Afogamentos na infância: nova campanha nacional mira cultura de prevenção

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Com afogamento entre as principais causas de morte acidental na infância, educadoras aquáticas defendem supervisão ativa, aulas desde os 6 meses e alertas contínuos de prevenção

O Brasil terá, a partir deste ano, um mês oficial dedicado à segurança aquática. Sancionada e publicada no Diário Oficial da União no início desta semana, a nova legislação transforma novembro em um período permanente de mobilização nacional para prevenir afogamentos, uma das principais causas de morte acidental entre crianças.

A mudança reforça a urgência de transformar cuidado em cultura, segundo especialistas ouvidas pelo Blog da Primeira Infância. Para elas, prevenção não é um alerta pontual, mas uma prática diária que envolve adultos, escolas, clubes e políticas públicas.

Segundo dados da Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático (Sobrasa), o afogamento é a segunda maior causa de óbito acidental entre crianças de 1 a 14 anos, ficando atrás apenas dos acidentes de trânsito. A entidade estima que, todos os anos, milhares de crianças são atendidas em emergências por incidentes relacionados à água, e que a maioria dos casos ocorre em piscinas, rios, lagos e represas, muitas vezes na presença de adultos, mas sem supervisão ativa. Além disso, para cada morte registrada, há pelo menos quatro a cinco episódios de quase-afogamento, que podem deixar sequelas neurológicas permanentes.

Para a educadora aquática Patrícia Guggiana, a criação de um mês oficial representa mais do que uma data simbólica: é uma convocação nacional. “Significa mais visibilidade, mais campanhas educativas e mais responsabilidade compartilhada entre escolas, profissionais, famílias e gestores públicos. A pauta deixa de ser um aviso isolado e passa a ser uma política de conscientização contínua”, afirma.

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Segundo ela, o país ainda trata afogamentos como acidentes imprevisíveis, quando na verdade a maioria é totalmente evitável. “É silencioso, rápido e previsível. E, mesmo assim, negligenciado. Muitos adultos acreditam que ‘comigo não acontece’. Em poucos segundos, com um adulto por perto, o acidente já está em curso”, pontuou Guggiana.

Patrícia destaca que o maior mito entre famílias é acreditar que uma criança que sabe nadar está protegida. “Habilidade aquática não substitui supervisão. Mesmo experientes, crianças podem se desorientar, escorregar ou agir de forma impulsiva. A prevenção nasce da soma: supervisão ativa, barreiras físicas e educação aquática constante”, afirma.

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A especialista lista sinais de risco que surgem antes de uma situação grave e passam despercebidos. “Tudo começa de forma silenciosa: criança muito perto da borda, boias mal ajustadas, brincadeiras de empurrão, respiração acelerada, tentativas constantes de se equilibrar. Outro sinal é o excesso de confiança, tanto dos pais quanto das crianças”, diz.
Se pudesse dar apenas uma orientação neste mês de conscientização, Patrícia é objetiva: “Nunca tire os olhos da criança na água. Supervisão ativa, sem celular, sem distrações. É a regra número um”, orienta a educadora.

Prevenção deve começar cedo

A professora e instrutora de natação Emilly Seródio reforça que as aulas não substituem o adulto, mas ampliam as chances de resgate em caso de emergência. “Nossas aulas para bebês e pré-escolares ensinam habilidades que compram tempo. A criança aprende a reagir a uma emergência. O adulto é quem deve impedir que a emergência aconteça”, explica.

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Segundo ela, a idade ideal para iniciar a adaptação ao meio aquático é por volta dos 6 meses. “É quando o bebê já tem bom controle do pescoço e ainda mantém reflexos naturais que facilitam o aprendizado. Não é sobre natação esportiva, mas sobre familiarização, conforto e habilidades básicas de sobrevivência antes que o medo se instale”, ao apontar que nunca é tarde para iniciar a prevenção.

Para famílias com piscina em casa ou que frequentam clubes, Emilly é enfática: “o celular, o livro e as conversas de adultos são perigos quando a criança está na água. A supervisão ativa é indispensável”, reforça.

Seródio reforça três medidas práticas que ajudam a prevenir acidentes: retirar brinquedos da piscina após o uso, porque atraem a criança para a beira sem o adulto perceber; instalar cerca de isolamento e portão com fecho automático, “os dispositivos mais importantes que o dinheiro pode comprar”; tratar a aula de natação como ferramenta de proteção, não como garantia de segurança.

Jéssica Andrade

Jornalista com especialização em Neurociência, Educação e Desenvolvimento Infantil. Coautora do livro Maternidade Atípica, integra o Colo — Coletivo de Jornalismo Infantojuvenil — e atua na cobertura de temas relacionados à infância, adolescência e família.

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Jéssica Andrade

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