Homem de verdade

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Dia desses um apresentador de televisão comentou a separação de uma atriz e disse que a moça precisava de um homem de verdade na vida dela. E completou: “Com tantos caras virando maricas, mulheres maravilhosas acabam ficando sem parceiros”. Como o assunto rendeu, foi adiante: “Nós, héteros, viramos minoria”.

O sujeito errou duplamente. Ao se imiscuir na vida alheia e ao tentar valorizar o machismo. Eu fiquei conversando com os botões da minha camiseta de meia: “O que seria um homem de verdade?”. Qual a posição dos homens num mundo em que as mulheres recusam o papel de coadjuvante.

Os homens de antigamente, graças aos romances, filmes e canções a gente sabe como eram. No cinema, houve Rooster Cogburn, personagem de John Wayne em Bravura Indômita; nos livros, tem muitos, inclusive esse Christian Gray, o sádico-erótico de 50 Tons de Cinza; nas canções, temos o marido de Amélia (a mulher de verdade), o companheiro de Emília (que sabe lavar e cozinhar), o alter-ego de Vinicius de Moraes em Minha Namorada (ser só minha até morrer) e incontáveis outros. Não colam mais.

Como diz um amigo, o mundo anda fluido demais, o que explica tudo sem dizer nada. Ser homem é diferente de ser macho; mas o momento de virada tem sido difícil para quem ainda vive na ignorância de acreditar que tem algum direito de posse sobre a mulher, o que pode explicar o número cada vez mais preocupante de feminicídios.

Cheguei a conversar sobre o palpitante tema com algumas amigas; e algumas me responderam com uma desconcertante sinceridade, mas cheguei à conclusão que é melhor não mexer nesse vespeiro, porque as pessoas andam mal-humoradas demais e ia acabar sobrando para mim.

Houve tempo em que a gente podia fazer piada de tudo, mas o estoque de ovos podres hoje anda muito farto para quem brinca com alguma coisa. Tem hora que vale a pena comprar briga; tem hora que não. E como as opiniões das minhas amigas não iam mudar o mundo e muito menos me ajudaram a entender a questão central, deixei para outra hora.

Também me aconselharam a conversar com os mais jovens, porque eles saberiam o que significa ser um homem de verdade nos dias de hoje. Só que eu não converso com gente mais nova. Trato bem, cumprimento, sorrio, mas não acredito que ninguém que não tenha cabelo branco – abro exceções para os pintados – tenha algo a oferecer ao planeta, a não ser as certezas que acompanham os ignorantes.

Fiquei sem saber o que seria um homem de verdade nos dias de hoje, mas estou feliz comigo mesmo, ainda que politicamente incorreto.

E me lembrei de uma charge do cartunista Henfil em 1969, tempos de breu mas quando era permitido fazer graça, em que ele convocava a torcida brasileira a recepcionar a seleção Paraguai com “milhares de faixas com a inscrição: maricóns”, que é (ou era) o termo pejorativo em espanhol para classificar os homossexuais. Até o Henfil teria a palavra cassada nesses dias de democracia plena.

Publicado no Correio Braziliense, em 7 de agosto de 2019

Paulo Pestana

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Paulo Pestana

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