no meio do segundo episódio. Com uma cena quase em plano sequência, o público pode acompanhar a tentativa de um atentado terrorista contra Julia e como Buddy lida com a situação. Sem trilha sonora, sem explosões e com tiros contados, os momentos de ação são sustentados por uma qualidade técnica de direção e atuações perfeitas. O ocorrido permite uma aproximação maior entre o segurança e a protegida e abre precedente para uma relação visceral.
Com um papel complexo, Madden tem um desafio e tanto em mãos: interpretar um personagem apaixonado pelo trabalho e pela protegida, mas decidido a derrotar tudo que Julia representa politicamente. A grande proposta da série é colocar o público em tensão para descobrir se Budd vai de fato deixar se levar pelo espírito de vingança e ódio e ceder ao assassinato de Julia, ou pautar-se pelo princípio profissional de sua vida e protegê-la.
O piloto de Bodyguard realmente impressiona pela qualidade técnica e criativa, entretanto a produção surpreende de fato com o segundo episódio. A história é engenhosa – dentro dos padrões do thriller policial – e sabe explorar as melhores partes: a relação de Budd e Julia.
Com um tom bem acertado de suspense, o enredo transita na loucura de Budd perante as pressões do trabalho e da política e o provável vilanismo de uma parlamentar que se aproveita do medo da população. O ritmo acertado da série também proporciona novos plots.
Tecnicamente, seguindo o padrão da BBC, a série de fato apresenta qualidade. Aqui a direção de Vincent se destaca. Sem nenhuma “ousadia”, o trabalho se pauta na dureza e na ambientação crua que enriquecem o enredo de tensão e suspense. As cenas de ação são as principais beneficiadas deste contexto. Longas, com quase gigantescos planos sequências, as cenas atingem o equilíbrio do aprisionamento do telespectador, mas não sua exaustão.
A direção também ultrapassa sem problemas limitações que não ficariam tão bem escondidas em outras produções. A locação de Londres é um grande desafio para qualquer gravação, entretanto, Bodyguard não se assusta e leva perseguições a uma das mais importantes capitais do mundo, como se estivem em um cenário próprio.
Este tipo de cena é o prato cheio da atuação tanto de Madden, quanto de Hawes. Ambos respondem a ação proposta pelo gênero. Entretanto, em conjunto, em momentos menos tensos, percebe-se a falta uma espécie de química entre os atores.
Disposto a dá uma chance a Bodyguard? Então confira algumas dicas do Próximo Capítulo para não ficar boiando em relação a política interna britânica.
*Julia representa uma Home Secretary do parlamento inglês, que designa um político veterano na casa, e comandante de uma espécie de ministério, especificamente o MI5.
* O MI5 faz parte do Home Office, liderado pela Home Secretary – e composto por vários outros Ministers –, que engloba outros serviços chaves para a democracia britânica, como segurança nacional, imigração, polícia, criminalidade e terrorismo.
* Na série, a “head”, ou “líder”, da força policial britânica (representada pela Metropolitan Police) é a comandante Anne Sampson (Gina McKee). A “head” faz parte do Home Office, submetida a Home Secretary.
* Na prática, a Home Secretary comanda a polícia britânica e outras forças de poder e inteligência – por meio da head. Entretanto, a constituição britânica – assim como a brasileira – designa uma ordem de hierarquia entre tais poder, imune a vontade do cargo. A série mostra o quanto Julia tenta mudar tal parâmetro – ilegalmente.
* Os ministérios respondem a um líder no parlamento, o Primeiro-Ministro – semelhante ao caso brasileiro, em que responde-se ao presidente. Entretanto, diferente do contexto nacional, os 21 cabinetes ministeriais britânicos (que variam até 23, dependendo da vontade do Primeiro-Ministro) podem definir – tirando e elegendo ao cargo – o próprio, em conjunto com o parlamento, naturalmente. Na série, Julia joga com essa briga de poder e cargos, em busca de maior relevância política.
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